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São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 2003

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LUÍS NASSIF

Sonetos e emendas

A propósito da réplica da economista Eliana Cardoso (publicada na edição de terça de "Valor") à minha coluna de sexta-feira passada, na qual rebato sua tentativa (de 20 de agosto) de desqualificar trabalho recente meu, inclusive com insinuações de plágio:
1) Em sua primeira coluna, a economista sustentava que no Brasil qualquer desvalorização seria comida pela inflação, enquanto em 2000 defendia que, na Argentina, com a economia plenamente dolarizada, não havia risco de inflação inercial.
Sua resposta: "Argumento que uma desvalorização real é possível em presença de uma política monetária restritiva. Mas, onde preços correm atrás do câmbio, a política monetária não é restritiva e a desvalorização real não se sustenta. Ao leitor atento, as citações escolhidas pelo jornalista demonstram por si mesmas a substância e a coerência do pensamento que defendo".
Demonstram coisa nenhuma. Na coluna em questão ("Valor" de 20 de agosto), ela diz: "No médio prazo, uma desvalorização do câmbio poderia aumentar as exportações e reduzir a vulnerabilidade da economia. Mas, nesse círculo vicioso em que juros, câmbio e preços correm uns atrás dos outros, uma desvalorização em termos reais dificilmente se sustentaria". Poderia ter incluído uma vírgula no final do texto e acrescentado "a menos que o Banco Central adote uma política monetária restritiva". Não o fez. Agora, tenta emendar o soneto.
2) Na minha coluna, sustento que, ao defender um modelo de câmbio apreciado, Eliana parte do pressuposto de que os fluxos financeiros internacionais se normalizarão -o que contradiz o que dizia em 1998, que o país deveria se preocupar com a vulnerabilidade externa, porque o modelo de capitais abundantes estava esgotado.
O que diz ela: "Meu argumento se refere apenas ao aumento ou redução de entrada de capitais em resposta a um aumento da taxa de juros. Não existe contradição entre a minha entrevista citada pelo jornalista (10/10/1998, sobre o custo do financiamento externo e o esgotamento do modelo de 1992-97) e o argumento da coluna do último dia 20, que mostra como a política monetária recente ajudou a coordenar expectativas e reduzir a taxa de inflação. O regime de câmbio flexível e metas de inflação se opõe ao modelo de câmbio rígido que se esgotou em 1998".
No primeiro artigo, ela chama de "círculo vicioso" a proposta de desvalorizar câmbio e reduzir a vulnerabilidade externa e trata como "virtuoso" o modelo de apreciação do câmbio com a estabilização da inflação, porque sustenta que o efeito positivo da entrada de capital financeiro (aquele que ela dizia ser caro e raro, após a crise de 1998) superaria o da redução das exportações.
Encerro por aqui a discussão, que, creio, tenha sido relevante apenas para demonstrar a lógica por trás de afirmações peremptórias de economistas como Eliana Cardoso -e seria apenas uma curiosidade, não fosse o custo gigantesco que esse tipo de postura impôs a toda uma nação.

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