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LETRA CAPITAL
Coletânea revela Krugman acessível
MARCELO LEITE
especial para a Folha
Paul Krugman
ainda não é o
Carl Sagan da
economia, mas,
a julgar pela exposição que
vem obtendo na
imprensa mundial, depois da crise financeira iniciada em 1997, não parece assim
tão longe do objetivo. Sim, porque
ele imodestamente se queixa desse
vazio de celebridade em seu campo de trabalho logo na segunda
página deste livro divertido:
"Deveria haver mais escritos sobre economia acessíveis, interessantes e até excitantes (...). Em várias questões, incluindo algumas
em que as paixões sobem alto, a
economia oferece "insights' surpreendentemente iluminadores,
"insights' que poderiam com algum esforço (está bem, com muito esforço) ser explicados sem jargão. A explicação, no entanto, não
aparece. Somos uma profissão
sem popularizadores".
Krugman promete e entrega, à
diferença da maioria de seus pares
brasileiros que escrevem sobre
economia para o público. Consegue ser razoavelmente acessível,
muito interessante e esclarecedor,
nessa coletânea de artigos escritos
de 95 a 98 para publicações como
"Slate" (revista da Internet, na
qual tem uma coluna mensal,
"The Dismal Science"), "The
New York Times", "The Economist" e "Foreign Affairs".
Quanto a ser excitante... Bem, se
a sua noção de excitação comportar doses cavalares de ironia e didatismo, você vai sentir-se em plena Casa Branca lendo Krugman.
Para quem está com os nervos à
flor da pele, sem poder desgrudar
os olhos da cotação das Bolsas e da
saída de dólares do Brasil, a recomendação é ir direto à quinta seção do livro e, nela, ao ensaio
"Bahtulismo: Quem envenenou
os mercados monetários da
Ásia?". Saboreie detalhes como o
trocadilho com botulismo e o fato
de Krugman chamar George Soros
de "palindrômico" (por causa da
conformação das letras de seu sobrenome), mas não perca a descrição (pág. 147) de mais de um ano
atrás que parece feita sob medida
para o Brasil de hoje:
"Crises monetárias frequentemente provocam reações histéricas em funcionários do governo.
Um dia a economia do país está
indo na flauta, seus bonds são
AAA, você tem bilhões de dólares
em reservas bem enfurnadas. De
repente as reservas estão rapadas,
ninguém quer comprar seu papel
e você só consegue manter dinheiro no país aumentando a taxa de
juros a níveis indutores de recessão. Como as coisas podem dar errado tão rápido?".
É mesmo, como? O próprio
Krugman anda agora dizendo que
o Brasil não é bem a Rússia, mas
sua advertência de um ano atrás
soa francamente desoladora, como sua ciência: "Uma crise é simplesmente o modo com que o
mercado diz a um governo que
suas políticas não são sustentáveis". FHC, Pedro Malan e Gustavo Franco que o digam.
O melhor do livro, aquela parte
que mais se aproxima da pretensão inicial, é a última, "Além do
Mercado". São seis textos inspirados em que o autor aplica fundamentos de economia para lançar
nova luz sobre questões como
efeito estufa, congestionamentos
de veículos, democracia representativa e saúde pública. Não é exagero qualificar esses microensaios
como iluministas, no melhor sentido, embora economistas, empresários e colunistas brasileiros
sérios talvez preferissem enquadrá-los como perfumaria.
O raciocínio básico é que, sempre que há escassez de um bem
(frequências para telecomunicações, ar limpo, estradas descongestionadas, água doce, florestas
tropicais etc.), a disputa pelo recurso só poderá ser racionalmente
resolvida pela instituição de direitos de propriedade e, consequentemente, de um mercado para
eles, na forma de leilões, quotas
comercializáveis de uso, pedágios.
"Mas os congestionamentos de
trânsito não são só um fato da vida?", pergunta na pág. 175. "Não:
em grande parte são o resultado de
um sistema que, como o tributário, encoraja as pessoas a tomar
decisões economicamente ineficientes." Mais adiante, o desafio:
"Por que então não há nenhum
político conservador de expressão
por aí fazendo campanha com a
plataforma de estender princípios
do livre mercado, de criar direitos
de propriedade onde deveriam
existir, mas não existem?".
A OBRA
"The Accidental Theorist -
And Other Dispatches from
the Dismal Science" - Paul
Krugman. W.W. Norton & Company, Nova York, 1998. 204
págs. US$ 25,00.
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