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PREVIDÊNCIA
Incerteza sobre aposentadoria faz classe média colocar R$ 1 bi por mês em planos; metade é compra errada, diz analista
Medo de reforma engorda fundos privados
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
As receitas dos planos de previdência privada cresceram 74,6%
no primeiro trimestre deste ano
em relação ao mesmo período de
2002. Entre janeiro e março deste
ano, enquanto se intensificavam
os debates sobre a reforma da
Previdência e o déficit da seguridade pública, a classe média depositou R$ 3 bilhões nos cofres
das seguradoras e bancos que
vendem esses produtos.
Segundo especialistas, a iminência da reforma acendeu a
preocupação dessas pessoas com
o futuro e impulsionou a procura
por planos que complementem a
aposentadoria. O crescimento das
vendas neste ano foi excepcional,
pois, no primeiro trimestre de
2002, as receitas do setor haviam
crescido apenas 8,12% em relação
a igual período de 2001.
"As pessoas sabem que virão
outras reformas e que a Previdência só garantirá o básico", diz Osvaldo do Nascimento, presidente
da Anapp (Associação Nacional
da Previdência Privada).
O medo, porém, não é bom
conselheiro financeiro. Segundo
Márcia Dessen, diretora do IBCPF
(Instituto Brasileiro de Certificação de Planejadores Financeiros),
metade do explosivo crescimento
das aplicações em previdência
privada resulta de "compras erradas". As vendas, diz ela, "foram
alimentadas pelo marketing
agressivo das instituições e por
metas que os gerentes das agências bancárias têm de cumprir".
Segundo Dessen, "pessoas são
seduzidas por gerentes de bancos
e compram um plano de previdência pensando que estão aplicando em um fundo de investimento comum". Acabam pagando um custo alto com as taxas cobradas nesses produtos -maiores do que as dos fundos comuns.
Dessen diz que muitos desses
investidores sacam a aplicação
um ou dois anos depois -e perdem mais dinheiro com o recolhimento do Imposto de Renda que
incide nos resgates e que pode
chegar a comer 27,5% do capital
acumulado. "É o mesmo que rasgar dinheiro", acrescenta.
O consultor financeiro Mauro
Halfeld diz que as vendas excepcionais do primeiro trimestre
também são resultado do lançamento de um novo produto no
mercado, de perfil mais popular:
o VGBL (Vida Gerador de Benefícios Livres). "Mas, mesmo considerando as vendas desse produto
-R$ 915 milhões no trimestre-
foi um grande salto."
O VGBL é um plano destinado a
garantir uma renda na aposentadoria para trabalhadores da economia informal, profissionais liberais e contribuintes que fazem a
declaração simplificada de Imposto de Renda .
Essas pessoas ou não contribuem com o fisco ou abatem até
20% da sua receita bruta, sem precisar de comprovação, na declaração simplificada de IR. Por isso,
não se beneficiavam do incentivo
fiscal concedido a quem aplica no
PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres).
As contribuições feitas a um
PGBL podem ser deduzidas nas
declarações anuais até o limite de
12% da renda bruta tributável
(basicamente o salário bruto). No
entanto, é um produto complexo,
difícil de ser entendido até pelos
funcionários dos bancos, que dirá
pelos consumidores.
Segundo Halfeld, como o VGBL
é um produto mais simplificado,
"as equipes de vendas das seguradoras e bancos não têm mais a
desculpa de que é difícil explicar
aos clientes o que é plano de previdência". Com isso, as metas de
vendas estão cada vez mais elevadas e cresceu a pressão sobre as
equipes neste ano, segundo ele.
Planejamento
Para o consumidor, em meio a
essa guerra mercadológica, o melhor meio de evitar que alguém
lhe "empurre" um plano de previdência é traçar claramente sua estratégia de investimento. É preciso definir se o dinheiro que vai
aplicar se destina a formar uma
poupança para a velhice ou uma
reserva para emergências.
"Os recursos que podem ser necessários a qualquer momento e
aqueles que serão usados para
trocar de carro ou de apartamento devem ir para um fundo de investimento comum, para ações e
outras aplicações que oferecem liquidez [facilidade de resgate]",
diz Halfeld.
Na opinião de Dessen, "previdência não é investimento, é seguro de renda futura". Ela diz que,
na dose certa - aplicando em um
PGBL, todos os anos, apenas o
equivalente a 12% da renda bruta
anual-, o produto pode valer a
pena, especialmente para quem
não tem disciplina para poupar.
Os analistas também recomendam que o investidor escolha o
plano que cobra as menores taxas.
"Elas comem uma parte importante do ganho", diz Halfeld.
Júlio Bierrenbach, presidente da
RealPrev, diz que as pesadas taxas
não afetam a rentabilidade dos
planos de previdência porque são
compensadas por vantagens tributárias sobre os fundos comuns.
Nos fundos de investimento, diz
Bierrembach, o Imposto de Renda incide mensalmente sobre a
rentabilidade, reduzindo o valor
da cota do fundo. "É o efeito "come-cotas" do imposto", diz ele. Já
no PGBL não há cobrança de IR
no processo de acumulação, o que
eleva a poupança do investidor.
No entanto, a aparente vantagem da isenção de IR na fase de
acumulação dos planos de previdência desaparece na hora em
que o investidor saca a aplicação.
No PGBL, ele come entre 15% e
27,5% do saldo total acumulado.
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