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VINICIUS TORRES FREIRE
Pão amanhecido no Banco Central
Relatório trimestral do BC ficou envelhecido diante da queda mais forte da inflação e da morosidade na indústria
MEIO ENVELHECIDO, algo na
defensiva. É a impressão
que fica da leitura do "Relatório de Inflação" do BC. Envelhecido porque, desde a elaboração do
documento, novos dados e a revisão
de expectativas parecem indicar que
a primavera vai chegar mais tarde à
economia. A inflação de agosto e setembro veio abaixo da previsão de
mercado. A expectativa de inflação
para 2007 baixou. Um preço importante, como o do petróleo, cai bastante. A indústria recupera-se mais
devagar que o previsto.
O resfriado econômico do segundo trimestre, pois, ainda não passou.
O BC deveria ter dado mais xarope à
economia? Errou na dose de juros?
Difícil dizer, hoje. E a letargia de agora pode ser compensada com uma
aceleração mais forte mais adiante,
embora contenções desnecessárias
do PIB sempre sejam um risco. Mais
adiante, o ambiente mundial pode
se deteriorar; o atraso no PIB viria a
ser então irrecuperável.
Preocupa um pouco mais o tom
defensivo do relatório, que aparece,
por exemplo, em um dos pequenos
estudos anexos, sobre os efeitos defasados da queda da taxa básica de
juros sobre os juros de mercado e sobre a indústria. No exemplo do BC,
em 2004, o pico da utilização da capacidade instalada da indústria
ocorreu seis meses depois de os juros reais terem chegado a seu patamar mais baixo.
As medidas utilizadas têm problemas, mas o mais relevante aqui é
que, em 2006, a indústria reage de
modo mais lento e incerto que em
2004, quando o PIB cresceu 4,9%. A
diferença seria o efeito do câmbio?
Ou, como parece esperar o BC, a indústria chegaria ao pico de 2004 só
em março do ano que vem, seis meses após a taxa real de juros ter voltado ao piso histórico?
Nesse caso, o BC vai testar se a indústria, chegando ao limite aparente de sua capacidade, será capaz de
investir mais e/ou de aumentar a
produtividade? Em 2004, a expectativa de inflação voltou a subir em
maio. O pico do uso da capacidade
produtiva foi em agosto. Em setembro, o BC voltava a elevar os juros,
chancelando a opinião do mercado.
Medidas e dados ruins
Decerto, mais importante que
discutir décimos de porcentagem
de juros ou do PIB em determinado
ano são os problemas de estrutura
da economia. A má qualidade e o
tamanho do gasto público também
jogaram pela janela ganhos potenciais de produto e emprego. Mas
discute-se pouco o sistema de metas de inflação, como se ele fosse
um dado da natureza.
Os indicadores que medem a economia são parciais -os indicadores
de produção, preço, renda, para
não falar de produto potencial. No
próprio relatório, o BC mostra a regionalização e a interiorização da
produção e do emprego, o que as
estatísticas captam mal. O sistema
brasileiro de metas é pouco maleável para uma economia tão sujeita a
choques e de preços tão pouco flexíveis (é preciso mais flexibilidade,
mas, enquanto ela não vem, o BC
não pode ser turrão e birrento).
Enfim, o BC ainda presta poucas
contas para uma instituição que
torra um quarto da despesa federal.
Quanto menos responsabilização,
mais liberdade de errar ou de ser
capturado por grupos de interesse.
vinit@uol.com.br
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