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Nos EUA, economistas avaliam até decisão de casar
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O filósofo francês Blaise Pascal
afirmava, em 1670, que o coração
tem razões que a própria razão
desconhece. Os economistas duvidam. As mulheres, por exemplo, quando optam por casar, são
racionais. Elas analisam cuidadosamente o mercado de maridos e
colocam na balança todos os prós,
contras, custos e benefícios que a
decisão de casar acarreta.
Pelo menos são essas as hipóteses que Derek Neal, da Universidade de Wisconsin, nos EUA, assumiu para escrever "A Economia da Estrutura Familiar". No
trabalho, ele analisa os motivos
que fizeram o número de mães
solteiras norte-americanas aumentar ano após ano desde 1960.
Neal usou um instrumento que
torna-se cada vez mais popular
entre os economistas: a econometria. Usando dados sobre a população, renda, educação e matrimônios nos EUA, ele criou um
modelo estatístico que tenta explicar os motivos que fizeram
com que as mulheres passassem a
criar, sozinhas, seus filhos.
O que o modelo revela? Que
dois fatores são importantes na
decisão: as condições do mercado
de casamento e a existência ou
não de programas de ajuda governamental para as mães solteiras.
As mulheres "vão" ao mercado
e tomam a decisão de levar ou não
o produto como qualquer consumidor racional. Essa decisão vai
depender, claro, da quantidade e
da qualidade dos produtos disponíveis, nesse caso, os homens.
O economista chegou à conclusão de que tanto a deterioração
das condições do mercado quanto a criação de programas de ajuda contribuíram para que as mulheres decidissem ficar solteiras.
O quadro é mais grave no caso
da população negra jovem e com
baixo nível de educação. Os homens desse grupo viram suas
perspectivas de rendimentos, em
1990, caírem para um terço das registradas em 1960. Diante desse
quadro, a decisão racional das
mulheres foi permanecer solteiras
e recorrer à ajuda governamental.
Trabalho de sociólogo ou psicólogo? Talvez. Mas cada vez mais
os economistas usam seus métodos para analisar problemas que
tradicionalmente pertenciam ao
campo de estudo de outras áreas:
uso de drogas, divórcio, desempenho escolar, crime, suicídio.
A tendência não é nova. Os economistas dos EUA a iniciaram
por volta de 1950. O respaldo dos
demais veio, publicamente, em
1992, ano em que Gary Becker, da
Universidade de Chicago, ganhou
o Nobel de Economia.
Ele ganhou o prêmio "por ter
estendido o domínio da análise
microeconômica para vários aspectos do comportamento e interação humanos, incluindo o comportamento fora do mercado".
A despeito da "notoriedade" de
Becker, quem dedica-se a esse tipo de estudo fica "escondido" nos
centros de pesquisa. Por um lado,
porque as técnicas que usam são
complexas e, às vezes, indecifráveis para os "não-iniciados".
Por outro, porque, na maioria
das vezes, estudam assuntos específicos: explicar porque bons restaurantes têm filas não exerce tanto apelo quanto oferecer aos países as receitas para o crescimento.
"Mas é claro que é preciso prestar atenção aos detalhes. Construir grandes explicações pode ser
fácil. Mas sem uma análise criteriosa dos pequenos detalhes, elas
podem levar a conclusões equivocadas", diz Marcos Lisboa, diretor
de ensino da EPGE (Escola de
Pós-Graduação em Economia da
Fundação Getúlio Vargas).
No Brasil, diz Lisboa, os primeiros trabalhos na área começaram
na década de 60. Desapareceram
por algum tempo para ganhar novo fôlego na década de 90.
Em fevereiro, a EPGE lança o livro "Microeconomia e Sociedade
no Brasil", uma coletânea de ensaios que tratam de racismo a homicídios. Lisboa, co-autor do livro, diz que qualquer interessado
pode se aventurar na leitura. Mas
faz a ressalva: alguns capítulos ficam reservados aos iniciados.
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