São Paulo, sábado, 27 de fevereiro de 2010

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entrevista

"País precisa de uma geração para mudar"

DA ENVIADA ESPECIAL A ATENAS

Sem reformas profundas e longas, a Grécia não vai reerguer sua economia, avariada sobretudo por erros essencialmente gregos, diz Spyros Kouvelis no amplo gabinete no centro de Atenas perto do qual logo passariam grevistas protestando contra o arrocho proposto pelo governo George Papandreou.
Kouvelis não é opositor, mas seu homem-forte para a economia no Ministério das Relações Exteriores (o ministro é o próprio premiê). Leia trechos de sua entrevista à Folha. (LC)

 

FOLHA - Como resgatar a credibilidade perdida?
SPYROS KOUVELIS -
A primeira coisa é transformar o órgão estatístico aqui [que maquiou a dívida grega] em agência independente. A segunda, que o premiê já faz, é admitir que esse é, sim, um problema grego, gerado pela má administração do governo anterior. Por fim, propor um programa de estabilidade econômica e se ater a ele. O governo tem conseguido manter a agenda.

FOLHA - Mas é o começo do processo, e já há pressão na rua.
KOUVELIS -
Claro, mas, quando você tem de implementar um programa de estabilidade, todos passam por dificuldades. A classe média vai sofrer, o poder de compra, cair.

FOLHA - A economia, parar?
KOUVELIS -
É uma preocupação que tentamos enfrentar de dois modos. Um, não dá para se nortear pela necessidade de compra -na Grécia, o gasto público move a economia e, se você tem de cortá-lo, o dinheiro para o setor privado e os indivíduos diminui. Mas, dois, não dá para deixar o mercado doméstico encolher, então estamos tentando aumentar investimentos para trazer liquidez, e é melhor liquidez para investir do que para gastar. A Grécia parou de produzir qualquer coisa de valor, só consome.

FOLHA - Como melhorar a competitividade?
KOUVELIS -
Qualidade. Estou tentando promover produtos e serviços em que a Grécia faz diferença, como o turismo. Não deveríamos competir no turismo de massa, mais barato em outros países, precisamos ter serviços e estruturas melhores. Os setores tradicionais também são importantes, sobretudo a agricultura. Mas não faz sentido a Grécia produzir tanto algodão, mais barato em outros países. Temos de focar em frutas e vegetais, ganhar espaço no mercado árabe e no russo. O terceiro passo é a indústria de alta tecnologia.

FOLHA - A crise de credibilidade não vai solapar os planos?
KOUVELIS -
Ela não ajuda, mas é secundária nesse aspecto, pois não estamos em um momento de grandes acordos entre países, e sim entre empresas. Ela afeta a capacidade de contrair empréstimos do país e pesa no curto e médio prazo. Aqui falo do longo prazo.

FOLHA - Pelo que ouvi aqui, a Grécia não precisa só de ajustes, mas mudar a mentalidade.
KOUVELIS -
Verdade. É importante convencer os cidadãos de que eles têm um papel e que, se pedirem recibo, a economia formal cresce. É preciso educar a nova geração de agricultores para não depender de subsídio. Na política, acabar com a troca de favores...

FOLHA - Em quatro anos?
KOUVELIS -
O que dá é para montar a base e mostrar o caminho. Para mudar, acho que vai levar uma geração.


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