São Paulo, sexta-feira, 28 de abril de 2006

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CAPITALISMO VERMELHO

Alta de 0,27 ponto é a 1ª em 18 meses e revela temor com aquecimento; commodities caem com medida

China eleva juros para conter crescimento

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

A China surpreendeu o mercado ontem com a elevação de 0,27 ponto percentual de sua taxa de juros, para 5,85%, a primeira desde outubro de 2004. Apesar do pequeno valor, a decisão indica que o governo está preocupado com o ritmo de crescimento da economia, alimentado por um "boom" de crédito e investimentos.
No primeiro trimestre, o PIB chinês teve expansão de 10,2%, índice semelhante aos registrados em 2005 (9,9%) e 2004 (10,1%). No mesmo período, os investimentos em ativos fixos, como máquinas, equipamentos e construções, deram um salto de 27,7%, 4,9 pontos percentuais acima do aumento registrado no mesmo período de 2005. Em números absolutos, o valor foi de US$ 173,85 bilhões.
Os novos financiamentos concedidos pelos bancos somaram US$ 157,5 bilhões no primeiro trimestre, valor que corresponde a pouco mais de 50% da meta para todo o ano fixada pelo Banco do Povo da China, nome oficial do banco central.
Créditos e investimentos em excesso podem levar a um superaquecimento da economia e a um crescimento que seja insustentável. O temor de que isso ocorra freqüenta a agenda do governo chinês desde 2004, quando houve o primeiro reajuste dos juros em quase uma década.
Além de subir a taxa, o governo adotou naquele ano uma série de medidas administrativas para coibir o ritmo da produção. Entre elas, a proibição de novos investimentos em áreas já superaquecidas, como aço e cimento.
O receio de que a China desacelere levou ontem à queda no preço de ouro, zinco, cobre e prata. As ações da Vale do Rio Doce recuaram 4,07%, mais que a queda de 1,63% da Bovespa. A China é o maior mercado da mineradora brasileira e de vários outros exportadores de commodities.
Jonathan Anderson, economista-chefe do banco UBS na Ásia, acredita que medidas administrativas semelhantes às de 2004 serão adotadas agora. Em sua opinião, a alta de 0,27 ponto dos juros terá efeito quase nulo sobre a economia. Mas ela sinaliza para os bancos estatais que o governo está decidido a restringir a concessão de crédito, avalia Anderson.
O sistema bancário da China ainda é controlado por bancos estatais sujeitos a pressões políticas. Somado à expansão monetária superior à meta oficial, o fato é um estímulo a novos empréstimos.
O aumento do crédito e do investimento pode levar a uma expansão da produção que supere a demanda por produtos e serviços chineses. Se isso ocorrer, a atividade econômica terá uma redução brusca, para que oferta e demanda se equilibrem.
É isso que os economistas chamam de "hard landing" (pouco forçado) e que o governo chinês quer evitar. O objetivo das medidas de restrição a crédito e investimentos é obter o "soft landing" (pouso suave), com uma pequena desaceleração do crescimento.
Todos os números do primeiro trimestre indicam que a economia está em alta velocidade. A produção industrial aumentou 16,7%, 0,5 ponto percentual acima da expansão registrada em igual período de 2005. As importações subiram 24,8%, para US$ 174 bilhões, 12,6 pontos percentuais acima da elevação de 2005.

Taxa administrada
O banco central da China não é independente e implementa decisões aprovadas previamente pelo Conselho de Estado, o gabinete do país. Também não há liberdade na fixação da taxa final para o tomador. Apesar da gradual flexibilização dos últimos anos, os empréstimos em yuan não podem ter juros superiores a 2,3 vezes a taxa básica, de 5,85% para operações de um ano. Existe ainda um piso, de 90% da taxa.
Essas bandas, que já foram mais estreitas, têm o objetivo de impedir a concorrência predatória entre os bancos e permitir sua gradual adaptação às regras de mercado. Um dos maiores problemas dos bancos estatais é a dificuldade de seus funcionários e gerentes em avaliar o risco das operações e definir os juros a partir disso.
A reforma do sistema bancário caminha no sentido da total liberalização dos juros. As instituições locais enfrentarão a partir de 2007 a concorrência de bancos estrangeiros, segundo os compromissos assumidos pela China quando entrou na OMC (Organização Mundial do Comércio).
A preocupação com a saúde financeira dos bancos ficou evidente na decisão de ontem. O banco central elevou a taxa cobrada nos empréstimos, mas manteve inalterada, em 2,25%, a que os bancos pagam sobre os depósitos.


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