São Paulo, Quinta-feira, 28 de Janeiro de 1999
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MERCADO TENSO
Empresário diz que mudança no câmbio foi correta, mas em momento inadequado e marcada pela improvisação
"Governo está atônito", afirma Brandão

da Reportagem Local

Antes de anunciar que deixaria a presidência do Bradesco, Lázaro Brandão fez duras críticas à condução da política econômica.
A única coisa considerada acertada foi a decisão de liberar o câmbio.
"A mudança na política cambial foi correta, mas em momento inadequado e com muita improvisação", afirmou Brandão.
Para ele, a mudança cambial "trouxe desdobramentos de uma medida sem preparo e deixou governo sem volta".
Ele considera que o mercado está muito nervoso e excitado em boa parte porque o governo não tem mostrado claramente medidas para reativar a economia. "O governo está atônito", disse ele.
"O governo está muito encolhido. Houve uma desorientação clara após a desvalorização. Ele tem de deixar claras ações que mostrem que está atuando. O governo não tem feito isso, está na defensiva", disse Brandão.
Em sua estimativa, a desvalorização do real já ultrapassou muito as projeções. Para ele, uma desvalorização ideal ficaria entre 20% e 30%.
O banqueiro considera que a tarefa de equilibrar a taxa de câmbio não é fácil. "Intervir no mercado vendendo dólares traz o risco de sangrar as reservas", afirmou.

Itamar Franco
Lázaro Brandão não considera o governador mineiro, Itamar Franco, culpado pela instabilidade que levou à desvalorização.
O governador de Minas decretou moratória da dívida do Estado para com a União logo depois de tomar posse no início do mês.
"Ele apenas detonou o processo. Na verdade, foi a fragilidade do país que apareceu. O país não fez a lição de casa a tempo", afirmou ele.

"Comprado" em dólares
Segundo os executivos do banco, o Bradesco não teve prejuízos com a desvalorização. Ao contrário.
Ageo Silva, vice-presidente responsável pela tesouraria do banco, afirmou que logo nos primeiros dias do ano o Bradesco aumentou seu estoque de títulos atrelados à variação cambial por perceber que o cenário da economia estava se deteriorando e que havia um risco cambial maior.
Assim, quando veio a desvalorização, o banco teve um lucro com esses títulos cambiais. No jargão do mercado financeiro, o Bradesco estava "comprado" em dólares. Isso no lado das operações de tesouraria, ou seja, com o próprio caixa do banco.
Quanto às operações de crédito, o banco estava "casado", segundo Antonio Bornia, o vice-presidente responsável pela área.
Estar "casado" significa que para todas as linhas de crédito em dólares que o banco tomou, havia uma proteção contra a variação do câmbio.
Segundo Bornia, em 31 de dezembro de 98 o Bradesco tinha um estoque de US$ 1,51 bilhão de captações feitas em dólares, ou seja, essa era a sua dívida em dólares.
Desse total, US$ 1,17 bilhão foram repassados a clientes também com variação cambial. Os outros US$ 340 milhões estavam protegidos por títulos federais com variação cambial.
O único risco agora é o da inadimplência dos clientes que tomaram empréstimo em dólares do banco. "As empresas, assim como nós, foram surpreendidas pela desvalorização", disse Bornia.
Segundo ele, as operações de crédito são muito pulverizadas, o que reduz o risco. "Mas nós renegociaremos os contratos se for necessário. Estamos com a porta aberta para renegociar caso a caso", disse Bornia.

Vencimentos
Da dívida total em dólares que o banco tem -US$ 1,51 bilhão-, US$ 538 milhões vencem este ano.
Segundo Bornia, é pequena possibilidade de rolagem das dívidas, ou seja, de emissão de um novo título de dívida para levantar recursos e quitar a dívida que está vencendo.
"Ainda não testamos o mercado. Se não rolarmos a dívida, pagaremos rigorosamente em dia", afirmou ele.
Bornia disse que, mesmo que os investidores estrangeiros voltem a ter apetite pelos títulos do banco, o Bradesco poderá optar por quitar a dívida. "Se as condições de rolagem não forem boas, como prazo e taxa a pagar, podemos optar por quitar."
(VANESSA ADACHI)


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