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OPINIÃO ECONÔMICA
A metalinguagem dos juros
GESNER OLIVEIRA
A ata da última reunião do
Copom (Comitê de Política
Monetária), divulgada na quinta-feira, melhorou um pouco o
humor do mercado e restabeleceu
a expectativa de queda da taxa de
juros nos próximos meses.
A maneira pela qual esse texto
técnico e carregado de economês é
esmiuçado pelo mercado e pela
mídia ilustra bem o papel crucial
da comunicação para a política
monetária. Em breve as atas do
Copom serão objeto de exercício
de interpretação de texto no vestibular!
Não foi por acaso que, em um
balanço das experiências de diversos países de regime de metas
inflacionárias, como aquele que o
Brasil adota desde 1999, o economista Ben Bernanke e outros autores enfatizaram tanto a importância da forma de implementação do sistema e particularmente
da qualidade da comunicação
por parte da autoridade monetária.
Pois aplicando a interpretação
de texto da última ata em comparação com as dos dois meses anteriores, percebe-se uma mudança
de ênfase pelo Copom que vai
além da melhora que efetivamente se verificou nos números da inflação nas últimas semanas. Mas
o tom excessivamente pessimista
em relação à inflação das atas do
início do ano já afetou as expectativas em um momento importante da recuperação da economia e
de tomada de decisão de investimento e emprego por parte das
empresas.
Em meio à discussão da conjuntura, muitos críticos do Banco
Central perdem a perspectiva histórica de quanto se avançou na
última década em termos de
transparência e informação ao
público acerca da condução da
política monetária. O próprio volume de dados das atas, dos relatórios de inflação, resenhas setoriais e trabalhos de pesquisa publicados regularmente e disponibilizados no site www.bcb.gov.br
contrasta com a absoluta ausência de elementos objetivos que imperava no passado.
Esse avanço permite um debate
mais informado acerca das formas de aprimoramento do regime de metas no Brasil, como chegou a ser discutido na audiência
do presidente do Banco Central,
Henrique Meirelles, na Comissão
de Assuntos Econômicos do Senado, na quinta-feira. É evidente
que não se pode mudar o sistema
todo ano como se fosse regulamento de campeonato de futebol.
Isso seria o caminho mais rápido
para a desmoralização do regime
(que, aliás, já ocorreu com esse simulacro de Campeonato Paulista).
Mas as regras e os instrumentos
analíticos do regime de metas não
são cláusulas pétreas. Merecem
uma reflexão permanente e devem ser aplicadas com o máximo
de bom senso, como, aliás, qualquer medicamento, especialmente quando o paciente tem saúde
tão frágil.
Um exemplo desse esforço de reflexão está contido na densa tese
de doutorado do economista Celso Toledo apresentada na mesma
quinta-feira na Faculdade de
Economia, Administração e Contabilidade da USP. O trabalho de
Toledo mostra que, "se for verdade que os juros reais afetam mais
a oferta do que a demanda, é possível que a política monetária em
curso esteja sendo perversa do
ponto de vista do nível de atividade e até mesmo da inflação".
Outro resultado interessante reforça preocupação já existente no
Banco Central de melhorar a forma pela qual a autoridade brasileira estima o chamado "hiato do
produto", termo economês para
designar a distância que a economia se encontra da plena utilização de seus recursos produtivos. É
fácil intuir que a precisão dessa
estimativa é crucial para diagnosticar o momento no qual se encontra a economia e a oportunidade de subir ou baixar os juros.
Está certo o presidente Meirelles
ao afirmar, na audiência do Senado, que, "para um banco central, conservador não é insulto".
Ninguém espera que o guardião
da moeda seja frouxo na proteção
do poder aquisitivo da moeda. É
até certo ponto admissível que os
generais gostem da guerra. Mas é
preciso ser igualmente conservador e cauteloso com o modelo que
o Banco Central dispõe para
guiá-lo em decisões tão cruciais
para a produção e o emprego do
país.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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