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RODADA COMERCIAL
Diretor-geral da instituição quer posições menos rígidas
OMC pede flexibilidade até do Brasil
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MONTRÉAL
O pânico ante a perspectiva de
que fracasse a Conferência Ministerial da Organização Mundial do
Comércio marcada para setembro, em Cancún, fez o diretor-geral da instituição, o tailandês Supachai Panitchpakdi, lançar um
apelo para que "a negociação comece de fato", em meio a sugestões para que todos os países, inclusive os em desenvolvimento,
mostrem "flexibilidade".
O Brasil, pela voz de seu ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, não só rejeita o apelo como ameaça: se não houver liberalização agrícola, não haverá a Rodada Doha, decidida na mais recente Conferência Ministerial da
OMC (2001, na capital do Qatar).
Rodrigues sugeriu tal posição
ontem, em reunião com nove dos
16 países que compõem o Grupo
de Cairns (grandes produtores e
exportadores agrícolas). Foi aprovada, mas convém tomar cuidado: o grupo tem um histórico de
radicalização verbal que, na prática, não se materializa.
O brasileiro sugeriu que se desse
nota, de zero a cinco, para a expectativa sobre avanços na área
agrícola até Cancún: a média foi
dois, superior ao que ele esperava.
A reunião do Grupo de Cairns
foi paralela à Miniministerial de
Montréal, a última tentativa de
aplainar o caminho para evitar o
fracasso de Cancún. Agricultura é
o tema predominante.
"Agricultura é a chave aqui em
Montréal", diz Panitchpakdi. Reforça o ministro de Comércio canadense, Pierre Pettigrew: "A reforma da agricultura será a prioridade. Os países em desenvolvimento deixaram isso claro".
Quem bloqueia a negociação
agrícola são os países ricos, em especial União Européia e Estados
Unidos, com seus portentosos
subsídios aos produtores rurais.
Mas tanto Panitchpakdi como
Pettigrew trataram ontem de cobrar flexibilidade também dos
países em desenvolvimento. "Todos devem demonstrar flexibilidade, em vez de ficar apenas enfatizando suas posições", disse o canadense.
Reforça o diretor-geral da
OMC: "Os países-membros devem mostrar mais flexibilidade e
estar preparados para aceitar fazer concessões".
Os apelos à flexibilidade revelam na prática o temor de que
nem a Europa nem os EUA estejam preparados para derrubar ou
ao menos diminuir o protecionismo agrícola que praticam.
Se o temor se materializar, não
haverá avanço em nenhuma outra área, das inúmeras que compõem a chamada Agenda Doha
de Desenvolvimento, que, a rigor,
engloba tudo o que o ser humano
produz e pode ser comercializado
entre fronteiras. Nos 18 meses entre Doha e Montréal pouco se
avançou nas negociações, em especial no setor agrícola.
Plano B
Por isso, a Folha perguntou a
Panitchpakdi se, faltando apenas
duas semanas para Cancún, ele
não estava pensando em um plano B, na forma de uma agenda
mais modesta ou de novo prazo
para concluir a rodada (o original
é 2005). "Não esgotamos o plano
A", responde o diretor-geral.
Mas o próprio Panitchpakdi,
em outros momentos da entrevista de ontem, deixou claro que o
plano A está perto de fazer água.
"Montréal é crucial para dar a
partida no processo negociador,
fornecer orientações e dizer quão
longe podemos ir em certos assuntos. Só assim, nas duas semanas úteis que restam até Cancún,
pode ser feito o correto trabalho
preparatório", afirma.
Apesar dos pedidos de flexibilidade a todos, a pressão em Montréal estará centrada nos EUA, como a Folha antecipou domingo.
Acontece que a União Européia
anunciou mudanças na sua política agrícola -limitadas e de resultado ainda incerto, mas mudanças de toda forma.
"A reforma anunciada pelos europeus nos encoraja", diz Pettigrew, deixando claro que espera
uma reação norte-americana na
direção de concessões amplas.
Mas o ministro canadense responsabiliza também a UE pelo
avanço ou não em Montréal: "Os
Estados Unidos e a União Européia têm impressionante poder
econômico, o que carrega consigo
a responsabilidade política de
mostrar liderança".
Pettigrew diz que as duas superpotências comerciais não podem
simplesmente reproduzir o acordo de Blair House, que desbloqueou a Rodada Uruguai (1986/
94), a etapa de liberalização comercial que antecedeu a de Doha.
O tema também era agricultura,
mas o acordo entre os grandes
prejudicou os países em desenvolvimento, que até hoje cobram
a liberalização agrícola.
Se houver acordo na área agrícola e não for apenas para beneficiar os grandes, o "resto pode entrar nos eixos de forma relativamente fácil e rápida", imagina
Pettigrew.
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