São Paulo, sábado, 29 de janeiro de 2005

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RECEITA ORTODOXA

Aperto fiscal e queda do dólar fazem valor ir a R$ 47,1 bi, 2,68% do PIB; superávit primário fica em 4,6%

Déficit público tem menor nível desde 91

NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Graças à combinação dos efeitos do aperto fiscal recorde e da queda do dólar, o déficit público foi reduzido, em 2004, para o seu nível mais baixo desde 1991, ano em que o Banco Central passou a calcular essa estatística.
Ao todo, governo federal, Estados, municípios e estatais tiveram um déficit de R$ 47,144 bilhões -ou seja, a soma das despesas do setor público, incluindo os gastos com juros, superou o total de receitas nesse montante.
O déficit equivale a 2,68% do PIB (Produto Interno Bruto), o menor em 14 anos. Ele ainda pode ser revisado, pois os números finais do PIB em 2004 ainda não foram divulgados. Ainda assim, o resultado fica abaixo, por exemplo, dos 3% fixados como teto para a União Européia e que não são cumpridos por países como Alemanha e França.
Um dos fatores que explicam esse bom desempenho foi o aperto fiscal conduzido pelo setor público: no ano passado, o superávit primário (receitas menos despesas do governo, exceto gastos com juros) somou R$ 81,112 bilhões, ou 4,61% do PIB -maior resultado desde o Plano Real (1994) e bastante superior ao acordado com o FMI (Fundo Monetário Internacional): 4,25%. O próprio governo, porém, já havia adotado, por conta própria, uma meta equivalente a 4,5% do PIB.
A maior economia do setor público pode ser explicada tanto pela redução nos investimentos por parte do governo quanto pelo aumento na arrecadação de tributos. O superávit serve como indicador sobre a disposição do setor público de continuar pagando sua dívida em dia, mesmo que signifique aperto em outras áreas.
Mas mesmo esse superávit recorde não foi suficiente para pagar toda a carga de juros que incidiu sobre a dívida pública em 2004: os encargos somaram R$ 128,256 bilhões. Apesar de continuarem num patamar elevado, essas despesas foram menores do que em 2003, quando chegaram ao recorde de R$ 145,205 bilhões.
A redução é conseqüência tanto da queda do dólar -cuja cotação recuou 8,13%- quanto da taxa Selic -que, entre 2003 e 2004, caiu de 23,25% para 16,25%. Taxa de juros e câmbio são os principais indexadores da dívida pública e, portanto, são os que mais afetam os gastos com juros.
Há dúvidas sobre a possibilidade de o déficit público se manter no nível atual ao longo de 2005, por causa, principalmente, da alta recente da Selic. Desde setembro, os juros foram de 16% ao ano para 18,25%, e a tendência é de alta.
Para o BC, porém, ainda não é possível medir com precisão o efeito fiscal da alta dos juros. "Esse impacto é gradual. Depende de como vão evoluir outros fatores, como a inflação e o câmbio", diz Luiz Malan, chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC.
Quando o superávit primário não é suficiente para compensar os gastos com juros, o governo recorre a empréstimos para financiar o déficit. No ano passado, porém, mesmo com esses empréstimos, a dívida pública se reduziu. No final de 2003, o endividamento estava em R$ 913,145 bilhões, o que representava 57,2% do PIB. Em dezembro de 2004, essa proporção havia se reduzido para 51,8%, embora a dívida tenha ficado em R$ 956,996 bilhões.
Foi a primeira vez desde 1994 que a relação entre dívida e PIB apresentou queda entre um ano e outro. A redução foi possível graças à inflação e ao crescimento da economia. O PIB é o total de riquezas produzidas pelo país. Ele é calculado com base nos preços dos bens e dos serviços negociados no país -logo, é influenciado não só pelo nível de atividade mas também pela inflação.
Entre 2003 e 2004, o PIB estimado pelo BC para o cálculo dos indicadores da dívida passou de R$ 1,597 trilhão para R$ 1,847 trilhão -ou seja, variação de 15,7%, embora o crescimento real esteja projetado em 5%. Só essa expansão, nas contas do BC, teria sido suficiente para reduzir a relação entre dívida e PIB em 7,7 pontos percentuais ao longo de 2004.


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