São Paulo, terça-feira, 26 de novembro de 2002

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LUÍS NASSIF

A marcha da insensatez

O que está ocorrendo com a Varig é algo que os historiadores denominariam, sem dificuldade, de marcha da insensatez. Para não abrir mão de poder, a Fundação Ruben Berta, controladora da Varig, está matando a última possibilidade de salvar a companhia.
No dia 27 de agosto foi eleito um Conselho de Administração, visando buscar saídas para a empresa. Entraram Arnim Lore na presidência da companhia e, no Conselho, o ex-ministro Clóvis Carvalho, fazendo companhia a José Roberto Mendonça de Barros -que já integrava o órgão.
A Varig tem patrimônio líquido negativo, caixa baixo e um histórico de dificuldade de relacionamento com credores que remonta a 1990. Foi acertada uma estratégia dividida em três etapas.
A primeira etapa consistiria na melhoria dos indicadores de curto prazo. A segunda, em uma negociação com os credores, buscando dar fôlego à empresa no curto prazo. A terceira, na busca do parceiro estratégico, que resolvesse definitivamente os problemas da companhia.
Na primeira fase, de curto prazo, o novo Conselho implementou planos antigos, de integrar a malha das três companhias do grupo -Varig, Rio Sul e Nordeste. A General Electric já havia retomado 18 aviões da companhia. Apesar disso, a otimização das rotas permitiu à Varig reduzir as perdas de passageiros em apenas 3%. Com essa queda pequena e a redução dos vôos, sua taxa de ocupação interna ficou superior a 60%, a melhor do mercado nacional. Outra frente de atuação foi na VarigLog. Cortaram-se R$ 10 milhões mensais em despesas, permitindo à empresa pela primeira vez operar no azul.
Ao mesmo tempo, foi sendo montada a estratégia para convencer os credores a auxiliar a empresa. Foi contratada a Pain & Co., companhia que ajudou na reestruturação da Continental. Na semana passada foi entregue um estudo detalhado, constatando a viabilidade da Varig, desde que a gestão fosse otimizada. Por exemplo, o custo comercial da companhia corresponde a 25% do valor da passagem. Nas empresas concorrentes, é de 20%. Nos Estados Unidos, a média é de 10%, demonstrando grande espaço para melhoria da produtividade. O relatório foi fundamental naquilo que interessava: assegurar que, com otimização de ganhos, a companhia seria viável.
Paralelamente, o Conselho contratou a KPMG e o escritório de advocacia Machado, Meyer e Óbice para um "due diligente" completo na parte contábil e de contratos, a fim de completar o sistema de informações de curto prazo e acalmar os credores.
À medida que as informações iam fluindo, teve início processo de negociação com os credores para equacionar as dívidas de curto prazo. O processo começou em setembro e terminou em 25 de outubro. Foi uma vitória, que permitiu uma folga de caixa de US$ 117 milhões para a companhia -US$ 30 milhões de securitização das passagens (a que os credores tinham direito), US$ 22,7 milhões de devolução de caixa que os credores haviam retido a partir de julho; e US$ 63 milhões de crédito novo. A operação normalizaria o caixa, permitia quitar dívidas mais urgentes e tinha prazo de validade em 30 de novembro.
Antes mesmo de 25 de outubro o Conselho tentou por diversas vezes reunião com a Fundação Ruben Berta para explicar o acordo. Não houve resposta a nenhum dos telefonemas. Foram canceladas duas reuniões previamente marcadas. Os representantes da Fundação faltaram na Assembléia do dia 15 de novembro. Na segunda convocação da Assembléia, os membros da Fundação votaram contra o acordo, alegando não dispor de informações suficientes -apesar de terem se recusado a receber as informações.
Provavelmente o que levou a Fundação a essa atitude foi uma visão insensata do processo, julgando que, no próximo governo, teria mais condições de conseguir apoio financeiro sem as exigências bancárias de abrir mão do controle da companhia.
É erro crasso. No momento em que o governo Lula abrisse o hospital para acudir a Varig, imediatamente lhe cairiam no colo centenas de pedidos de outras empresas em dificuldade, solicitando tratamento semelhante.
Quando cair a ficha da Fundação Ruben Berta, poderá ser muito tarde.

E-mail - lnassif@uol.com.br


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