São Paulo, Domingo, 28 de Março de 1999
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CRISE RUSSA
Socorro suspenso há sete meses volta a ser discutido, mas ação da Otan e desvio de US$ 4,8 bi complicam acordo
Rússia e FMI retomam as negociações



JOSÉLIA AGUIAR
da Redação

Rússia e FMI voltam a negociar, neste final de semana, um socorro financeiro que está ao mesmo tempo prometido e suspenso há sete meses.
Em 17 de agosto passado, poucos dias depois de receber a parcela de US$ 4,8 bilhões de uma ajuda prevista de US$ 23 bilhões, a Rússia declarou a moratória de sua dívida e desvalorizou a moeda, tornando-se o epicentro de uma crise que se alastrou pela América Latina e atingiu o Brasil.
Agora, o país não tem dinheiro para pagar nem mesmo os US$ 4,8 bilhões do FMI e do Banco Mundial que começam a vencer nos próximos meses.
Michel Camdessus, diretor-presidente do FMI, chega a Moscou em um cenário político que não podia ser mais desfavorável a um acordo. A Rússia se opõe ao bombardeio que a Otan (ação militar ocidental) iniciou na quarta-feira contra a Iugoslávia, em represália à negativa do governo sérvio em assinar o acordo de paz na província separatista do Kosovo.
O premiê russo, Evguêni Primakov, cancelou seu vôo para Washington para uma reunião com o FMI assim que soube da decisão da Otan, que é apoiada justamente pelas nações que lideram o socorro financeiro à Rússia.
Desde que a ajuda financeira foi suspensa, a Rússia tenta em vão convencer o FMI a liberar os recursos. Desse acordo depende, principalmente, a recuperação da confiança dos credores externos, com os quais o país também precisa renegociar sua dívida e acertar novos empréstimos -ao menos US$ 7 bilhões este ano, como prevê o novo Orçamento.
O FMI acusa a Rússia de ter feito pouco até agora para atender às suas solicitações. O próprio Orçamento, que o Parlamento russo acaba de aprovar, foi duramente criticado pelo organismo financeiro. O país vem fracassando em sua tentativa de acabar com os problemas crônicos de sua economia, o excesso de gastos e a má arrecadação, que o levaram a depender de capital externo para fechar suas contas mensais.
Em agosto passado, no auge da crise, o país tinha de pagar cerca de US$ 1 bilhão a cada semana. Era praticamente o mesmo que somava a sua arrecadação mensal, inferior à da cidade de Nova York sozinha. As reformas fiscal e bancária não avançaram. A Rússia ainda não conseguiu impôr disciplina às suas oligarquias e acabar com a corrupção endêmica.
Sem credibilidade, o país ainda recebeu na última semana a acusação de ter usado indevidamente os US$ 4,8 bilhões enviados pelo FMI no ano passado.
O secretário do Tesouro norte-americano, Robert Rubin, disse na quinta-feira que suspeitava que o dinheiro havia sido usado irregularmente.
Foi a primeira acusação direta os EUA ao país. Rubin se referiu à fuga feroz de capitais pouco antes da moratória e da desvalorização do rublo.


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