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São Paulo, domingo, 27 de abril de 2003

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CUT X CUT

Para Mancha, líder grevista, governo Lula é frustrante

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Líder sindical que arquitetou a maior greve de trabalhadores desde o início do governo Lula, Luiz Carlos Prates, 47, o Mancha, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, diz que a atuação do novo governo já é "frustrante" e que essa é a melhor hora para iniciar uma greve.
Prates encabeçou o movimento de paralisação da fábrica da General Motors, em São José -que está em greve desde a terça-feira. Sem fazer rodeios, ele deixa clara sua posição contrária àquela defendida por alguns líderes da CUT, central da qual faz parte.
"Há uma linha de pensamento majoritária na CUT dizendo que temos de "maneirar". Sou contra isso", diz. Na segunda-feira, ele deve se encontrar com representantes do governo e da GM para tratar da questão da greve. Na sexta-feira, ele conversou por telefone com Osvaldo Bargas, secretário de Relações do Trabalho, para marcar a reunião.
 

Folha - As montadoras registram queda na produção, o desemprego no setor cresceu e os salários estão comprimidos. Esse é um bom momento para iniciar uma greve?
Luiz Carlos Prates -
É a hora certa. É preciso deixar claro que, mesmo num cenário recessivo, não é possível abrir mão de certos direitos. Sabemos que é possível negociar aumento real de salários e evitar mais desemprego. É tudo uma questão de sentar e negociar. Se chegamos a esse ponto, de iniciar uma paralisação em São José dos Campos, é porque tivemos várias rodadas de negociação que não deram em nada. Tivemos 19 dias para achar uma solução e eles (empresários) não se posicionaram. Só quiseram conversar quando radicalizamos.

Folha - Mas por que agora? Isso tem relação com o fato de o sindicato pertencer à uma ala mais radical da CUT e, no momento, querer adotar uma postura mais crítica ao novo governo?
Prates -
Nós fizemos no final do ano e, portanto, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso, uma campanha forte por reajuste salarial e redução de jornada. Negociamos com Philips, Solectron e outras empresas grandes. Com a GM, conseguimos aumento de 10,26% mais abono de R$ 350. O índice ficou abaixo do reivindicado pela categoria, que era de 20%. Se tivessem aceitado naquela época, não estaríamos nesse "pé" agora. Isso, portanto, não tem nada a ver com o novo governo, mas com negociação sindical. Queremos o que é nosso direito, seja num governo de um ex-líder sindical ou não.

Folha - Mas as paralisações só aconteceram neste ano.
Prates -
Há uma linha de pensamento majoritária na CUT dizendo que temos de "maneirar". Achavam, desde o ano passado, que era melhor esperar e iniciar uma campanha forte de reposição do salário perdido com a entrada do Lula. Isso caso a inflação não fosse controlada.
Já temos uma taxa (inflacionária) que ultrapassa 10%. Ou seja, o governo entrou e os preços continuam lá em cima. Aí não dá para segurar e é preciso renegociar salários. Sou contra essa maioria que prefere receber só abonos no lugar de um reajuste salarial justo. A idéia é cobrar desse governo que prometeu e não fez nada até agora. Até porque a eleição de Lula gerou uma expectativa que começa a se tornar frustrante.

Folha - O senhor defende a implantação de um gatilho salarial?
Prates -
A hipótese de um gatilho salarial existe dentro desse raciocínio de proteção ao trabalhador. Toda vez que a inflação acumular 3%, os salários dos trabalhadores seriam reajustados imediatamente, na mesma medida. E não acreditamos que isso gere inflação, já que ninguém vai sair por aí gastando esse dinheiro em consumo exagerado, o que poderia gerar uma inflação de demanda, por exemplo. Acho até muito estanho que o Palocci (Antonio Palocci Filho, ministro da Fazenda) diga que os reajustes podem gerar inflação. Isso é absurdo. Só vamos reincorporar o que foi perdido.

Folha - Entre os sindicatos ligados à CUT, não há união em torno das reivindicações salariais. A proximidade com o PT está imobilizando a CUT? Há um racha na central?
Prates -
A Federação Estadual dos Metalúrgicos pleiteou um abono salarial com as montadoras. Em outros setores, há categorias buscando uma campanha salarial de emergência, para repor perdas com a inflação. Já nós queremos o gatilho. Não há unidade total. Há discordâncias naturais, mas nossa posição não mudará.


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