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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Inclusão digital pode gerar e distribuir renda
GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA
O governo Lula esquentou
o debate sobre inclusão digital. Há poucos dias foi redesenhada a estratégia de governo
eletrônico, com ênfase na inclusão social e no fortalecimento da
Casa Civil da Presidência da República. A novidade também
pode ser vista como uma vitória
do ministro das Comunicações,
Miro Teixeira, que apostou na
politização do tema, colocou a
Anatel na defensiva e abriu a
temporada de caça a um modelo
brasileiro de TV digital. Em jogo, o que pode e o que não pode
"entrar no ar" (ou seja, ocupar o
espectro eletromagnético que é
o espaço das redes).
Os debates sobre o assunto
vão deixar definitivamente o
terreno estritamente tecnológico (escolha entre os "padrões"
americano, japonês ou europeu) para assumir o caráter de
prelúdio a opções estratégicas
mais amplas. Ou seja, que envolvem não apenas a engenharia da
transmissão, mas também a de
produção e distribuição. E não
apenas de equipamentos, antenas e e codificadores, mas de
softwares, serviços, conteúdos e
projetos.
Dinheiro não falta, pois o modelo de privatização das telecomunicações incluiu a criação de
fundos setoriais como Fust e
Funtel, que, em tese, seriam a
fonte de financiamento de projetos de inclusão digital. O destino desses recursos e as modalidades de gasto e fiscalização dos
projetos de inclusão digital ainda não estão claros.
Parte expressiva da comunidade que tem algo a dizer sobre
o tema vai estar em Brasília, na
semana que vem, na 2ª Oficina
de Inclusão Digital (www.viaforum.com.br). É uma iniciativa
do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão (Secretaria
de Logística e Tecnologia da Informação), da ONG Sampa.org
e da Rede de Informações para o
Terceiro Setor (RITS).
A agitação em torno do tema
não é exclusividade do governo
Lula ou das ONGs que foram
pioneiras na construção de redes inclusivas. Menos de duas
semanas após a Oficina em Brasília acontecerá a Reunião Regional América Latina/Caribe
da Força Tarefa das Nações Unidas sobre Tecnologia da Informação e Comunicação (UN ICT
Task Force), no Rio. Dessa articulação participam o BID e a Câmara Brasileira de Comércio
Eletrônico (Câmara-e).
Além do Executivo federal,
dos movimentos sociais e dos
setores empresariais que disputam espaço na reconfiguração
do sistema nacional de comunicações, a academia também se
movimenta. Na Universidade
de São Paulo, vários grupos de
pesquisa preparam um Fórum
de Políticas Públicas centrado
no tema "TV digital".
Finalmente, o assunto está na
agenda mundial, pois em dezembro acontece a Cúpula
Mundial sobre a Sociedade da
Informação, na qual supostamente serão visíveis as demandas de todos esses setores.
Ao colocar a inclusão social
como condição de estruturação
das políticas de desenvolvimento da sociedade da informação
no Brasil, o governo Lula vai enfrentar, em escala ainda mais
ampla, o mesmo tipo de reação
corporativa que, há poucas semanas, caracterizou o debate
em torno das relações entre inclusão social e política de incentivo ao cinema. Levando em
conta que o cinema é apenas
parte do complexo industrial do
audiovisual digital interativo, as
negociações serão ainda mais
duras no país e no exterior.
A inclusão digital pode gerar e
distribuir renda, mas isso acontecerá apenas se houver como
alterar, nos sistemas nacional e
global de comunicação, a distribuição de poder. Não é pouco.
Está em jogo uma inédita "reforma agrária" do ar.
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