São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Ainda Mercosul

ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA

O Mercosul continua participando ativamente da agenda política e econômica das autoridades brasileiras e lideranças empresariais. Também continua sendo apaixonadamente discutido por economistas, cientistas políticos e pelos que se interessam pelas relações internacionais.
Nas últimas semanas ou meses, independentemente das questões sempre debatidas e não equacionadas das salvaguardas comercias que a Argentina quer impor a alguns produtos brasileiros e que se aproximam de uma solução concessiva de nossa parte, entrou na ordem do dia a questão referente à inclusão de Venezuela e Bolívia.
As opiniões estão divididas, muito embora a voz dos críticos em relação à adesão da Venezuela tenha feito se ouvir com maior intensidade, pois identificam nessa associação apenas motivações políticas do seu presidente. Não se valorizam os benefícios de ter a Venezuela como associada, e sim a personalidade de Chávez, que tem tomado atitudes bastante questionáveis na gestão política e econômica, usando petrodólares.
O mesmo se aplicaria ao convite feito ao presidente da Bolívia, Evo Morales, por ocasião da visita realizada ao nosso país antes de sua posse, para adesão plena ao Mercosul. Como no caso da Venezuela, não são nada desprezíveis os argumentos de tê-los no acordo, tendo em vista sua importância estratégica no setor energético.
Como exemplo, o projeto de construção do gasoduto que ligará a Venezuela aos países do Cone Sul passando pelo Brasil é um dos temas que vem tratando nosso presidente com Chávez e Kirchner. Os três países formaram, em fevereiro de 2005, aliança estratégica voltada ao setor energético. Convém não esquecer que Bolívia e Venezuela competem para fornecer gás para Brasil e Argentina.
Novidade é a criação do Banco do Sul, organismo regional de financiamento de projetos sociais e econômicos, proposto por Chávez, que obteve o aval de Lula e de Kirchner durante recente encontro em Brasília. Ainda está por ser decidido se essa instituição será uma evolução da CAF (Corporação Andina de Fomento) ou um organismo novo. Chávez anunciou que poderia alocar parte das suas reservas internacionais para financiar programas de desenvolvimento econômico e social. Efetivamente, ele tem aplicado recursos vultosos para comprar alianças estratégicas na região. Estima-se, por exemplo, que tenha investido US$ 2 bilhões em títulos argentinos.
Não creio que o problema principal, no campo social e da sustentabilidade, esteja ligado à disponibilidade de recursos, e sim à nossa competência de saber aplicá-los com eficiência. Assim, sou cético quanto à criação de mais uma instituição.
Nas últimas semanas, o Uruguai, expressando com maior veemência sua insatisfação com a atenção que lhe tem sido dispensada pelos parceiros fortes do Mercosul, tem feito acenos de buscar um acordo bilateral de livre comércio com os Estados Unidos. Isso implicaria, se concretizado, em sua saída do Mercosul. Não está claro se está buscando maior atenção (há no momento uma disputa com a Argentina a respeito de indústrias de celulose na fronteira) ou se de fato existe tal interesse. É difícil imaginar uma genuína motivação norte-americana em um acordo comercial devido às discussões da economia uruguaia.
Quanto ao Paraguai, não ficou ainda plenamente esclarecida a questão da presença militar dos EUA, motivo de nossa atenção, mas esse país vizinho tem registrado sua insatisfação pelo abandono a que foi submetido, particularmente em relação a alguns temas do contencioso bilateral.
De qualquer forma, é fundamental continuar olhando com maior atenção os interesses dos sócios menores do Mercosul.
Malgrado todas as dificuldades, o Mercosul representa um importante instrumento político, econômico e financeiro para o Cone Sul e seria inaceitável seu fracasso. Apesar de todas as dificuldades, o comércio do Brasil com a Argentina é da maior relevância, assim como os investimentos recíprocos e o peso estratégico dessa aliança. Concordo que nossa liderança é importante, não se exercendo somente por falatório, e sim com medidas efetivas de políticas afirmativas.
Em vez de atirar pedras, creio que faça mais sentido juntá-las para fortalecer sua blindagem e torná-lo cada vez mais efetivo.


Roberto Teixeira da Costa foi presidente do Ceal -Conselho de Empresários da América Latina- por oito anos e faz parte do seu Comitê Estratégico Internacional. Foi um dos fundadores do Cebri e é membro do Board do Interamerican Dialogue, de Washington.

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