São Paulo, segunda-feira, 29 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Os trabalhadores brasileiros e a taxação do aço

CARLOS ALBERTO GRANA E HEIGUIBERTO DELLA BELLA NAVARRO

No dia 7 de março, dois dias depois de o governo Bush anunciar o aumento de tarifas de importação sobre vários produtos de aço (entre 8% e 30%), estivemos em Brasília para uma audiência no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e no Itamaraty, onde levantamos a necessidade de o ministério convocar o mais breve possível uma reunião tripartite para aprofundar uma avaliação das possíveis consequências e debater medidas cabíveis. Na ocasião, obtivemos um compromisso do secretário-executivo do ministério de realizar gestões nesse sentido, medida que ficamos aguardando.
O IBS (Instituto Brasileiro de Siderurgia) tem avaliado que as perdas para a indústria siderúrgica brasileira chegariam a US$ 1 bilhão em três anos e alertou que as barreiras dos EUA poderiam provocar a quebra de algumas empresas. Além disso, o fechamento do mercado norte-americano poderá provocar o desvio de exportações (asiáticas, ucranianas e outras) para outros mercados, como o brasileiro, o que distorceria a competição interna e geraria demissões.
Foi exatamente para proteger-se do comércio desviado dos EUA que, no dia 27 de março, a União Européia anunciou que também aumentaria suas tarifas de importação para produtos acabados e semi-acabados de aço, decisão que torna ainda mais urgente a adoção de medidas de proteção pelo Brasil. Raciocínio lógico que, no entanto, ainda não foi adotado pelo governo brasileiro. Para a nossa surpresa, no dia do anúncio da decisão européia, o ministro Sergio Amaral declarou à imprensa que era prematuro elevar as tarifas brasileiras, pois havia outros instrumentos de proteção disponíveis (?!).
Para nós está claro que a adoção de barreiras tarifárias por nossos principais compradores poderá causar sérios danos à produção e aos empregos brasileiros. E não pode ser enfrentada com a defesa do discurso do "livre comércio". É preciso tomar medidas concretas e urgentes concertadas com os atores desse processo, as empresas e os trabalhadores.
Nós defendemos a imediata elevação das tarifas de importação de produtos siderúrgicos (menos para o Mercosul), mas consideramos que isso não bastará para garantir a produção do setor. Como mais da metade das exportações brasileiras se dirigem aos EUA (36%) e à UE (19%), se não houver uma elevação do consumo interno do aço, que ainda é muito baixo (é cinco vezes menor que o do Japão e o dos EUA), o setor ainda sofrerá muito. Por isso defendemos a imediata adoção de medidas que permitam a elevação da produção industrial brasileira e que resultem na geração de empregos e no crescimento da remuneração.
Entre 1993 e 2000, depois das privatizações, a siderurgia brasileira passou por um programa de modernização e atualização tecnológica que, aliados aos baixos custos operacionais (um dos menores do mundo), tornou o Brasil o quinto maior exportador mundial de aço, com um montante de 9,3 milhões de toneladas.
Mas, sem dúvida, o que tornou o aço brasileiro um dos mais competitivos no mercado mundial foi o aumento da produtividade da mão-de-obra que, nos anos 90, se elevou em 150%; o corte nas folhas de pagamento -somente entre 1996 e 2000 foram cortados 23% dos empregos- e o achatamento dos salários. Foi também determinante o fato de que a força de trabalho da siderurgia brasileira custa 40% menos que em outros países em desenvolvimento e 130% menos que a média dos países desenvolvidos. Os trabalhadores não poderão ser ainda mais sacrificados.
Os sindicatos de siderúrgicos tiveram um papel ativo na adoção de salvaguardas pelos EUA e na reação européia. Aqui, porém, temos sido alijados. Nas reuniões que mantivemos há um mês em Brasília, ouvimos do governo que, graças ao envio de três delegações de empresas e funcionários de governo em 2001 e início de 2002, que foram aos EUA defender o aço brasileiro, os impactos negativos seriam pequenos. Certamente, os resultados poderiam ter sido melhores se os sindicatos tivessem feito parte dessa estratégia lobista e conversado com seus pares.
Desde o anúncio das medidas norte-americanas, temos tomado uma série de iniciativas: no dia 28 de março, tivemos um encontro com um dirigente da Secretaria Internacional da AFL-CIO, central sindical norte-americana, e, no dia 10 de abril, tivemos um encontro com diretores do USWA -sindicato de siderúrgicos dos EUA- que foram convidados pela empresa siderúrgica CSN para uma visita a Volta Redonda (procedimento de praxe quando uma empresa de fora adquire uma empresa norte-americana); no dia 16 de abril, tivemos uma audiência com o presidente do Senado, Ramez Tebet, para quem levamos uma série de dados e avaliações e pedimos que reforçasse ao ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio a necessidade de realizar, o mais breve possível, uma reunião tripartite do setor siderúrgico (medida que o ministério já nos comunicou estar viabilizando) e, no dia 9 de junho, enviaremos uma delegação da CNM-CUT aos EUA para uma série de encontros com o sindicato dos trabalhadores do aço naquele país. Em todas essas ocasiões, apresentaremos as propostas dos sindicatos de metalúrgicos da CUT, que são mais de 70% do setor siderúrgico, para defender essa fonte tão importante da economia brasileira e, consequentemente, os empregos e os salários dos trabalhadores que representamos.


Carlos Alberto Grana é secretário-geral da CUT; Heiguiberto Della Bella Navarro é presidente da CNM (Confederação Nacional dos Metalúrgicos) da CUT.

Texto Anterior: Rejeição de 64% faz PJ "enterrar" eleição antecipada
Próximo Texto: Dicas/Folhainvest - Dicas: Resultado da Telemar surpreende e analistas recomendam papéis
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.