São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 2008

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Para especialistas, emergentes e Brasil não escapam da crise

PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES

Quem ainda pensa que o Brasil e outros países emergentes vão escapar quase incólumes da atual crise econômica está muito enganado. Os Estados Unidos, a Europa e o Japão enfrentarão uma recessão em breve, resta saber o tamanho e a duração. Isso terá um impacto negativo ao redor do mundo, sem exceções.
Essa foi a conclusão de um debate ontem à tarde na quase centenária Chatham House, em Londres, entre alguns dos maiores especialistas no assunto. "Vai haver uma queda de três a quatro pontos percentuais no crescimento dos mercados emergentes nos próximos 12 meses. Não uma recessão, como aqui. Não vão entrar pelo cano, mas vai haver uma desaceleração muito maior do que a maioria das pessoas pensa", disse Robin Bew, economista-chefe e diretor editorial da Economist Inteligence Unit.
E o Brasil?, perguntou a Folha. "O Brasil está um pouco melhor, porque tem uma economia mais diversificada, mas não tanto quanto se imagina. Tem um mercado interno crescente, mas por outro lado ainda depende bastante das commodities. Sem dúvida, o país vai ser afetado. Talvez não tanto quanto os outros, mas pode se preparar", disse Bew, que comanda uma equipe de 120 economistas ao redor do mundo.
Essa, por incrível que pareça, foi a análise menos pessimista da mesa, formada por Christopher Allsopp, da Universidade Oxford, e Vanessa Rossi, da Chatham House e da Oxford Economic Forecasting, uma consultoria independente ligada à universidade.
"Não há dúvidas sobre a perspectiva para os EUA e a Europa. Haverá recessão. O problema é que os emergentes até sobreviveriam a uma crise norte-americana, mas não também [a uma] na Europa e no Japão, que é o que vai ocorrer. A situação em todas as grandes economias está sincronizada e afundando. O impacto nos emergentes será muito maior do que foi até agora, e as próximas estatísticas devem começar a mostrar isso", afirmou Rossi.
Bew, da EIU, explica: "O mercado consumidor dos BRICs [Brasil, Rússia, Índia e China], somado, é de 10% do total mundial. O dos EUA é 25%. Se fosse só isso, tudo bem. O problema é que, somando Europa e Japão, o total do mundo rico sobe para 75%. De repente, os BRICs ficam pequenos".
Rossi diz que, por a crise se propagar em choques, seu impacto talvez chegue aos emergentes com força apenas no futuro. "O Brasil não está na pior das posições. Mas se ficar tão ruim quanto parece, a idéia de que o país pode escapar vai desaparecer. O choque pode demorar, e talvez você veja os efeitos mais em 2010 do que em 2009. Mas eles virão", disse.
Allsopp praticamente não tocou no assunto dos emergentes, mas concordou com a iminente recessão do mundo desenvolvido. No entanto, coube a ele a nota otimista da tarde, argumentando que ainda existe uma salvação. Se houver uma resposta eficiente dos governos envolvidos, disse, ainda é possível amenizar a crise.
E a resposta correta, afirmaram Bew e Rossi, está muito mais nos Estados Unidos do que na Europa até agora. "Os EUA estão preparados para pensar o impensável, enquanto a Europa não pensa em fazer nem o pensável", disse Rossi. "A frase que não sai da minha cabeça é: "Tempos extraordinários precisam de medidas extraordinárias'", afirmou Bew.


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