São Paulo, sábado, 27 de março de 2004

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INTEGRAÇÃO

Negociadores resgatam disposição para dialogar e buscar avanço

OMC dá 1º passo na questão agrícola

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA, EM MADRI

Após cinco dias de intensas negociações sobre agricultura, que começavam no café da manhã e só terminavam no jantar, os 146 países-membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) podiam ontem transmitir ao menos um pequeno passo adiante.
"Houve uma bem-vinda mudança na direção de um ouvir o outro, mas a fase de resolver problemas ainda está por vir", resumiu Tim Groser, embaixador da Nova Zelândia e novo chefe da negociação agrícola.
Como se supõe que ouvir seja a mais elementar obrigação de qualquer negociador, onde é que está o progresso? Simples: até a reunião desta semana, cada país ou bloco de países se limitava a reafirmar suas posições originais, sem ouvir o que diziam os demais. Como as posições originais estiveram na origem do monumental fiasco que foi a Conferência Ministerial da OMC realizada em setembro em Cancún, de fato há algum tímido avanço, se estiver correta a avaliação de Groser.
Luiz Felipe Seixas Côrrea, o embaixador do Brasil em Genebra, QG da OMC, concorda com Groser: "Recuperamos o diálogo em um ambiente positivo". Seixas Côrrea é o primeiro a admitir que o ambiente positivo não resolve o problema, mas emenda: "Não resolve o problema, é verdade, mas, sem ele, é impossível resolvê-lo".
O que abriu caminho para um diálogo mais produtivo foi o que o brasileiro chama de "sinais" positivos emitidos pelas duas principais forças comerciais do planeta, os EUA e a União Européia.
Já ao chegar a Genebra, na segunda, o austríaco Franz Fischler, comissário europeu para Agricultura, disse que a UE estava preparada para discutir a eliminação dos subsídios à exportação de todos os produtos.
Fischler lembrou que, já em 2003, a UE havia sugerido que os países em desenvolvimento fizessem a lista dos produtos cujos subsídios deveriam ser eliminados. Agora, o comissário deu um passo adiante: "Se disserem que querem todos os produtos na lista, então teremos que negociar também essa possibilidade".
Mas os europeus, como sempre, cobraram "paralelismo", ou seja, que os Estados Unidos também eliminem seus programas de apoio à exportação, que embutem subsídios. O brasileiro Seixas Côrrea viu sinais positivos nessa direção também de parte dos norte-americanos.
Agora, a OMC inicia corrida contra o relógio para tentar chegar a uma moldura negociadora até junho. Depois, com a campanha eleitoral norte-americana correndo solta e a iminência da troca dos comissários europeus, a negociação ficará paralisada.
"Temos uma janela de oportunidade daqui até agosto. Se não a aproveitarmos, depois será bem mais difícil", diz o negociador agrícola dos EUA, Allen Johnson.
Mesmo que a janela seja bem aproveitada, ela produzirá apenas um marco básico, sem números de redução de barreiras para produtos agrícolas, que ficaria para uma segunda etapa.
Por isso mesmo, já não se trabalha, na OMC, com a hipótese de a Rodada Doha, lançada em 2001, termine no início de 2005, conforme o cronograma original.
A próxima reunião sobre agricultura será entre 20 e 23 de abril. Mas, fora agricultura, ainda falta atacar outros pontos complicados. Na segunda-feira, inicia-se uma nova maratona, agora sobre o comércio de bens não-agrícolas.
Faltam também discutir serviços e os chamados temas de Cingapura (entre eles, investimentos e compras governamentais), o item que foi a gota que levou Cancún ao colapso.


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