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COMÉRCIO
Drogaria quer vender pilha, água e leite para compensar perda de receita
Genérico faz farmácia ir à
Justiça para virar "drugstore"
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
As farmácias estão recorrendo à
Justiça para poder vender a "linha
de conveniência", como pães, café, pilhas, sorvetes e até meias-calças femininas.
O lucro com a venda desses produtos chega a ser o dobro do obtido com remédios. A rentabilidade
das farmácias está em queda por
dois motivos: 1) os preços dos medicamentos são controlados pelo
governo; 2) os genéricos, produtos mais baratos, estão roubando
mercado dos convencionais.
A lei nº 5.991/73, que regulamenta a venda de medicamentos,
só permite que as drogarias vendam remédios e produtos correlatos, segundo a Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa).
As farmácias têm outra interpretação. Como a lei não cita o
que é proibido vender nesses estabelecimentos, elas estão obtendo
liminares e sentenças definitivas
na Justiça para comercializar o
que dá mais receita e lucro.
Pelo menos 400 farmácias estão
pedindo à Justiça o direito de poder ampliar a linha de não-medicamentos nas suas lojas. Metade
delas já conseguiu liminar ou sentença definitiva da Justiça.
O que as drogarias querem é, na
prática, adotar o modelo americano de lojas -as "drugstores", que
vendem de tudo. Além de possibilitar aumento da receita, a linha
de não-medicamentos, informam, é mais lucrativa -a margem de lucro chega a ser o dobro
no caso de alguns produtos.
A rede de farmácias Drogão,
com 43 lojas, já obteve da Justiça
seis liminares para poder vender
produtos de conveniência. A última foi conseguida na semana
passada para uma loja em São José dos Campos (SP).
A loja foi autuada pela Secretaria de Vigilância Sanitária municipal por comercializar leite, água
e isotônicos. Em Mogi das Cruzes
(SP), a secretaria chegou a bloquear a venda de uma gôndola inteira de uma loja Drogão por considerar proibido o comércio dos
produtos no estabelecimento.
"Para crescer e oferecer mais
itens para o consumidor, precisamos procurar a Justiça", afirma
Modesto Araujo, diretor da Drogaria Araujo, rede com 58 lojas na
região da Grande Belo Horizonte.
A Araujo foi uma das pioneiras na
obtenção de liminares -agora já
tem até sentença definitiva- para trabalhar com um mix variado.
Tendência mundial
Na metade dos anos 90, numa
visita aos Estados Unidos, Modesto constatou que essa seria uma
tendência mundial e decidiu trazer o modelo ao país.
Cada uma das suas lojas trabalha hoje com 18 mil itens -de gelo a meia-calça feminina. Tradicionalmente, uma farmácia tem
menos da metade disso. Do faturamento, de R$ 170 milhões, a linha de não-medicamentos já representa 45% -o mais comum é
essa fatia não passar de 20%.
A conquista de liminares e sentenças definitivas da Justiça para
poder atuar como "drugstores"
pode ser constatada nos números
da Abrafarma, associação que
reúne 30 redes de farmácias do
país. Em 99, essa linha participava
com 24,5%, em média, da receita
das drogarias. Em 2000 subiu para 25,8% e, neste ano, para 28,3%.
Pelo levantamento da Abrafarma, é a linha de não-medicamentos que está enchendo o caixa das
lojas. De janeiro a outubro, informa a associação, as vendas de remédios subiram 1,8% na comparação com igual período de 2000
-de R$ 1,80 bilhão para R$ 1,83
bilhão. No caso dos outros produtos, que inclui especialmente as linhas de higiene e beleza, a alta foi
de 3,5% -de R$ 620 milhões para
R$ 642 milhões.
Driblando a vigilância
A rede Pague Menos, do Ceará,
que diz ser a maior vendedora de
sorvetes Kibon-Sorvane do Nordeste, tem planos para elevar para
80% -hoje é de 35%- a participação da linha de não-medicamentos no seu faturamento.
Com 182 lojas em dez Estados,
ela funciona com liminares em sete. Significa que cerca de 75 lojas
precisam do aval da Justiça para
diversificar a linha de produtos.
"Quando eles [a Secretaria de
Vigilância Sanitária" nos perturbam, procuramos a Justiça", afirma Josué Ubiranilson Alves, diretor da rede. Ele conta que cada
uma das suas lojas trabalha hoje
com 9.000 itens -a linha de remédios corresponde a 50%.
A opção das redes de farmácias
por ampliar a linha de não-medicamentos também é reflexo do
controle dos preços dos remédios
pelo governo. Recentemente, a
Câmara de Medicamentos autorizou aumento 4%, em média, nos
preços dos remédios por causa da
alta do dólar. Para o comércio, o
repasse autorizado foi de 3%.
Eles querem também minimizar a queda no faturamento por
causa da troca dos remédios convencionais pelos genéricos (mais
em conta), movimento que começou há cerca de dois anos.
"A entrada dos genéricos no
mercado reduziu em 40% o faturamento das farmácias", diz
Araujo. Segundo ele, as farmácias
estão tendo de diversificar o mix
de produtos até para poder manter o negócio. "O governo já fala
em distribuir remédios pelo correio. Não dá para ficar parado."
Para enfrentar a queda no faturamento, a Drogaria São Paulo
pretende ampliar a linha de produtos dermatológicos, que compõem a linha "cosmocêutica".
As farmácias querem ainda se
preparar para enfrentar os supermercados, que desejam há muito
tempo vender remédios. A rede
Extra, por exemplo, tem intenção
de montar uma farmácia-piloto
numa área reservada da loja, mas
ainda não tem projeto definido.
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