São Paulo, sábado, 27 de março de 2004

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INFLEXÃO?

Em reuniões internas, possibilidade de perseguir inflação acima de 5,5% neste ano, mas dentro da banda, é debatida

Governo discute "abandonar" centro da meta

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo admite, em reuniões internas, a possibilidade de perseguir uma inflação superior à meta deste ano, mas dentro do limites permitidos pelas regras atuais -ou seja, se necessário, o Banco Central pode desistir de buscar um IPCA de 5,5%, usando parte da margem de tolerância de 2,5 pontos percentuais.
Procura-se, segundo a Folha apurou, combinar dois objetivos: possibilitar um crescimento maior e manter a percepção de que as bases da política econômica estão intactas.
Por isso, o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) prefere uma alteração discreta na atuação do BC -que pode valer também para os próximos dois anos- à proposta de elevação oficial das metas de 2005 e 2006, defendida anteontem pelo líder do governo, senador Aloizio Mercadante (PT).
A decisão dependerá do comportamento da economia. No momento, o governo aguarda a divulgação, pelo IBGE, dos resultados do PIB (Produto Interno Bruto) no primeiro trimestre. Com o intervalo de tolerância, o BC poderia buscar neste ano uma inflação de até 8% e, em 2005, de até 7% sem que as metas sejam descumpridas.
Oficialmente, o Ministério da Fazenda nega que esteja em discussão a revisão das metas de inflação deste ano e do próximo.
Mercadante lançou publicamente a discussão. O senador quer que a meta deste ano (5,5%) seja estendida até o final do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na prática, isso significaria elevar a meta de 2005, que é um IPCA de 4,5%. A meta de 2006 ainda não foi fixada, mas, pelos planos da equipe econômica, deverá ser de 4%.
Nos bastidores, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes (PPS), tem trabalhado para defender a proposta. Ciro não fala em público, mas a Folha apurou que o ministro conversa quase diariamente com Mercadante sobre o assunto. Ambos pretendem ampliar o leque de apoio à idéia.
O ministro da Fazenda considera equivocada a estratégia. Para sua equipe, a medida não tem justificativa técnica e poderia resultar na perda de credibilidade do regime de metas de inflação -e, por extensão, da política econômica do governo Lula.

Choques
Pelas regras do regime de metas de inflação, os objetivos fixados só podem ser alterados se houver algum choque imprevisto, como as crises de 2001 e 2002, que resultaram numa disparada das cotações do dólar.
Como o BC, em documento divulgado anteontem, considerou que a elevação de preços agrícolas do início do ano não chega a ser um choque forte a ponto de justificar "neste instante" a revisão da meta, seria difícil explicar uma revisão da meta de 2005.
A intenção dos defensores da mudança da meta é tentar fazer a discussão correr lentamente para que não pareça uma imposição, mas sim um consenso que foi adotado pela equipe de Palocci. Ciro considerava ainda um pouco cedo para tornar a idéia pública, pois está longe de haver unanimidade dentro do governo.
O argumento usado por Mercadante e Ciro é que uma meta de inflação fixa, mais alta e por um período mais longo daria liberdade ao governo para resistir a pressões sazonais. "Não seria mais necessário matar uma formiga com um tiro de canhão, aumentando os juros toda vez que um preço de um terminado setor subir", tem repetido Ciro Gomes para quem o indaga sobre o assunto.
No momento, Mercadante e Ciro Gomes tentam cooptar o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Na sua primeira declaração pública a respeito, anteontem, Meirelles disse considerar "legítima" a discussão.
Mercadante e Ciro interpretaram como uma vitória o fato de o presidente do Banco Central não ter rechaçado a proposta.
(KENNEDY ALENCAR, FERNANDO RODRIGUES e GUSTAVO PATU)


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