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LUÍS NASSIF
A insulina e a
operação Vampiro
Em uma página do jornal, o
ministro da Integração Regional, Ciro Gomes, acusa o ex-ministro da Saúde José Serra de
ter manipulado uma licitação
de compra de insulina para prejudicar a mineira Biobrás. Na
mesma página, uma reportagem informa que uma funcionária do Ministério da Saúde
está sendo acusada de ter beneficiado irregularmente a Biobrás em uma outra licitação de
compra de insulina.
Se a cobertura brasiliense do
episódio pudesse parar um minutinho para se planejar e parar de sair atirando no que vê e
no que não vê, se as autoridades
parassem com esse oportunismo de caça às bruxas, de sair
acusando dezenas e dezenas de
funcionários, poderiam-se separar alhos de bugalhos, questões policiais de questões legais,
e ir ao que interessa: a não-utilização, pelo governo, da capacidade de compra do Estado
para estimular empresas nacionais.
O "escândalo" divulgado ontem por Ciro Gomes não existe.
Houve uma licitação para a
compra de insulina no Ministério da Saúde. A Biobrás produz
insulina e é competitiva, mas
paga impostos na produção interna, enquanto os concorrentes importados eram isentos
-uma excrescência tributária.
Ocorre que existe uma Lei das
Licitações que obriga a que se
aceite o menor preço. Se Serra
tivesse seguido a razão, considerado o diferencial de impostos,
a Biobrás teria vencido e o ex-ministro seria denunciado por
ter ferido a Lei das Licitações,
como está sendo a funcionária
que seguiu a lógica, na nova licitação, mas feriu a lei.
Praticamente todos os países
desenvolvidos utilizam as compras governamentais para o desenvolvimento ou a reestruturação de setores considerados
estratégicos. A medida provisória sobre estaleiros é típica dessa prática, que tem que ser utilizada com discernimento e impessoalidade, mas é ferramenta
legítima de desenvolvimento.
Os Estados Unidos utilizam
esse instrumento desde 1933, regulamentado por meio do "Buy
American Act". As agências governamentais são proibidas de
comprar bens e serviços de empresas estrangeiras, e há níveis
mínimos de conteúdo local que
devem ser atendidos nas compras e são definidos termos preferenciais de preços para as empresas locais. Também há tratamento diferenciado para as
pequenas empresas, regulamentado por meio do "Small
Business Act", de 1953. A lei determina que aquisições entre
US$ 2.500 e US$ 100.000 devem
ser reservadas às micro e pequenas empresas.
A política industrial apresentada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior não aborda esse tema. Apesar disso, a compra pelo
Estado é citada no projeto de
Lei de Inovação, encaminhado
ao Congresso no final do mês de
abril. O artigo 20, na prática,
viabiliza uma espécie de política de "compras governamentais", apoio ao desenvolvimento
tecnológico industrial, mesmo
que de maneira restrita à compra de serviços e pesquisa e desenvolvimento, explica Carlos
Pacheco, ex-secretário-executivo do Ministério da Ciência e
Tecnologia e pesquisador da
Unicamp.
No caso da insulina, a discussão relevante é essa, e não ficar
criando denúncia onde não
existe o escândalo.
SDE
O secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg, informa à
coluna que, em vista dos argumentos levantados aqui ontem
-de que há que se identificar
a razão da diferença de preços
nos hemoderivados, para saber
se houve irregularidades no
passado-, instaurou um inquérito para que sua equipe
possa analisar tecnicamente o
mercado, a fim de impedir acusações sem embasamento técnico.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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