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OPINIÃO ECONÔMICA
Ainda o novo coração
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Volto à minha imagem da
economia brasileira como
um homem com um coração novo, transplantado com sucesso,
depois de décadas de uma atividade medíocre e cheia de sustos.
Revisitando os registros da balança de pagamentos do Brasil, chegamos ao período entre 1973 e
1975 como o início de nossa doença. Saía Medici, endeusado pelo
crescimento da economia; assumia um novo general, Geisel, com
um projeto de transformar nosso
país em potência geopolítica.
Mas, entre a saída de um e a entrada de outro, ocorreu um grave
acidente na economia mundial.
Pela primeira vez os países produtores de petróleo resolviam usar
essa arma como fator de barganha política e econômica. Quadruplicaram o preço do barril, fazendo com que os gastos com a
importação deste produto no Brasil sem petróleo de então atingissem pesadamente nossa balança
de importações, ja deficitária devido aos investimentos pesados
que se faziam na economia.
O novo ministro da Fazenda,
Mario Henrique Simonsen, sugeriu ao presidente um programa
de ajuste de nossa balança de pagamentos, via uma severa recessão interna. Queria evitar uma
deterioração ainda maior de nossa solvência externa, além de
combater a inflação que ressurgia. Simonsen dizia que em dois
anos poderíamos voltar a crescer.
Mas os militares tinham pressa
e negaram a ele o direito de parar
nossa caminhada heróica em direção à história. Que ele desse algum jeito para que continuássemos a crescer, e ele deu: apelou
para a correção monetária generalizada para acomodar uma inflação que, até o fim do mandato
de Geisel, chegaria a 100% ao
ano, e passamos a nos endividar
nos mercados internacionais de
crédito via bancos internacionais.
A marcha forçada do crescimento imposta por Geisel, em um
contexto de economia dependente de petróleo e sem espaço para
outras importações, impôs um
ritmo violento demais ao coração, a balança de pagamentos,
que ainda era forte à época. E o
golpe fatal veio em 1979, com o segundo choque do petróleo. Pressionado por mais uma rodada de
aumentos de 400% nos preços do
petróleo, nosso coração não
agüentou... Fomos salvos de uma
vergonha total porque o México
declarou moratória antes de nós,
em 1982. Mas o colapso brasileiro
veio logo em seguida.
O período que vai de 1982 até
1990 é um dos mais tristes para os
economistas brasileiros. Nem
mesmo a redemocratização do
país, em 1985, e a nova Constituição, em 1988, nos devolve o humor. A busca de teorias econômicas alternativas e planos de salvação, sem nenhum conteúdo de
natureza estratégica, jogavam
nossa economia da euforia à recessão em períodos curtos de tempo. E com isso nos isolávamos de
um mundo que começava a se
reorganizar como espaço econômico.
Somente com a eleição do presidente Collor, e aqui temos uma
dessas armadilhas deliciosas da
história, o Brasil começa a repensar seus caminhos econômicos. A
imagem de nossos automóveis ridículos, pela tecnologia que a opção por uma economia fechada
nos impunha, chamados de carroças por ele, deu ao consumidor
brasileiro uma primeira idéia dos
custos do modelo dos militares,
ainda presente no governo Sarney. E, pela primeira vez em décadas, acordamos para um novo
modelo econômico que se desenvolvia fora de nossas fronteiras.
Finalmente, com o Plano Real,
retomamos um caminho coerente
para nossa economia. Gestão da
macroeconomia de forma responsável e abertura de nosso comércio exterior ao mundo competitivo eram suas pedras angulares.
Mas ainda passaríamos por dificuldades em razão de uma política cambial equivocada e um
grande ajuste recessivo na economia mundial em 1997 e 1998. Vivemos hoje um momento decisivo
para nossa economia. Se adotarmos uma política econômica adequada e reforçarmos nossos compromissos com a abertura da economia e com gestão macroeconômica inteligente e responsável, o
caminho para o crescimento sustentado, que perdemos em 1973/
1975, poderá ser reencontrado.
Um coração novo, isto é, uma nova balança de pagamentos nos
permite aspirar isso, e não o crescimento medíocre dos dois últimos anos.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 63,
engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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