São Paulo, sábado, 27 de fevereiro de 2010

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Após dívida, gregos temem falta de competitividade

LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A ATENAS

Se saltar sobre o penhasco em que está sem "quebrar" e se conseguir restabelecer a confiança do mercado e de seus pares europeus, a Grécia terá de lidar com problema mais complexo do que o deficit orçamentário para evitar abismos futuros, alertam economistas, sindicalistas e membros do governo: falta de competitividade.
A avaliação em Atenas é que a atual situação -em 2009 deficit de 12,7% e dívida que supera o PIB- chegou por duas vias.
A primeira é a irresponsabilidade fiscal de sucessivos governos, cantada em sermões da União Europeia, jornais e mercado. A outra, à espreita, é a forma como se organizou a economia do país e como ela acabou engolida pelos pares no euro.
"Alguns países têm problemas de dívida, outros, de deficit, e outros ainda de competitividade. O drama nessa história é que a Grécia tem os três", diz Giorgos Glynos, que passou 25 anos na Comissão Europeia e hoje está na Fundação Helênica, "think tank" especializado em política europeia.
"Sempre tivemos um problema de competitividade. Não piorou logo que nos unimos ao euro, mas piorou bastante nos últimos anos, pois não adotamos as estratégias econômicas corretas", ecoa Zoe Lanara, secretária de Relações Internacionais do GSEE, o principal sindicato do país. "Os governos não investiram em qualificação e renovação."
Nem em seu próprio mercado os gregos têm conseguido se impor, e é comum ouvir reclamações de que geladeiras e armários (para não dizer as garagens) estão lotados de produtos de outras procedências. Embora a população viva com um salário médio de 1.100, as mercadorias têm preços mais parecidos com os de Paris do que com os de Madri (onde o salário médio é semelhante).
No comércio exterior a situação só piora. A economia depende essencialmente do turismo e da agricultura, e nesse último campo, nem o azeite, principal produto do país, consegue sobressair. Com pouco valor agregado, acaba superado também em volume pela produção italiana e a espanhola -que, aliás, os gregos afirmam vir, em parte, de suas oliveiras.
Para o governo atual, houve um erro na estratégia econômica e é preciso abandonar produções tradicionais, como o algodão, para investir em produtos de maior valor agregado. Outra saída é sofisticar sua produção. Mas ambos dependem da reeducação de produtores e trabalhadores. E de investimentos improváveis em um momento de incertezas.
Pior, a saída imediata em situações como essa costuma ser a desvalorização. Mas, pertencendo à zona do euro, a Grécia não pode depreciar sua moeda.
"Se a falta de competitividade não pode ser compensada com desvalorização, você tem de arrumar outras formas de compensar e tornar todo o país mais barato", diz Glynos. "Um caminho para isso é cortar salários, o que já estamos fazendo. Outros jeitos, mais significativos, são investir em recursos humanos e regular melhor os mercados", diz. "Mas são todas coisas politicamente muito mais difíceis de implementar."


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