São Paulo, sexta-feira, 27 de abril de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Esparadrapo na importação

Proteção a indústria de roupa e calçado é casuísmo; real forte é problema, mas falta política de longo prazo

AINDA CAUSA espécie o aumento do Imposto de Importação de roupas e sapatos. É sabido o estrago adicional que o real forte causa na indústria de bens não-duráveis (roupa, sapato, comida etc.).
Tais indústrias sofrem, de resto, com o comércio chinês desleal. Trata-se ainda de um estrago especialmente doloroso, pois essas fábricas empregam muita gente, alimentam a indústria de máquinas e são dos poucos empreendimentos que criam cadeias mais longas e complexas de negócios em lugares mais atrasados do país. Nos últimos 12 meses, a importação de bens não-duráveis cresceu em torno de 20% (em quantidade); a exportação parou de crescer. São R$ 23 bilhões em valor exportado, 16,5% do total das vendas brasileiras para o exterior.
A primeira das perguntas óbvias a respeito da medida é: por que apenas roupas e calçados? Tal setor não é vítima de bala perdida. A indústria inteira sofre com o tiroteio cambial, com exceção de grandes empresas, em geral exportadoras de produtos básicos e/ou multinacionais que amortecem a perda de rentabilidade por meio de ganhos financeiros e negócios com a matriz (vide gráfico com dados do setor de bens duráveis, cerca de 5% das exportações).
Segunda questão: a proteção tarifária vai durar até quando? Sob quais condições? Quando a alíquota do imposto cair, o que terá sido feito da indústria? Se não houver ganhos de produtividade, inovação tecnológica, redução de impostos e, mais improvável e fora do alcance, mudança no câmbio, o que será do setor quando e se for novamente exposto à competição? Falir de chofre?
Terceira: vai haver um programa geral de aumento de Imposto de Importação? As importações também ajudam a segurar preços e compensam insuficiências de abastecimento de insumos. O que acontecerá se houver aumento de preços?
O câmbio é um problema, embora tenha passado a fase aguda de valorização do real, que se aproxima de zero, enquanto os preços dos produtos brasileiros continuam subindo a 10%, 11%. Mas tais movimentos são cíclicos, por mais que se diga "agora vai ser diferente", como se costuma dizer durante bolhas e euforias de preços, por mais que a Ásia tenha alterado o balanço e a balança do comércio, por mais que a economia brasileira tenha se normalizado. A presente relação entre preços de exportações brasileiras e moeda nacional forte é a mais excepcional em mais de 20 anos. O que será quando a canoa virar? Sim, temos reservas inéditas em moeda forte, o câmbio é flutuante. Mas haverá um baque.
O problema maior da alta do Imposto de Importação é seu caráter de esparadrapo econômico. Não há plano sério de redução de impostos, programas de incentivo à renovação tecnológica, de incentivo a indústrias nascentes, de ponta. Não há política pública na área econômica: apenas juros e impostos altos.


vinit@uol.com.br

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