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MERCOSUL
Luis Mosca, ministro da Economia do Uruguai, afirma que nunca houve compromisso com o modelo
"AL não soube implantar o liberalismo"
Matuiti Mayezo/Folha Imagem
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Luis Mosca, ministro da Economia do Uruguai, durante visita a São Paulo na semana passada |
RICARDO GRINBAUM
da Reportagem Local
Mais um país latino-americano
está entrando na rota da crise econômica. Nos últimos dias, o Uruguai foi agitado por protestos de
agricultores, que têm dívidas de
US$ 1,2 bilhão. A exemplo do que
ocorreu no Brasil, o governo alegou que não podia abrir o cofre
porque afetaria o ajuste fiscal.
O ministro da Agricultura foi
trocado, mas os problemas permanecem. Nos últimos três anos,
o Uruguai cresceu a um ritmo superior a 4,5% ao ano. Em 1999, a
economia deve encolher 2% ou
mais.
Para o ministro da Economia,
Luis Mosca, os problemas que
atingem a América Latina não são
resultado do modelo econômico
adotado na região. Pelo contrário.
Ele acredita que os países estão
em crise justamente porque não
conseguiram levar adiante os programas de abertura e desregulamentação da economia.
"Em muitos países se verifica
que não houve um compromisso
de fato com a economia liberal.
Dessa maneira, a única coisa que
se absorve são os custos", diz o
ministro.
Na semana passada, Luis Mosca
esteve em São Paulo com 40 empresários, numa tentativa de aumentar as exportações para o Brasil. Ele deu a seguinte entrevista à
Folha.
Folha - Qual a origem da crise
no Uruguai?
Luis Mosca - Nos últimos três
anos, a economia cresceu entre
4,5% e 5% ao ano. Este ano, o PIB
deve cair 2% ou mais. O ambiente
em que se move a economia é um
sério candidato a explicar porque
entramos nessa fase de ajuste. Seria impensável que, com o Brasil,
a Argentina, o Paraguai e o Chile
em recessão, o Uruguai poderia
apresentar um comportamento
muito diferente.
Folha - Qual é o impacto da
desvalorização do real sobre o
Uruguai?
Mosca - Uma desvalorização
dessa magnitude provoca uma
mudança nos preços relativos e
prejudica a competitividade dos
produtos uruguaios. O Brasil é o
nosso principal sócio comercial e
maior destino de nossas exportações. A desvalorização também
nos afeta indiretamente, ao atingir a economia argentina, com
quem estamos muito vinculados,
principalmente no campo dos
serviços.
Folha - A crise da agricultura
está relacionada com a desvalorização?
Mosca - Não exclusivamente. A
principal origem do problema é
uma queda dramática dos preços
agrícolas. Medidos em dólares, os
preços caíram mais de 20% nos
últimos meses. Só os preços da
pecuária caíram 25%. Uma queda
tão drástica causa enorme dificuldade, sobretudo se o principal
mercado de exportação, o Brasil,
também sofre uma crise com a
desvalorização. Estamos fazendo
um grande esforço para colocar
os produtos em outros mercados,
mesmo tendo que oferecer preços
muito mais baixos. Teremos uma
queda de 4% a 5% no nosso comércio externo. Nos primeiros
seis meses, as vendas para o Brasil
já caíram 30% e as para Argentina, 25%.
Folha - Assim como no Brasil,
os produtores uruguaios pedem
ajuda, mas o governo diz que
não pode dar dinheiro porque
prejudicaria o ajuste fiscal. Alguns analistas dizem que as excessivas restrições impostas à
economia estão alimentando as
crises na América Latina.
Mosca - A preocupação com os
desequilíbrios básicos não são caprichos de economistas. Quem
não respeita esses princípios sofre
uma deterioração da situação do
país, recebe menos fluxo de capital, menos investimentos. Por isso, não creio que seja possível resolver por meios fiscais os problemas dos setores produtivos vinculados a queda de preços internacionais. Se o governo der assistência além de sua capacidade financeira, rapidamente se aceleraria a deterioração fiscal, pagaríamos maiores prêmios de risco
(juros) e isso afetaria o bem-estar
de toda a coletividade e colocaria
em risco a estabilização. É preciso
ser muito cauteloso.
Folha - Há uma corrente de
pensamento que cita as crises
de países latino-americanos e o
fortalecimento de líderes populistas, como o presidente Hugo
Chávez, da Venezuela, como
uma prova de que o modelo
econômico adotado na região
fracassou. O que o sr. acha?
Mosca - Sempre houve populismo na América Latina. Também
não acredito que haja um modelo
econômico único. O que há em
todo o mundo é a economia de
mercado, em todas as suas variantes. Além disso, existem vários países que incorreram em erros de política econômica, como
excessivo gasto público, endividamento fora da capacidade do país
e programas de reformas que,
muitas vezes, são mais declaratórios do que têm substância. Pensar que o futuro da América Latina é o populismo é incorrer em
erro. É pegar uma onda que terminou em fracasso.
Folha - O sr. acredita que políticos como Hugo Chávez podem
se tornar exemplos na região?
Mosca - Não sou analista político, mas como responsável pela
área econômica do governo, esse
tema me preocupa. Se os programas de reforma não avançam, os
países têm problemas. As pessoas
acabam não recebendo os benefícios da abertura e da desregulamentação da economia. Pode haver uma tendência de revalorizar
o messianismo, acreditar em líderes iluminados. Estou muito
preocupado com a América Latina. O populismo tem fortes componentes autoritários. Basta olhar
a história do continente.
Folha - Na sua opinião, então,
os países estariam em dificuldades porque não conseguiram fazer as reformas?
Mosca - Claro. Se o modelo encrenca, as pessoas buscam um
responsável. Para espiar todas as
penas, fazem como as tribos primitivas. Constróem um tótem e o
chamam de neoliberalismo. O
problema é que, se você analisa a
situação desses países, em nenhum caso se verifica que houve
um compromisso de fato com a
economia liberal. Mal ou bem, o
que se vê são processos pendulares, de avanços e retrocessos.
Dessa maneira, a única coisa que
se absorve são os custos.
Folha - Mas o custo não seria
justamente um dos problemas
da reformas? Não é um custo
social alto demais?
Mosca - Lamentavelmente, não
conheço nenhum ajuste que não
suponha dificuldades para as pessoas. Em todo o caso, o dever do
Estado é realizar o ajuste, preservando o valor solidariedade no
país, dando prioridade ao atendimento dos grupos mais carentes,
aos programas educativos, que
estão na base de grande parte do
problema. Com diferentes ênfases e resultados, todos os países
têm feito isso.
Folha - Como o sr. observa o
risco de uma desvalorização do
peso na Argentina?
Mosca - Os candidatos com
chances de ganhar as eleições presidenciais têm feito um discurso
de compromisso com o plano de
conversibilidade. A forma de
acalmar os mercados é, no menor
tempo possível, aprofundar o
ajuste fiscal e completar o programa de reformas iniciado no governo Menem. Se isso for feito, as
probabilidades de permanência
do plano de convertibilidade
crescem muito.
Folha - O Mercosul está vivendo sua maior crise. Os argentinos reclamam que a desvalorização do real provocou uma
concorrência desigual e estão
tentando limitar as importações. Qual é a saída para o impasse?
Mosca - Não é fácil. Não creio
numa regra simples para fazer
frente à perda de competitividade. Mas creio que é necessário ter
uma regra para esses casos. A
União Européia tem. Quando um
país, forçado pela circunstância,
desvaloriza sua moeda, tem que
haver um corretivo até que o
câmbio real mova para nível de
equilíbrio. Os instrumentos de
salvaguarda da Argentina não seriam os mais indicados. Têm que
ser tomadas medidas de alcance
geral. Ainda estamos discutindo
que tipos de medidas devem ser
adotadas.
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