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São Paulo, terça-feira, 28 de janeiro de 2003

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EM TRANSE

Para secretário de Política Econômica, Brasil está preparado para a guerra

Ajuste reduz fragilidade, diz Lisboa

Leo Pinheiro - 11.nov.02/"Valor"
O secretário de Política Econômica da Fazenda, Marcos Lisboa


GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

Desde a sexta-feira passada, o mundo parou diante da ameaça de guerra no Oriente Médio. As Bolsas despencaram, o dólar no Brasil voltou para a casa dos R$ 3,60 e o risco-país superou a marca dos 1.400 pontos.
Para o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa, 38, o mundo está diante de uma nova crise, e o Brasil não estará fora dela. Diante desse cenário, a única alternativa do governo, no curto prazo, para enfrentar essa grave crise, é o ajuste fiscal. "Não há muito a ser feito no curto prazo, só mesmo o ajuste fiscal", afirmou.
Lisboa, considerado o principal formulador de política econômica da equipe do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, afirma também que o novo governo encontrou as contas fiscais do país numa situação de fragilidade.
O governo Fernando Henrique Cardoso, segundo Marcos Lisboa, se descuidou do aspecto fiscal, principalmente no primeiro mandato.

Folha - Como o sr. analisa essa crise iniciada na sexta-feira passada?
Marcos Lisboa
- A economia internacional sofreu graves abalos desde a semana passada, com quedas significativas das principais Bolsas e a desvalorização das moedas dos nossos vizinhos na América Latina. Houve, inclusive, uma forte desvalorização cambial do real na sexta-feira.

Folha - A economia brasileira está preparada para uma guerra?
Lisboa
- A economia está preparada para a guerra. Não ocorreu redução dos fluxos externos, e as medidas que já foram adotadas e as fiscais que serão anunciadas deixarão claro que estamos preparados para as eventuais dificuldades externas. Desde o primeiro dia de governo, o ministro Palocci tem deixado clara a necessidade de um ajuste sólido e de qualidade das contas públicas de modo a reduzir nossa vulnerabilidade. A regra tem sido trabalhar sempre com cenários diversos, inclusive com cenários externos pessimistas, de forma a estarmos preparados para qualquer dificuldade.
A ameaça de guerra já está presente há algum tempo, assim como a possibilidade de recessão nos países europeus. O ano passado foi um ano bastante difícil. Além dos problemas conjunturais, herdamos uma elevada relação dívida/PIB, com uma estrutura de dívida concentrada em títulos de curto prazo. Por isso mesmo, temos trabalhado para retirar a economia brasileira das armadilhas que marcaram o último governo.

Folha - Que armadilhas são essas?
Lisboa
- O governo Fernando Henrique Cardoso conviveu com desequilíbrios fiscais durante seu primeiro mandato, sendo esses desequilíbrios, além da condução da política monetária naquele período, os responsáveis em parte pela atual dívida pública. No segundo mandato houve uma certa melhora das contas públicas, mas que foi obtida via receitas temporárias ou extraordinárias, o que fragiliza a economia a médio prazo. Como diz o ministro Palocci, é preciso desarmar essas armadilhas, o que significa contas públicas equilibradas tanto no curto prazo como no médio e no longo prazos, com qualidade tanto das receitas quanto dos gastos. E qualidade significa boa previsão de receitas, fontes estáveis de recursos, prioridade nos gastos. A prioridade do governo são os gastos sociais. O ajuste das contas públicas tem como objetivo tornar nossa economia sólida para eventuais choques externos e garantir que nossa retomada de crescimento econômico não mais seja afetada pelos humores externos. O governo FHC nos deixou uma herança difícil. Houve descuido, principalmente no primeiro mandato.

Folha - O Brasil vai precisar aprofundar o ajuste fiscal?
Lisboa
- Nós já tínhamos uma perspectiva de guerra e preparamos o ajuste a ser anunciado pelo ministro Palocci com essa perspectiva. Nós já estávamos vivendo, há algum tempo, a crônica de crise anunciada.

Folha - Haverá necessidade de mais dinheiro do FMI?
Lisboa
- Como o ministro Palocci tem afirmado, estamos trabalhando para não mais precisarmos de recursos do FMI.

Folha - Acelerar as reformas não seria uma alternativa?
Lisboa
- As reformas estão na ordem do dia, e o governo tem deixado clara essa necessidade.

Folha - O governo Lula pode estar começando a provar um gostinho do governo FHC, que também conviveu com várias crises externas?
Lisboa
- Estamos nos livrando da herança de uma economia fragilizada, na qual problemas externos são ampliados pelas nossas dificuldades internas. Os ministros Palocci e Mantega têm deixado clara a prioridade de resgatar um ajuste de longo prazo das contas públicas para desarmar as armadilhas que recebemos. Com serenidade, trabalho e as medidas de política econômica que têm sido e serão adotadas, nossa fragilidade será reduzida e a economia poderá retomar uma trajetória de crescimento equilibrado.

Folha - O que pode ser feito para vencer essa crise?
Lisboa
- A curto prazo, não há muito a ser feito, só mesmo o ajuste fiscal. O que temos de procurar fazer é nos preparar para que uma próxima crise não nos pegue como agora. Agora, no curto prazo, o que tem de ser feito é mesmo o ajuste fiscal para não jogar todo o custo sobre a política monetária.

Folha - Os programas sociais serão afetados no ajuste fiscal?
Lisboa
- Não. Os cortes não atingem os programas sociais do governo.


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