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OPINIÃO ECONÔMICA
Frango Assado
BENJAMIN STEINBRUCH
Lembro bem, como se fosse hoje,
os fins-de-semana em que meu
pai nos levava para São Roque,
não para passear, mas para visitar nossa única indústria, a Têxtil
Elizabeth. Com seus sacos de fios
empilhados (que sempre escalávamos), seus 27 teares manuais
perfilados, as duas carreiras de
amoreiras na entrada do sítio e
dona Neide tomando conta da
administração.
Talvez naquele momento a Elizabeth não tivesse mais do que 20
pessoas trabalhando com a gente.
Era sempre motivo de alegria subir a serra no nosso Ford 51, azul
claro, que tão boas memórias me
trazem, parar no Frango Assado,
comer uma polenta e depois correr entre os teares naquele ambiente escuro, como era comum
nas fábricas de antigamente, antes de ir para o pequeno sítio comer amoras, brincar bastante.
A verdade é que eram outras
épocas, muito mais difíceis do que
hoje em termos de produção. A
matéria-prima era rara, o equipamento, obsoleto, o mercado,
muito pequeno, a tecnologia quase não existia, as comunicações
eram muito difíceis, os serviços
(inclusive o bancário) estavam
começando. E havia muitas histórias das estradas de terra por onde meu pai viajava para vender
tecidos, usando guarda-pó, por
este Brasil afora.
Difícil imaginar, naquela época,
que chegaríamos à realidade em
que vivemos hoje com vantagens
comparativas tremendamente favoráveis para nossos dias. Falando do setor têxtil, que está na origem do tronco-mãe de nosso grupo empresarial, a verdade é que
da pequenina Elizabeth chegamos hoje a um grande parque industrial, moderno, competitivo,
com enorme potencial para criar
novos empregos e estimular novos
investimentos, tudo tendo sempre
como alvo a concorrência internacional.
Hoje o setor tem múltiplas escolhas com relação à matéria-prima, todas geradas no Brasil. Temos mão-de-obra altamente qualificada, com índices de produtividade que, quando comparados
com os de fora, assombram pela
qualidade. Temos mercado crescente, capacidade empreendedora de nossos industriais, enfim,
tudo de melhor e condições gerais
mais fáceis do que nos tempos pioneiros lá de trás.
Acabamos de terminar a semana da Fenit/Fenatec, em que prevaleceu ótimo nível de negócios,
fazendo-nos lembrar de quando
as pequenas feiras eram um marco para todos no setor. Lá no
Anhembi a exposição foi um sucesso. Eram a 48ª Feira International da Indústria Têxtil e a 38ª
Feira International de Tecelagem.
Estamos longe daquelas festas
que Caio de Alcantara Machado
inventou lá no Pavilhão do Ibirapuera e que, rapidamente, se tornaram grandes êxitos para o setor
e para o grande público, com desfiles, shows, uma coisa! Agora a
feira conjunta é só para profissionais, ganhou projeção internacional e a sua eficácia está provada
pela presença de 600 estandes de
expositores e mais de 50 mil profissionais visitantes.
A direção da feira, ao final do
evento, falou à imprensa, salientando que o setor faturou cerca de
R$ 21 bilhões em 1998 e que espera
crescer 5% em 1999, fugindo das
ameaças da recessão. O crescimento está sendo favorecido pela
ampliação das exportações e pela
substituição de produtos importados. Outro dado: os investimentos no setor nos últimos 5 anos foram superiores a US$ 6 bilhões, e
outros US$ 6 bilhões estão previstos para os próximos cinco anos,
completando a modernização e
ampliação do parque fabril.
O que nos falta então para fazer
do setor têxtil um grande pólo do
novo desenvolvimento brasileiro?
Onde a coisa pega? Na minha opinião, na falta de proximidade e
diálogo do governo com os industriais e vice-versa. Não no sentido
da crítica, da busca de culpados,
da disputa, mas na análise conjunta do esforço que tem que ser
feito para nos igualarmos a países
mais adiantados, com estruturas
produtivas mais maduras e já
enraizadas nos mercados do Primeiro Mundo.
Podemos observar e copiar muita coisa boa no primeiro momento, sem ter o trabalho de aperfeiçoar, dada a garantia de sucesso.
Quando, no passado, trazíamos
qualquer novidade lá de fora para
nossa indústria, meu pai, Mendel
Steinbruch, sempre dizia: "Não
precisa melhorar, vamos tentar
fazer igual, que vai dar certo".
No segundo momento temos que
analisar nosso modelo, reconhecer suas fraquezas, valorizar nossas qualidades, buscar sinergias e
acreditar na nossa criatividade. É
que devemos desenvolver uma
proposta que, partindo de condições iguais às das grandes economias, nos permita disputar emprego a emprego, capital a capital, investimento a investimento,
nesse complicado jogo de mercados, dinheiro e interesses que é a
economia globalizada.
Não temos mais o Ford Azul 51,
nem as amoreiras, nem a polenta,
nem os 20 empregados e 27 teares
manuais que nos fizeram chegar
até aqui. As nossas realidades, a
do grupo e a do país, são muito,
muito melhores do que naquela
época. Com otimismo, determinação e muito trabalho, a lembrança do Frango Assado continuará
motivando a muitos que já viveram e outros que viverão a mesma
história, se Deus quiser.
Benjamin Steinbruch, 45, empresário, graduado em administração de empresas e marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é
presidente dos conselhos de administração da
Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio Doce.
E-mail: bvictoria@psi.com.br
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