São Paulo, quinta-feira, 29 de julho de 2004

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LUÍS NASSIF

O papel do Estado nacional

Em plena era da globalização, há espaço para o Estado nacional? Em havendo, quais seriam seus limites e potencialidades? Todo grande país conta com um Estado forte e atuante. Por isso mesmo é "ciência" cabeça de planilha decretar que, como a intervenção do Estado foi abusiva nos anos 80, toda forma de intervenção do Estado será sempre abusiva. Que mané determinista é esse?
Um Estado nacional e conceitos como o neonacionalismo são relevantes porque a soma da lógica das empresas predominantes, em um determinado momento da história, não corresponde necessariamente à lógica de futuro de país. O Brasil de 2020 só será bem-sucedido se abrir espaço para um conjunto de atores que hoje em dia ou são insignificantes politicamente ou nem sequer existem. Quem vai defendê-los?
Além disso, nenhuma empresa, por mais poderosa que seja, tem fôlego suficiente para montar formas de autodefesa contra outros países e/ou empresas estrangeiras. Quando o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) atuou de forma pró-ativa para impedir a entrada da Bombardier no país e criou as condições para a Embraer voar, era o Estado nacional atuando em defesa do que considerou interesse nacional. Foi um esboço da nova forma de atuação do Estado.
Esses conceitos estão magistralmente registrados na obra do autor alemão Friedrich List (1789-1846) "Sistema Nacional de Economia Política" (coleção "Os Pensadores", Abril Cultural, 1983).
List historia o processo de desenvolvimento e decadência de diversas economias. Na década de 1830, já previa que os EUA iriam se tornar a maior potência do mundo e ironizava a visão de Adam Smith, que, algumas décadas antes, baseado na teoria das vantagens comparativas, garantia que a vocação dos EUA era iminentemente agrícola.
Anotava que a costa atlântica tinha se tornado forte centro manufatureiro. A expansão agrícola se dava em direção ao interior do país. Sem a proteção aos centros manufatureiros, teria ocorrido uma dispersão, uma migração de pessoas e talentos para o centro e para a costa do Pacífico, demolindo o potencial de crescimento. Se a indústria manufatureira era nascente, como conseguiu impor seus interesses? Porque, acima deles, pairava o interesse nacional exercido pelo Estado soberano.
O livro de List é fantástico pela capacidade de observação da realidade e por definir claramente os limites da proteção e da atuação do Estado. Há o momento da proteção e o momento da competição. Em casos analisados -como Veneza-, o que destruiu a economia foi excesso de proteção. Em alguns -como em Portugal-, o desregramento moral com o ganho fácil. Em outros, a abertura comercial indiscriminada.
Em todos os casos bem-sucedidos, o nacionalismo foi ferramenta de coesão, ao permitir consolidar princípios éticos, liberdade de manifestação e de iniciativa, ética do trabalho e da inovação como valores centrais e como moderadores de excessos que pudessem vir a ser cometidos pela ação do Estado nacional.
Mas a quem caberá definir os pontos centrais de uma ação de Estado? Voltamos com o tema em outra coluna.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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