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Conceição Tavares critica fundo soberano
Fundo é uma medida para o longo prazo, não para agora, quando há déficit em transações correntes, afirma economista
Brasil precisa ter reservas cambiais e fiscais para adotar proposta, diz a professora emérita da UFRJ; ela também defende controle de capitais
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
Filiada ao PT e professora
emérita da UFRJ, a economista
Maria da Conceição Tavares,
78, diz que a criação de um fundo soberano é algo para o "longo prazo" e incompatível com
um cenário de déficit em transações correntes -o que o país
já registra neste ano.
"Isso é para o longo prazo.
Para ter um fundo soberano, o
país tem de ter reservas cambiais e fiscais. Do contrário, não
tem fundo soberano. E quem é
que diz que vamos continuar [a
ter reservas]? Sou a favor, como
todos os países que têm reservas em dólares estão fazendo,
porque ficar com reservas aplicadas em dólar é prejuízo. Sendo um mau negócio, é bom fazer um fundo soberano. Mas só
vai funcionar se [o país] continuar acumulando reservas."
Lançada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, a idéia
do fundo já encontra resistência em setores do próprio governo. Para Conceição Tavares,
o problema é que o país vive
agora uma deterioração de suas
contas externas -de janeiro a
abril, o saldo em transações
correntes ficou negativo em
US$ 14 bilhões, mais do que o
déficit previsto para todo o ano
(US$ 12 bilhões).
"Quando há déficit em transações correntes [como agora],
o país acumula reservas falsas,
pois são acumuladas pela conta
de capitais [recursos do exterior]. Foi o que o FHC fez. Tinha US$ 80 bilhões de reservas,
mas não era capital nosso. Com
a crise cambial, foi tudo embora", disse a economista, após
palestra no Ciclo de Conferências sobre "O Pensamento de
Celso Furtado", no Rio.
A história, segundo ela, pode
se repetir agora. "Uma coisa é
acumular reservas por ter superávit de transações correntes. Essas já não estamos acumulando. Uma das razões é que, com essas taxas de câmbio
e a possibilidade de arbitragem
[o investidor pega dinheiro emprestado em um país e reaplica,
a taxas maiores, em outro, ganhando com a diferença nos
dois mercados], os caras [empresas] remetem lucros adoidados, que reingressam sob a
forma de novo capital."
Para a economista, a situação
das contas externas é ainda
mais preocupante por causa do
cenário externo. "Há a possibilidade de termos déficit de
transações correntes com uma
crise internacional junto, o que
é muito ruim. Do Lula para cá,
nos safamos: melhoramos a situação, exportamos mais, estamos retomando o crescimento
e o investimento, mas há esse
risco."
Como alternativa, Conceição
Tavares defende o controle de
capitais. "Nada impede que o
Banco Central volte a ter controle de câmbio e de remessas
[controles de fluxo de capitais].
Eles [o BC] não fazem isso porque têm instinto conservador."
A culpa da "virada" das contas externas, diz, é do câmbio,
que também promove a desindustrialização de alguns setores -embora esse movimento
esteja longe de ser generalizado
em toda a indústria. "Estou
preocupada com a sobrevalorização do câmbio, que prejudica
as exportações industriais e incentiva as importações."
A economista critica os defensores de que o país deveria
se especializar em ser exportador de matérias-primas. "O
Brasil já é especializado em matérias-primas por causa de nossas vantagens absolutas. A
questão é: o que se faz com a indústria, com os serviços, com as
cidades? Se fizer tal opção, o
país corre o risco de se tornar
uma grande fazenda."
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