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LUÍS NASSIF
A focalização e o outro lado
Nos anos 50 o professor Antonio Candido foi alvo
de uma campanha sistemática
de injúria por parte de quadros
do Partido Comunista, logo depois que, com um grupo de intelectuais, denunciou os crimes de
Stálin e rompeu com a legenda.
Um dia encontrou-se com um
antigo companheiro e lhe cobrou a razão da campanha.
Não era nada pessoal, explicou
o fulano. Era apenas para enfraquecer suas críticas e idéias.
Ao longo das décadas, a desqualificação moral tornou-se
instrumento corriqueiro nas
discussões acadêmicas tanto da
esquerda quanto da direita.
Basta discordar de um conceito,
disputar um espaço de idéias
para sair chutando abaixo da linha da cintura.
O que está acontecendo com
essa campanha contra o Iets
(Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade), a partir da entrevista da economista Maria
da Conceição Tavares à Folha,
parece fazer parte desse mesmo
modelo.
O Iets está sendo acusado de
ser financiado pelo Banco Mundial para impor as tais políticas
sociais "focalizadas" no governo
Lula. A palavra "focalização" já
se tornou maldita, independentemente de seu significado.
Pelo que me esclarece seu fundador, o economista André
Urani, o Iets foi criado para reunir economistas de diversas instituições e linhas de pesquisa
para trabalhos em conjunto e
trocas de idéia. Não é vinculado
a nenhum grupo político. Há
pesquisadores da FGV, da PUC-RJ, da UFRJ, da Firjan, da CUT,
do BNDES. Há nomes de peso e
de todas as linhas políticas, como Ricardo Paes de Barros, do
Ipea, Wanderley Guilherme dos
Santos e Otávio Amorim. Como
Oscip, o Iets tem todos os seus
balanços auditados.
O próprio Urani trabalhou na
Argentina com Roberto Frenkell, um dos pais do Plano Austral e com afinidades políticas
com Conceição e o grupo de economistas da Unicamp que participou do Cruzado.
No final de 2001, segundo Urani, o instituto produziu um trabalho para o PMDB, denominado de "Esboço de Ação Integrada", que serviu de base para a
chamada "Agenda Perdida",
preparada pelo economista José
Alexandre Scheinkman.
Não conheço por inteiro as
idéias do Iets. Mas o que se está
fazendo com esse pessoal não é
correto. Discutam-se idéias e
conceitos, mas não se lancem
acusações morais sem ter provas
consistentes.
O economista Marcos Lisboa,
assessor de Antonio Palocci Filho, foi "acusado" de ter recebido dinheiro do Banco Mundial,
por meio do Iets. O banco financia economistas de todas as origens e, em geral, é bastante rigoroso na escolha dos financiados.
Se tivesse recebido, o fato não
poderia ter sido tratado com esse tom de escândalo.
Lisboa remeteu e-mail a jornalistas esclarecendo que nunca
fez pesquisas para o banco nem
recebeu recursos da instituição.
Admitiu claramente fazer parte
do Iets e que o único trabalho
que a Oscip prestou ao Banco
Mundial custou US$ 8.000 -e
do qual ele não participou. De
nada adiantou. A informação
de que ele admitia fazer parte
do Iets não foi publicada e, em
seguida, foi acusado de ter "escondido" essa condição.
Se houver prova de desonestidade, que seja apresentada. Se
se for contra as idéias do grupo,
que sejam rebatidas. Mas desqualificação moral não.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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