São Paulo, segunda-feira, 29 de julho de 2002

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VENDA A DESCOBERTO/ANÁLISE

Fundos de hedge renovam estratégias e se proliferam nos EUA

France Press
Operadores no pregão de ontem da Bolsa de Al Kuait, que recuou 2,5% na semana passada


DANNY HAKIM
DO "THE NEW YORK TIMES"

É muito apropriado que o índice industrial Dow Jones tenha voltado aos seus níveis de 1998. John Meriwether, cuja corretora de fundos de hedge Long-Term Capital Management desabou de maneira espetacular naquele ano, agora volta a ganhar terreno. Meriwether já tem US$ 1 bilhão em ativos em seu novo fundo, o JWM Partners, e registrou lucro de 6% neste ano.
O segundo ato na carreira de Meriwether, depois de causar tumulto nos mercados mundiais e ser resgatado por uma dúzia de bancos, serve como lembrete de que alguém está sempre enriquecendo, não importa quão profunda seja a queda nas Bolsas.
Alguns dos titãs de Wall Street que tiveram momentos de dificuldades durante o período de alta sobreviveram para recuperar seu prestígio agora, em meio à baixa. As estratégias de alcance mundial, no passado praticadas por George Soros e John Meriwether, estão de volta. Isso vale para os fundos que investem em títulos problemáticos e em mercados emergentes e para aqueles que apostam contra o mercado acionário, vendendo a descoberto. Apostar contra o dólar deu resultado para muitos. Outros apostaram contra as ações usando contratos futuros e comprando títulos.
O sucesso vem atraindo bilhões de dólares aos fundos de hedge, grupos de investimento que operam de maneira bastante sigilosa e sob regulamentação tímida. Atraem os ricos e, cada vez mais, a classe média alta, bem como os fundos de bolsas universitárias, fundos de pensão e fundações. Os ativos do setor subiram de US$ 480 bilhões para US$ 563 bilhões no ano passado. Acredita-se que o ritmo seja semelhante neste ano.
"Um dos grandes desafios dos fundos de hedge é que eles se tornaram uma parte convencional do mercado", escreveu Lewis Moore Bacon, presidente da Moore Capital Management, uma das maiores corretoras de fundos de hedge, em carta enviada aos seus investidores em maio. "O grande número de fundos criados recentemente dá motivo para cautela", disse, acrescentando que os investidores estavam sendo conduzidos aos fundos pela "mesma desconfiança quanto às instituições que me conduziu às operações especulativas, como proteção contra as incertezas dos EUA pré-Reagan".
Alguns analistas sugerem que a proliferação de fundos contribuiu para a recente instabilidade do mercado, porque se espera que esses fundos encontrem maneiras de ganhar dinheiro, não importa o ambiente. Mas as pessoas do setor respondem que os fundos mútuos -um setor muito maior- estão sob pressão de venda, porque os investidores podem retirar dinheiro a qualquer dia, em lugar de uma vez por trimestre ou por ano, como nas regras da maior parte dos fundos de hedge.
Em teoria, o objetivo dos fundos de hedge é reduzir riscos, porque a abordagem clássica é adquirir algumas ações e vender posições a descoberto de outras, ou apostar contra elas, portanto adquirindo "proteção" (hedge) contra um declínio do mercado. Mas, na prática, os fundos de hedge cobrem uma vasta gama de entidades, algumas adotando a abordagem clássica e outras aumentando enormemente os riscos, ao tomar grandes quantias emprestadas ou executar jogadas arriscadas. Alguns dos principais fundos, na era da alta das Bolsas, adquiriram montanhas de ações de tecnologia, mas não praticaram muito hedge e entraram em colapso.

Velhos titãs
Soros e Meriwether fizeram grandes apostas nos mercados mundiais de câmbio, commodities, ações e títulos. Usaram dinheiro emprestado -em volume considerável-, ainda que as táticas fossem bastante diferentes. Do começo até a metade dos anos 90, os dois eram considerados titãs de Wall Street, mas pareciam obsoletos ao final da década.
Afinal, quem gostaria de apostar nas flutuações da cotação do dólar em relação ao baht tailandês ou ao ringgit malasiano em 1999 quando se podia ganhar muito mais dinheiro simplesmente comprando ações da Cisco? Além disso, investir via venda eletrônica é muito mais barato do que as taxas cobradas pelos fundos de hedge, no mínimo 1% ao ano e 20% de comissão sobre os lucros.
Mas, neste ano, alguns desses administradores obtiveram lucros fazendo grandes apostas contra o dólar. Um deles é John Henry, o novo dono do time de beisebol Boston Red Sox, que administra um fundo de US$ 1,4 bilhão, estruturado de maneira diferente de um fundo de hedge, mas com algumas semelhanças.
O maior dos fundos de Henry teve alta de 20% no primeiro semestre, enquanto o índice Standard & Poor's 500 caiu 13%. "Essa devastação, essa espiral entorpecente de queda, é um ambiente em que tendemos a nos sair bem", disse Henry. "Mas me preocupo com o que está acontecendo. Sou americano. É desconcertante ver esse declínio incansável."
Poucas administradoras de fundos de hedge se dispuseram a fazer comentários para esta reportagem, mas as informações sobre seus retornos foram obtidas em entrevistas com administradores de fundos de hedge, investidores e consultores, bem como em boletins trimestrais.

Alegria de poucos
Bruce Kovner, outro administrador de fundo de hedge que aposta nas grandes tendências econômicas, também estaria se saindo bem, aparentemente. Sua Caxton Associates, um dos maiores grupos de fundos de hedge do mundo, exibia alta de 14%, depois dos honorários, até maio.
Meriwether adota um estilo conhecido como investimento de valor relativo, no qual ele faz apostas quanto às diferenças de preços de moedas semelhantes, muitas vezes usando títulos. Seu novo fundo aparentemente usa US$ 10 em capital emprestado para cada US$ 1 em capital próprio. A alavancagem é considerável, ainda que a Long-Term Capital Management tivesse o dobro desse nível de dívida quando entrou em colapso. Diz-se que os retornos de Meriwether estariam entre 6% e 7% no primeiro semestre. Soros, que agora tem papel menos ativo em seu império de investimentos, não vem exibindo resultados tão brilhantes. Sua Quantum Endowment, que administra US$ 7,4 bilhões e apresentou alta de 14% no ano passado, caiu 3% no primeiro semestre.


Tradução de Paulo Migliacci

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