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OPINIÃO ECONÔMICA
A questão das agências reguladoras
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Finalmente o governo resolveu enfrentar a questão das
agências reguladoras respeitando
a opinião pública. Depois de vários meses em que membros importantes do governo, inclusive o
sr. presidente da República, usaram uma linguagem de palanque
eleitoral para criticar a opção feita, pelo ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso, por esse instrumento de modernização do
Estado brasileiro, chegamos agora a uma situação aceitável. O
Palácio do Planalto divulgou e
colocou sob consulta pública dois
anteprojetos de lei sobre esse tema, que serão encaminhados ao
Congresso para deliberação.
Esta coluna, que enfrentou quase isolada os ataques brutais contra as agências, sente um gosto saboroso de vitória com essa rendição do governo aos nossos valores
republicanos. Afinal, o presidente
Lula e seu partido têm toda a legitimidade para modificar as normas que regulam o funcionamento das agências, desde que o faça
seguindo as regras da democracia
brasileira. No grito, por meio da
imprensa e usando a leviandade e
a demagogia como instrumentos
para tentar influenciar a opinião
pública, é que não pode ser.
Herdamos do governo FHC um
entendimento incompleto sobre
as funções das agências reguladoras. Os debates que ocorreram
dentro da equipe do presidente
tucano dividiram os defensores
desse caminho em dois grupos.
Podemos descrevê-los usando o
corte tradicional entre esquerda e
direita.
Para alguns, as agências seriam
um instrumento para tirar da
área de influência do Executivo
-e, portanto, dos políticos- o
controle sobre setores da economia como o da energia elétrica,
das telecomunicações e do setor
de petróleo; a independência das
agências garantiria essa separação.
Para outros, esse novo mecanismo deveria ser usado apenas para
garantir que os contratos de concessões públicas, em setores da infra-estrutura que exigissem prazos longos para sua viabilização,
ficassem livres da dinâmica política que uma democracia, como a
brasileira, impõe. Mas ficava respeitado o princípio segundo o
qual o povo tem a liberdade para
escolher, a cada quatro anos, a linha política e as propostas de seus
governantes.
Em outras palavras, para alguns, as agências poderiam servir
para mudar a natureza mais profunda da forma como opera o
Executivo em nosso país; para outros, era apenas uma mudança
institucional no sentido de garantir os compromissos de longo prazo assumidos pelo governo eleito
e, portanto, legítimo para assumir essas obrigações.
Essas questões aparecem agora
de maneira muito clara no debate que se seguiu à divulgação dos
anteprojetos preparados pelo governo Lula. Para alguns, a regulamentação proposta reduz o grau
de independência das agências
na medida em que se vincula a figura do ouvidor à Presidência da
República, em razão do contrato
de gestão com os ministérios setoriais e da relação de ONGs com as
agências. Seria, portanto, um retrocesso em relação à legislação
atual e uma volta atrás no tempo.
Não é a minha opinião. Sempre
defendi nos anos FHC a idéia de
que as agências deveriam ter sua
atuação restrita à fiscalização e à
tomada de medidas que respeitassem e fizessem cumprir as obrigações assumidas por governo e
empresas, nos contratos de concessão de serviços públicos. Apesar de independentes para executar essas funções, as agências deveriam prestar contas de suas
ações ao Congresso e aos órgãos
de defesa da concorrência e do direito do consumidor.
As propostas apresentadas pelo
governo atendem a essas minhas
expectativas. Elas têm um problema porque transferem para o
Executivo funções que, em outros
países, são do Poder Legislativo.
Esse ponto certamente será revisto quando das discussões no Congresso. Mas não me incomodam
questões como a de atribuir responsabilidade ao Executivo para
realizar as licitações para concessão de serviços públicos. Isso é
uma função do governo, e não
das agências. Mesmo o potencial
conflito de interesses, no caso de
empresas estatais que participam
de licitações comandadas pelos
ministérios, pode ser minimizado
na medida em que esse processo
será feito por meio de leilões, com
regras estabelecidas por antecedência e sujeitas a consultas públicas transparentes. Qualquer
desvio será de conhecimento da
opinião pública e poderá ser denunciado.
Creio que o mais importante
em relação a esses anteprojetos de
lei é que voltamos a trilhar os caminhos de nossa democracia republicana e o governo deixou de
lado, claramente por pressão da
opinião pública, os desvios da demagogia e da democracia direta.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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