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ENTREVISTA
Assessor de Malan afirma que meta de inflação será de longo prazo
Ainda não é hora de abaixar
a guarda, diz Amaury Bier
VALDO CRUZ
Diretor-executivo da Sucursal de Brasília
VIVALDO DE SOUSA
da Sucursal de Brasília
O governo vai definir metas de
inflação de longo prazo quando
adotar, no segundo semestre, o novo modelo da política de estabilização da economia. "Os objetivos
devem ser de mais longo prazo",
disse à Folha o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Amaury Bier.
O sistema de metas de inflação,
ou "inflation targeting", foi definido com o FMI (Fundo Monetário
Internacional) para substituir a
âncora cambial como base da estratégia de estabilização.
Até a flutuação do câmbio, o sustentáculo do Plano Real era o câmbio sobrevalorizado -as importações ficavam baratas e mantinham
os preços sob controle. Com o "inflation targeting", o governo define uma meta de inflação para um
período e passa a adotar as medidas necessárias para cumpri-la
-como juros altos e cortes de gastos.
O economista citou como exemplo a Inglaterra, que adota o mesmo modelo, onde já foi usado um
período de dois anos para definir a
meta de inflação. Ele não quis dizer, porém, se esse espaço de tempo também será escolhido no Brasil.
Um prazo mais longo dá mais
flexibilidade ao governo para cumprir suas metas. Num período mais
curto, a meta pode ser inviabilizada devido a oscilações nos índices
de inflação provocadas por crises
momentâneas ou efeitos sazonais
(alta de um determinado produto
por escassez, por exemplo).
Amaury Bier deve assumir em
abril o posto de secretário-executivo do Ministério da Fazenda, na
prática o vice-ministro, com a ida
de Pedro Parente para o lugar do
ministro Paulo Paiva (Orçamento
e Gestão).
Um dos principais negociadores
com o FMI, o secretário disse que a
previsão para 99 de queda do PIB
(Produto Interno Bruto) contida
no acordo com o Fundo, de 3,5% a
4%, foi conservadora. Ele chega a
apostar num número melhor: entre 2,5% e 3%.
Apesar da melhora na situação
econômica do país nos últimos
dias, Bier afirmou que "ainda não é
hora de abaixar a guarda". Ele não
acredita, porém, que seja necessário adotar novas medidas para
mostrar ao mercado que o governo
manterá sua disposição de promover um ajuste fiscal.
A seguir, trechos da entrevista
concedida na última quinta-feira:
Folha - A meta de inflação, dentro da nova política econômica, é a
que está prevista no acordo com o
FMI , de 16,8%?
Amaury Bier - O que existe no
acordo são cenários necessários
para que os compromissos assumidos sejam quantificados. Que
permitam o cálculo dos compromissos, das metas indicativas e dos
critérios de desempenho. Nós estamos falando de uma coisa diferente no caso das metas de inflação:
uma missão clara para o Banco
Central no que diz respeito à política monetária. Uma missão quantitativa e avaliada em termos de metas inflacionárias.
Folha - As metas inflacionárias
podem ser trimestrais ou semestrais?
Bier - Não há definição sobre isso. No início, os objetivos devem
ser de mais longo prazo. Não podem ser objetivos de curto prazo.
Folha - A meta pode ser então de
um ano ou até superior a 12 meses?
Bier - Vários países adotam prazos mais dilatados. Por exemplo,
metas de dois anos. A Inglaterra
usou, pelo menos num primeiro
momento, metas de dois anos.
Folha - É a inflação acumulada ou
a do último mês do período que
vale como meta?
Bier - Me refiro à taxa acumulada
de inflação. Essa é a fórmula mais
adequada de olhar o problema.
Folha - O Congresso Nacional será informado periodicamente sobre o comportamento dessas metas?
Bier - Essa é uma idéia presente
nas nossas intenções, mas, neste
momento, é difícil explicitar algo
que ainda está sendo discutido. O
assunto será discutido principalmente com o Banco Central e, portanto, não seria bom eu me aprofundar mais sobre o tema.
Folha - No âmbito do Banco Central, isso envolve algum tipo de
mudança nos compulsórios recolhidos pelas instituições financeiras?
Bier - Não sei. Não discutimos esse tema ainda. Evidentemente há
idéias a esse respeito e estudos que
precisam ser aprofundados. Uma
das idéias é reformular um pouco a
estrutura de compulsórios (do dinheiro que os bancos captam, uma
parcela tem de ser recolhida obrigatoriamente ao BC). O compulsório sobre depósitos à vista no Brasil
é muito alto hoje. Qualquer comparação internacional mostra isso.
Mas isso não tem uma relação direta e imediata com o tema da meta
inflacionária.
Folha - O governo já deixou claro
que, no caso das metas inflacionárias, vai trabalhar com um índice
de preços ao consumidor. Mesmo
esses indicadores estão sujeitos
aos efeitos sazonais. Esses efeitos
serão expurgados, como já é feito
pelos países que adotam esse tipo
de meta?
Bier - Teremos uma definição a
respeito disso mais adiante. A idéia
de tomar um índice de preços ao
consumidor para efeito da estrutura de metas inflacionárias é uma
idéia vencedora. Com relação a
buscar o núcleo inflacionário, essa
é uma discussão que ainda não foi
feita e sobre a qual ainda não há
nenhuma indicação.
Folha - Os institutos que pesquisam taxas de inflação já indicam
que há uma desaceleração na remarcação de preços. O senhor acha
que a taxa deste ano ficará abaixo
dos 16,8% previstos no acordo
com o FMI?
Bier - O que nós tentamos fazer
foi olhar para o intervalo entre os
indicadores que mostram a variação de preços no atacado e ao consumidor. E, para fechar o trabalho,
tivemos que definir um índice e foi
16,8%.
Folha - O presidente Fernando
Henrique Cardoso acha que a inflação não vai chegar a esse patamar...
Bier - Certamente não acontecerá
nos índices de preço ao consumidor. A perspectiva é de uma inflação bem mais baixa.
Folha - De quanto o sr. acha que
será? A Fipe (Fundação Instituto de
Pesquisa Econômica) projeta algo
entre 10% e 12%...
Bier - Podemos tomar a estimativa da Fipe como uma avaliação razoável e compatível com o IGP de
16,8%.
Folha - Com a queda do dólar, a
situação está melhor do que se
imaginava?
Bier - A evolução é positiva. Mas
eu acho que ainda não é hora de
abaixar a guarda. Vamos trabalhar
no sentido de manter essa trajetória de melhoria que está se insinuando. Ela certamente não pode
ser considerada uma realidade já
estabelecida. É preciso ainda muito cuidado e atenção.
Folha - Essa posição mais conservadora é fruto das experiências recentes, quando o governo passava
por uma crise, adotava medidas
fiscais e, depois, relaxava nos controles?
Bier - Não considero essa uma
descrição adequada do que aconteceu nos últimos anos, pelo menos desde que eu me juntei ao governo. E tampouco acho que seja o
caso agora. Do ponto de vista do
ajuste fiscal, que é o elemento central desse processo todo, nós estamos com todas as medidas necessárias ou praticamente todas já
aprovadas. É uma questão de tempo para elas entrarem em vigor.
Estou confiante em que os dados
fiscais com os quais nos comprometemos serão cumpridos.
Folha - Mesmo com a maioria das
medidas aprovada, não seria o caso de adotar medidas fiscais adicionais para sinalizar ao mercado
que o governo não vai relaxar seu
controle?
Bier - Não é o caso de trazer novas medidas, mas mostrar nas divulgações mensais o que nós nos
propusemos a fazer e o que está
acontecendo. É uma questão ligada ao acompanhamento das medidas que definimos e não de criar
novas medidas para fazer um ajuste ainda mais forte, desnecessário
do ponto de vista fiscal e que não
me parece razoável.
Folha - A queda de 3,5% a 4% do
PIB está se revelando uma previsão conservadora?
Bier - Na minha opinião, ela é
uma previsão conservadora. Acho
que o desempenho da economia
não será tão negativo quanto está
projetado. Eu achava isso antes e
continuo achando. Mas a decisão
de usar um número como esse no
programa foi com um objetivo de
aderência a uma percepção geral
de mercado e que agrega credibilidade às projeções de resultado fiscal, na medida em que as projeções
de receitas são dependentes do desempenho do nível de atividade
econômica.
Folha - Qual a sua projeção pessoal?
Bier - Eu não gostaria de cravar
números. Meu palpite é que seja algo entre 2,5% e 3% de queda do
PIB. Mas quero deixar claro que
essa é uma previsão muito difícil
de ser feita.
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