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OPINIÃO ECONÔMICA
Juros internos e desequilíbrio externo
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Segundo a explicação mais comum, os juros são excepcionalmente elevados no Brasil porque
os investidores e credores, assustados com o déficit público, exigem alta remuneração para ficar com os títulos do governo.
No artigo da semana passada,
procurei sugerir que essa explicação não é muito convincente e
leva a conclusões paradoxais.
Como o governo tem produzido significativo superávit nas
suas contas primárias (exclusive
juros) em 1999, o déficit fiscal resulta basicamente das altas taxas de juro praticadas pelo Banco Central (BC), que elevam o
custo da dívida interna do setor
público. O déficit é mais efeito
do que causa dos juros altos.
Fica então a pergunta: o que
impede o BC de praticar juros
mais normais? Seriam os riscos e
incertezas associados à flutuação cambial? Defensores da dolarização e do "currency board"
alegam que a maneira mais eficaz de derrubar os juros é abandonar a moeda nacional ou subordiná-la a uma moeda estrangeira forte.
Essa resposta também não é
convincente. Nos anos 90, diversos países foram forçados por
violentos ataques especulativos
a abandonar a ancoragem cambial. Foi o caso do México em
fins de 1994, da Tailândia, das
Filipinas, da Indonésia e da Coréia do Sul em 1997 e da Rússia
em 1998. Todos eles passaram
para um regime de flutuação da
taxa de câmbio, como fez o Brasil em janeiro de 1999.
Pois bem. Nenhum deles pratica taxas de juro reais remotamente comparáveis às do Brasil.
Será que o nosso BC não baixa
os juros por medo de provocar
inflação? É verdade que o Brasil
tem uma tradição inflacionária
mais poderosa do que a dos países acima citados. Mas, com a
economia tão deprimida e as taxas de desemprego tão altas, é
pouco provável que a reativação
da demanda agregada provoque aumento da inflação no
curto e mesmo no médio prazo.
No meu entender, a principal
restrição a uma redução mais
acentuada dos juros ainda é o
setor externo.
É claro que a forte desvalorização cambial ocorrida em 1999, à
revelia dos planos do governo,
melhora as perspectivas para as
contas externas brasileiras no
médio prazo. Com o passar do
tempo, os efeitos da desvalorização vão aparecer com mais clareza, contribuindo para diminuir de forma significativa o déficit externo em conta corrente.
Mas a superação da fragilidade externa não se fará de forma
rápida. A conjuntura internacional continua adversa. As contas brasileiras sofrem os efeitos
da retração do comércio internacional, da deterioração dos
nossos termos de troca e da escassez de crédito externo.
O mais importante, entretanto, é notar que o Brasil não vai
superar de uma hora para outra
o legado das políticas irresponsáveis dos últimos anos. Isso por
vários motivos.
Primeiro: depois de quatro
anos e meio de sobrevalorização
cambial, os setores que exportam e os que concorrem com importações no mercado interno
vão demorar algum tempo para
se reorganizar e reagir plenamente ao estímulo proporcionado pela desvalorização. Perder
mercados é mais fácil do que reconquistá-los.
Segundo: os déficits externos
acumulados desde 1995 levaram
a uma grande ampliação dos
passivos internacionais do país.
Em consequência, o balanço de
pagamentos em conta corrente
ficou sobrecarregado por pesadas remessas de juros, lucros e
dividendos.
Terceiro: existem também vulnerabilidades na conta de capitais do balanço de pagamentos.
Como não tivemos uma política
prudente de administração do
perfil do endividamento externo, há uma carga pesada de
amortizações da dívida, cujo refinanciamento nem sempre é
tranquilo. Além disso, dado que
inexiste um controle suficientemente rigoroso sobre a movimentação financeira, há o risco
de saídas abruptas de capitais,
inclusive de residentes, em momentos de turbulência interna
ou externa.
Por esses e outros motivos, a
política de juros continua condicionada à restrição externa. Esse
condicionamento não é absoluto. Há espaço para continuar reduzindo os juros gradativamente. Contudo uma diminuição
mais substancial, compatível
com a retomada do crescimento,
fica na dependência de maiores
avanços no campo das contas
externas.
O potencial de crescimento da
economia brasileira é imenso.
Mas não poderá ser aproveitado
plenamente, enquanto o governo e o BC não conferirem prioridade zero à redução das vulnerabilidades externas do país.
Paulo Nogueira Batista Jr., 44, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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