São Paulo, domingo, 27 de setembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INDICADORES
De 1990 a 1998 crescimento acumulado deve ficar em 17,5%, contra 29,3% em igual período aos anos 80
PIB cresce menos que na "década perdida'

ANDRÉ SOLIANI
da Reportagem Local

O Brasil vai crescer menos nos anos 90 que nos anos 80, a chamada "década perdida".
Entre 1990 e 1998, o PIB (total das riquezas produzidas) deve aumentar 17,5%, se o Brasil crescer 1% em 98, segundo a Fundação Getúlio Vargas. No mesmo período dos anos 80, cresceu 29,3%.
A taxa de crescimento, porém, não é suficiente para caracterizar os 90 como anos perdidos, segundo seis economistas, de diferentes posições ideológicas, consultados pela Folha. Segundo eles, é preciso avaliar a capacidade de crescimento futuro da economia, após as reformas econômicas e institucionais do anos 90.
O resultado da atual crise dirá se o sacrifício terá sido em vão, e, portanto, essa será mais uma "década perdida".
Caso seja garantida a estabilidade da economia e corrigido o déficit público, os resultados econômicos medíocres do período serão um custo para garantir a volta do crescimento sustentável, diz o ex-ministro Roberto Campos.
"Se tudo der errado, serão mais dez anos perdidos", completa o ex-ministro Mailson da Nóbrega. "A sociedade terá arcado com os custos, sem colher os benefícios."
Na opinião dos analistas, uma coisa é certa: os anos 90 devem ser definidos como um período de transição para o Brasil. Um modelo de economia fechada, baseado na intervenção estatal, foi substituído por um modelo aberto, baseado na iniciativa privada.

Balanço da década
Para o economista da Unicamp Márcio Pochmann, desde a década de 80 o país não consegue resolver seus problemas econômicos, como o déficit público, e retomar o crescimento.
Segundo ele, entre 1960 e 1980 o Brasil crescia em média 7,4% ao ano. Desde então, o crescimento médio tem sido de 1,9%. O mesmo aconteceu com a renda média, que de 4,5% ao ano passou para 0,2%.
Campos afirma que a década de 90 só começou de fato depois do Real, em 1994. A partir desse ano, o PIB da economia voltou a crescer a taxas mais altas, em média, 3,42%. Inferiores, porém, aos melhores cinco anos da década passada: 3,68% de 84 a 88.
A renda média do trabalhador também teve ganhos após o Real. Segundo Pochmann, atingiu seu pico em 96, com 3,26 salários mínimos (os dados de 97 não estão disponíveis). Porém, desde 1980 o trabalhador teve sua maior renda em 1986: 3,55 salários mínimos.
A distribuição de renda também melhorou após o Real, mas apenas atingiu o patamar de 86, diz o economista da USP Paulo Yokota.
O desemprego, por outro lado, vive seu pior momento no Real e deve piorar, segundo Sérgio Mendonça, diretor do Dieese. Segundo o IBGE, está em 8,02%.
Outro grande perda nos 90 é a capacidade exportadora do país, segundo o economista Yokota. Em 1980, o Brasil chegou a participar com 1,46% do comércio internacional. Hoje a participação brasileira é de 0,97%. "Perdemos mercado", diz ele.
Para Pochmann, o Plano Real melhorou os indicadores econômicos da década de 90, mas apenas os equiparou aos melhores anos da década anterior.
A taxa de investimento, por exemplo, que serve como medida da expansão da capacidade futura de produção de um país, voltou a crescer depois do Real, mas ainda está abaixo da dos anos 80.
No Real, porém, o Brasil conquistou o controle da inflação, que se mantido justifica os esforços, segundo os economistas consultados. No final dos anos 80, a inflação chegou a quase 700% ao ano e, antes do Real, já era de mais de 2.400% ao ano. Para este ano, a Fipe estima inflação de 0,5%.
Mas a estabilidade ainda não está concluída, segundo o próprio governo. A dependência brasileira do capital externo em um ambiente internacional hostil ao financiamento e os insistentes déficits públicos são as principais fragilidades do país, afirma o economista da Unicamp Aloizio Mercadante.
Mas, para comparar os 80 com os 90, Nóbrega afirma ser preciso levar em conta os avanços sociais e a abertura da economia. "Olhar apenas os indicadores econômicos pode levar à conclusão de que esta é a "década perdida".
Foi este ano, por exemplo, que o Brasil entrou pela primeira vez no grupo considerado de alto nível de desenvolvimento humano, segundo um indicador da ONU.
O que preocupa Yokota, entretanto, é o cenário para o próximo ano: recessão. "A década não foi das melhores até agora, e vamos precisar de mais sacrifícios para garantir a estabilidade em 99."



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.