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OPINIÃO ECONÔMICA
Consulta relâmpago compromete a boa regulação
GESNER OLIVEIRA
Há avanços e retrocessos
nos anteprojetos de reforma
das agências reguladoras que vieram a público na última terça-feira. O problema é que os últimos
comprometem a regulação da infra-estrutura a tal ponto que os
possíveis avanços ficam perdidos
pelo caminho.
O governo acerta ao desejar fortalecer os mecanismos de controle
social sobre as agências reguladoras. Em relação a esse ponto, o anteprojeto contém dispositivos
úteis, como a obrigatoriedade de
relatório anual das atividades
desses organismos. Seria bom garantir para as agências aquilo
que o governo quer, erroneamente, deixar de fazer com as instituições de ensino, isto é, submetê-las
a regime permanente de avaliação. Que seja bem-vindo o provão
das agências, mediante a publicação de indicadores objetivos de
eficiência, como, por exemplo, o
grau de cumprimento dos prazos.
Isso reduziria uma das principais
dores de cabeça do setor produtivo, que é a demora nos processos
de decisão administrativa, para
não falar do Judiciário! Também
seria um desafio estatístico interessante construir e divulgar o índice de engavetamento de processos para constranger a morosidade.
O governo atacou finalmente a
importante questão de coordenação entre os reguladores setoriais
e os órgãos de defesa da concorrência e do consumidor. Porém
não resolveu o problema definindo de forma clara quem decide
sobre o quê. Limitou-se às frases
acacianas de que é preciso promover a articulação das atividades desses organismos. De concreto, mesmo, há muito pouco.
O problema grave da proposta
do governo reside na subordinação das agências aos ministério,
um amargo regresso ao passado
de ineficiências e loteamentos político-partidários. Mas a proposta
é esperta. Não se explicita que esse
é o objetivo, como é feito, por
exemplo, em recente projeto da
deputada Telma de Souza (PT-SP).
A intenção centralizadora e
anacrônica está bem disfarçada
pelos instrumentos modernosos
do contrato de gestão e de uma
suposta CCA (Comissão de
Acompanhamento e Avaliação).
Os contratos de gestão propostos
objetivam compatibilizar as atividades regulatórias aos programas governamentais, confundindo a atuação técnica dos reguladores com a plataforma política
do governo; o poder concedente é
transferido para os ministérios setoriais, gerando conflito de interesse nos casos de Minas e Energia, que tem assento na administração da Eletrobás e da Petrobras.
A CAA, por sua vez, ficaria subordinada à administração direta com poderes que, na prática,
deverão interferir nas decisões
das agências reguladoras. Concentra-se, dessa forma, no Executivo uma função supervisora que
seria típica de comissões especializadas do Congresso. A experiência secular dos EUA é particularmente ilustrativa a esse respeito,
recomendando maior participação do Legislativo.
Além disso, ainda se reduziu
discretamente em um ano o mandato dos membros das agências. E
até se resgatou a figura do ouvidor do rei, indicado diretamente
pelo presidente da República e
encarregado de bisbilhotar o dia-a-dia dos reguladores.
Além disso, não se falou nada
em dotar as agências de recursos
condizentes com suas responsabilidades. Está na hora de acabar
com o sem-número de secretarias
e ministérios inúteis e aparelhar
as agências reguladoras. E não
transformá-las em aparelhos.
É muito difícil fazer gol relâmpago. Como o do atacante Nivaldo, do Atlético Mineiro, que em
oito segundos abriu o marcador
contra o Náutico, em 1989. O governo deveria rever o prazo dessa
consulta relâmpago. Essa administração demorou nove meses
para chegar a um projeto de reforma das agências reguladoras.
Mas só deu sete dias para o debate. É muito pouco para um tema
complexo e crucial para aquilo de
que a economia mais precisa: aumentar o investimento e crescer.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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