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São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2003

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País só vai renovar com o Fundo se houver vantagem, afirma Lula

KENNEDY ALENCAR
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

O presidente Lula disse ontem em Nova York que o Brasil só assinará novo acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) se trouxer "alguma vantagem para o país" e que o forte ajuste fiscal é decisão do governo, e não imposição da entidade. O governo quer incluir o que chama de "cláusulas sociais", a fim de ter maior folga para investir mais no social e na infra-estrutura.
Lula advertiu ainda o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), ao dizer que a depredação de patrimônio público não ajudava a entidade: "Obviamente os meus amigos do MST sabem que, com um comportamento assim, eles não se ajudam".
Anteontem, manifestantes ligados ao MST protestavam em frente ao Ministério da Agricultura contra a liberação do plantio de soja transgênica, quando, no tumulto, um vidro do prédio foi quebrado.
Segundo Lula, ele disse ao presidente dos EUA, George W. Bush, em almoço anteontem na sede da ONU (Organização das Nações Unidas), ter visto com "estranhamento" os EUA terem se aliado à União Européia em Cancún (México), onde fracassou rodada de negociações da OMC (Organização Mundial do Comércio).
Lula contou ter dito a Bush que não era correta uma crítica do representante comercial dos EUA, Robert Zoellick, ao G23 feita na imprensa internacional. O G23 é um grupo de países em desenvolvimento liderados pelo Brasil que se opôs à proposta dos EUA e da UE para a área agrícola.
O presidente negou que tenha feito duros ataques aos Estados Unidos, apesar dos discursos críticos que fez nesta semana em Nova York, especialmente anteontem, na abertura da 58ª Assembléia Geral da ONU.
Mas defendeu a dureza nas negociações comerciais com os países ricos, criticando novamente o protecionismo agrícola. "É correto que haja essa disputa, essa dureza na negociação. Não devemos esperar facilidades. Ninguém nos dará nada de graça", afirmou, em entrevista coletiva na residência do embaixador do Brasil na ONU, Ronaldo Sardenberg.
Lula negou que o governo queira reduzir o poder das agências reguladoras. "Não há nenhum interesse do governo em esvaziar as agências". Afirmou querer "trazer muitos investidores ao Brasil". O governo divulgou anteontem anteprojetos de lei com mudanças nas agências.
O presidente também falou que "a queda dos juros não é um carro" e que "nós não estamos na Fórmula 1". Segundo ele, o BC não vai reduzir de forma "abrupta" os juros, hoje em 20% ao ano.
A seguir, por tópicos, trechos da entrevista.
 
"Não tenho problema com Bush. Respeito a posição americana, ele respeita a nossa. Conversamos sobre a questão de Cancún. Tínhamos combinado [antes de Cancún] que haveria um esforço muito grande para tentar chegar a bom termo. Disse para ele que o que o Brasil fez em Cancún, com o G21 [que já chegou a 23 países], foi colocar na nossa pauta 70% do que os EUA queriam até dois meses atrás na área da agricultura. Portanto, quem mudou de posição não foi o Brasil, foi o representante do governo americano [Robert Zoellick].
Ele [Bush] me disse: "Precisamos ter paciência e continuar conversando". Temos a OMC para continuar o nosso trabalho. É um jogo de força. E nós, sem ficar chorando, vamos jogar o jogo. Temos de ser duros nas defesas dos nossos interesses.
É correto que haja essa disputa, essa dureza na negociação. Ninguém nos dará nada de graça. Estamos construindo força política para nos tornarmos iguais aos países desenvolvidos."
 
"A economia entrou numa rota de crescimento e não vai voltar mais. Acho que o desemprego vai cair no final do ano. Estamos entrando em uma época de crescimento do emprego, do comércio, do consumo em todos os países, e o Brasil não será diferente."
 
"A informação que eu tive é que havia ocorrido uma extraordinária reunião ontem [anteontem] entre o governo e o MST. Depois, recebi a informação de que houve um incidente na Agricultura [quebra de uma porta]. Obviamente os meus amigos do MST sabem que, com um comportamento assim, eles não se ajudam."
 
"Não há nenhum interesse do governo em esvaziar as agências. O interesse do governo é o de colocar as coisas em seus devidos lugares. Quem decide politicamente é o governo, e quem cuida da regulamentação são as agências. Vamos fazer os marcos regulatórios da forma mais transparente possível. Portanto não há nenhum conflito."
 
"Não foi o FMI quem determinou o superávit primário [4,25% do PIB]. É uma decisão do governo. O superávit não tem nada a ver com o acordo. É um problema nosso.
Não temos necessariamente de renovar o acordo. Só faremos se houver possibilidade de um acordo que possa trazer alguma vantagem para o país. Portanto estamos tranquilos, não estamos em nenhum sufoco, o Brasil está muito a cavaleiro para dizer ao FMI: "Não queremos o acordo, não vamos renovar e acabou!"."


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