São Paulo, quarta-feira, 26 de maio de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

A Operação Vampiro e o retrocesso

Seria importante que as ilações em torno da Operação Vampiro -que investiga corrupção no Ministério da Saúde para a compra de hemoderivados- não embarcassem em uma caça às bruxas inconseqüente, capaz de desmontar os enormes avanços ocorridos nos últimos anos no sistema de compra de remédios do órgão.
Historicamente, as compras eram centralizadas na Ceme (Central de Medicamentos), que ganhou notoriedade no governo Collor, por um ser um dos focos centrais de corrupção do esquema PC.
A Ceme foi fechada em 1997, na gestão do ministro da Saúde Carlos Albuquerque, tendo como secretário-executivo Barjas Negri -atual secretário da Saúde do Estado de São Paulo. Na gestão José Serra, o desmonte prosseguiu, com o mesmo Barjas à frente e tendo como diretor da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) Gonçalo Veccina, atual secretário da Saúde da Prefeitura de São Paulo (do PT).
Praticamente todas as compras de medicamentos básicos foram transferidas para Estados (os remédios de maior complexidade) e municípios (a cesta básica), em um total de R$ 340 milhões em transferências. Ao mesmo tempo, passou-se a recorrer maciçamente aos laboratórios oficiais de São Paulo, Goiás, Pernambuco e das Forças Armadas para a produção de medicamentos.
No ministério, ficaram as compras de insulina, hemoderivados e medicamento para Aids. No caso da Aids, com enorme redução no valor de compra, graças à luta contra as patentes na gestão José Serra. As compras ficaram concentradas na secretaria executiva, enquanto a Anvisa passava a definir a política de compra de hemoderivados. No caso dos hemoderivados, importava-se praticamente tudo. Definiu-se uma política de importação de insumos e desenvolvimento de produtos em laboratórios oficiais.
Na gestão Humberto Costa, houve sinais em direção a uma recentralização das compras, não mais que sinais, mas que ficaram patentes nas negociações políticas com o ex-governador Paulo Maluf, a quem foi oferecida a área de compras do ministério, e no bolo de R$ 200 milhões para a compra de medicamentos básicos em 2004, na contramão do processo de descentralização.
A estimativa de prejuízos de R$ 2 bilhões com manipulação de licitações é fantasiosa. Depois da extinção da Seme, de 1997 a 2002, o total de compras de hemoderivados foi de R$ 1,1 bilhão, a preços de 2002.
Os hemoderivados têm cotação internacional. É possível comparar todas as compras efetuadas com as cotações internacionais, assim como os preços pagos pelos grandes hospitais brasileiros.
A comparação pode revelar conclusões diferentes. Primeiro, se existiria, mesmo, um cartel na Saúde, manipulando licitações e aumentando preços, em conluio com funcionários. Segundo, se houve uma tentativa de "dumping", de jogar os preços abaixo dos de mercado na última licitação. Terceiro, se houve algum fenômeno recente de super-oferta de hemoderivados, derrubando os preços.
Seria relevante que um tema técnico desses não ficasse à mercê de conclusões apressadas e amadoras.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


Texto Anterior: Tributação: Imposto sobe mais para pessoa física
Próximo Texto: Dias de tensão: Para Palocci, alta do petróleo será temporária
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.