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OPINIÃO ECONÔMICA
Os programas PPP
CLÁUDIO LEMBO E MONICA HERMAN CAGGIANO
A última década do século
20 trouxe à tona uma série de
desafios a um Estado fragilizado
sob o peso de economia de inspiração centralizadora, um Estado
burocratizado, pressionado por
compromissos financeiros e,
principalmente, carente de instrumentos adequados a oferecer
resposta satisfatória às demandas
sociais.
No Brasil, a exigência de novos
mecanismos para apoiar a auto-sustentabilidade sensibilizou analistas e legisladores. Reflexo disso
é a reorientação constitucional,
inaugurada com a emenda constitucional nš 3, de 1993, que desencadeou o processo de redução
da presença do Estado na economia.
Reservando-lhe o papel de regulador da atividade econômica e
assegurando-lhe a possibilidade
de transferir para o setor privado
parte das suas incumbências, a
Constituição Federal preparou o
terreno para a colaboração da esfera privada no segmento dos serviços e obras públicas, buscando
imprimir às iniciativas públicas
agilidade, presteza, competitividade e custos menores -enfim,
níveis mais próximos à idéia de
excelência que o princípio da eficiência reivindica.
Nesse contexto, ajustam-se os
programas PPP (Parceria Público-Privada) à perspectiva constitucional de modernizar a ação estatal, dando-lhe o apoio do setor
privado e envolvendo a sociedade
nas tarefas remanescentes do setor público.
Na plataforma PPP, não há lesão aos standards constitucionais.
Envolve projetos de parceria com
o setor privado para a realização
de obra pública ou a execução de
serviços; isso, porém, no âmbito
de um quadro balizado pela legalidade e pelo atendimento aos
princípios a nortear a ação estatal,
um contexto atento ao princípio
licitatório, que preserva e privilegia o poder de controle e fiscalização estatal, em nenhum momento inibidor da "potestad publica".
No entanto oferece referida plataforma de inovações, reclamando por um sistema de garantias
mais atraente para o setor privado, pela introdução de prazos
mais condizentes com a exigência
de amortização dos investimentos efetuados, por um desenho
próprio para a fórmula remuneratória e, de modo especial, exigindo um ambiente de credibilidade, o que conduz à imposição
de uma receita apta a assegurar
concreta governabilidade aos
programas PPP.
O padrão PPP não envolve e não
se envolve com a figura da privatização. Embora transfira para o
domínio privado a feitura de obra
pública, acompanhada da execução de serviço ou tão-somente esse, mediante um adequado mecanismo remuneratório (tarifário
ou não), não há o repasse da responsabilidade final. Essa continua na esfera estatal, pois a obra e
o serviço continuam na área de
competência do poder público.
Os contornos da PPP, todavia,
recomendam um tratamento específico, para garantir eficácia à
receita proposta e um hábil sistema de governança. Daí resultarem as propostas de legislação especial para disciplinar o tema e
enfrentar os tópicos de maior sensibilidade, a exemplo de padrão
adequado para o enquadramento
jurídico desses elementos: sistema de remuneração; sistema de
garantias; prazos; sistema de controle e fiscalização do poder público; sistema para assegurar a governabilidade do projeto.
A União, o Estado de São Paulo
-por iniciativa do governador
Geraldo Alckmin- e o Estado de
Minas Gerais são pioneiros na
tentativa de oferecer um tratamento legal ao novo figurino que
pretendem aplicar, notadamente,
no espectro dos projetos de desenvolvimento da infra-estrutura.
Em São Paulo, o projeto de lei nš
1.141/2003 detém-se sobre os
princípios de regência e, sob a nomenclatura de diretrizes, anuncia,
como nos demais textos, a eficiência, o respeito aos interesses e direitos dos destinatários dos serviços, a indisponibilidade das funções reguladora, controladora e
fiscalizadora do Estado, a universalização do acesso a bens e serviços essenciais e a transparência.
Nos moldes propostos pelo governo do Estado de São Paulo, o
programa PPP assume a natureza
de "mecanismo de colaboração
entre o Estado e agentes do setor
privado", tendo por objeto: a) intervenções na infra-estrutura pública; b) prestação de serviço público; c) exploração de bem público; d) exploração de direitos de
natureza imaterial de titularidade
do Estado, tais como marcas, patentes, bancos de dados, métodos
e técnicas de gerenciamento e gestão.
A iniciativa paulista preconiza a
criação de uma entidade, a Companhia Paulista de Parcerias, uma
sociedade por ações, direcionada
a apoiar e viabilizar a implementação dos programas PPP, inclusive para servir de suporte ao oferecimento de garantias adequadas.
Não há e não se vislumbra nessa
nova fórmula a marginalização de
princípios e regras a orientar a
atuação administrativa. Não se
afasta a responsabilidade fiscal,
quando o erário vier a ser onerado; não se ignora a exigência de licitação -ao contrário, o projeto
federal é enfático ao impor a mais
severa de suas modalidades, a
concorrência- para fins de contratação PPP (art. 10 do projeto de
lei nš 2.546, de 2003); a reserva da
função reguladora, fiscalizadora e
de controle resta assegurada.
Os programas PPP, de fato, caracterizam-se por introduzir na
área de atuação da administração
pública instrumentos dotados de
maior grau de flexibilidade. Procedimentos esses que, nos termos
de resultados obtidos em outros
países, irão concorrer para incrementar a eficiência no atendimento de demandas da coletividade. Exatamente esse atributo,
todavia, é que indica a exigência
da adequada governança dos programas PPP, em razão de suas peculiaridades, em razão da plasticidade que os tornam extremamente sensíveis, enfim, em razão da
responsabilidade que o Estado assume ao transferir uma atribuição
sua para o particular, o qual, a par
de assumir o compromisso de obtenção do financiamento da atividade, deve incorporar também a
obrigação do adequado desempenho.
Cláudio Lembo, 69, professor titular de
direito constitucional da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, é vice-governador do Estado de São Paulo.
Monica Herman Caggiano, 56, professora associada de direito constitucional
da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo e professora titular de direito constitucional da Universidade
Presbiteriana Mackenzie, é chefe-de-gabinete do vice-governador de São Paulo.
Excepcionalmente, hoje, a coluna
de Paulo Nogueira Batista Jr.
não será publicada.
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