São Paulo, quarta-feira, 29 de agosto de 2007

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Tavares não vê modelo claro para o país crescer

Para Conceição Tavares, PAC "rasteja" como o início do Plano de Metas de JK

Economista diz que não há sinais de que o país será muito afetado pela crise nos mercados e elogia acúmulo de reservas feito pelo BC

JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO

A economista Maria da Conceição Tavares afirma que o país está vivendo um ciclo de crescimento desde 2006, com aumento do crédito e do salário mínimo. Esses fatores reativaram o mercado interno, mas, segundo ela, ainda restam dúvidas sobre o modelo de desenvolvimento do país, principalmente com os gargalos na infra-estrutura.
Segundo Tavares, que deu ontem a aula inaugural do curso do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, na sede do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) no Rio, o "PAC vai rastejando assim como as metas de JK [de fazer o pais "avançar 50 anos em 5".] rastejaram no começo". Sem a solução para os gargalos, a economista afirmou que fica difícil antever o cenário de longo prazo. Além disso, ressaltou que ainda não é possível prever se a reativação do mercado interno é um ciclo de curta expansão ou duradouro.
Para Tavares, resta articular as relações entre Estado, capital estrangeiro e capital nacional para dinamizar as grandes obras de infra-estrutura. Apesar dessas dificuldades, ela rechaça a hipótese de uma volta ao modelo primário exportador. Segundo ela, essa hipótese é falaciosa porque a indústria brasileira não pode ser "implodida", embora possam ocorrer novos arranjos e reestruturações de alguns setores. "Isso aqui não é a Argentina ou o Chile", afirmou, em referência à hipótese de desindustrialização.
Na avaliação da economista, o aumento das importações nesse cenário é resultado de uma natureza cíclica da economia brasileira, que importa mais em períodos de expansão e que foi parcialmente impulsionada pela alta do real.
Com a mesma veemência, refutou a hipótese de o Brasil crescer em ritmo similar ao das potências asiáticas. "O potencial de crescimento do Brasil agora é maior do que o da maioria dos países da América Latina e da África, mas não é maior do que o da Ásia, que ainda está no ciclo de industrialização e urbanização pesada", afirmou.
O Estado brasileiro sempre teve um perfil intervencionista e de promoção do desenvolvimento econômico, diz Tavares. Descontadas algumas experiências de curto prazo, o único governo "neoliberal" brasileiro foi o de Fernando Henrique Cardoso, diz a economista.
Sobre a política macroeconômica, mantida no governo Lula, a economista elogiou o acúmulo de reservas feito pelo Banco Central no período que antecedeu a crise e a redução da dívida externa. "O lado bom do conservadorismo do BC foi subir as reservas", disse.

Crise imobiliária
Para a economista, o Brasil não deverá ser prejudicado pela crise no mercado imobiliário americano. A menos que a turbulência se transforme em depressão, o que levaria todas as economias, inclusive a chinesa, "para o beleléu", nas palavras de Tavares. "Se houver uma desaceleração da economia americana? So what? Exportaremos um pouco menos. (..) Aqui não aconteceu nada e já se fala em subir juros", disse.
Segundo ela, há hoje uma crise ideológica de esquerda e de direita. "A direita também não tem duas idéias, é só olhar o [Nicolas] Sarkozy. (...) Se é a favor da educação universal, da seguridade social, dos pobres e da distribuição de renda, você é de esquerda, mesmo que os partidos de esquerda tenham ido todos para o caneco. A social democracia européia foi toda para o caneco. Dentro do PT tem gente conservadora que acha ótimo taxa de juro alta, acha que assim é mais seguro."
Apesar do elogio à atitude do BC, a economista continua com a fala agitada de sempre. Sem o cigarro do lado, só mostrou sinais de cansaço após quase três horas de palestra. Logo de início, disse que, quando as pessoas começam a se preocupar em fazer perfis, é porque pensam que o perfilado está perto de morrer, mas que ainda pretende se manter "vivíssima". O senador Aloizio Mercadante, discípulo de Tavares, planeja escrever um livro de memórias a respeito da economista.
Os planos para o futuro da economista incluem a conclusão de um estudo sobre o BNDES em parceria com Luiz Gonzaga Belluzzo.


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