São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Preparando 2007


São necessárias políticas públicas que permitam uma participação mais equânime nos frutos do crescimento

ENCERRA-SE com a coluna de hoje mais um ano desta minha presença semanal na Folha. Iniciei este trabalho como cronista das coisas das finanças e da economia em 1979, substituindo José Serra quando ele foi eleito deputado federal. O convite foi feito pessoalmente pelo dr. Octavio Frias na sede da Folha no centro de São Paulo. Vivíamos então o início do processo de distensão da ditadura militar, com a Lei da Anistia e a volta de muitos exilados. Iniciava-se também um período longo de crise econômica e que levaria, junto com a volta da democracia, ao colapso do modelo criado pelos militares. Delfim Netto substituía o então ministro da Fazenda Mario Henrique Simonsen, que procurava, com um atraso de cinco anos, ajustar a economia brasileira ao choque de petróleo de 1973 e sua reedição naquele mesmo ano de 1979. Ele caiu por insistir nesse ajuste macroeconômico no início do governo Figueiredo.
Mas tudo isso é história e quero hoje tratar do futuro. Ao longo deste ano que termina tenho mostrado ao leitor que, finalmente, deixamos para trás as terríveis conseqüências do desequilíbrio financeiro externo que marcou nossas vidas neste quase um quarto de século. Em razão de um vigor extraordinário nas nossas exportações, pela primeira vez em muitas décadas podemos como sociedade aspirar dias melhores. É possível romper com um passado de crescimento econômico pobre e permitir que os brasileiros possam, por seu esforço pessoal, melhorar suas vidas.
Mas para isso será necessário que compreendamos a natureza desse desafio. Esse será o centro da tarefa que me proponho como analista da Folha.
Esse espaço só terá sentido se conseguir, ao longo de 2007, de alguma forma, contribuir para construirmos uma saída para essa mediocridade em que estamos mergulhados. O país não cresce e não permite que as novas gerações de brasileiros possam aspirar, por mérito próprio, a uma vida melhor do que a de seus pais. E, o que é pior, o Brasil corre o risco de voltar ao passado no qual os que vivem sob a guarda do governo têm mais chances de progredir do que os que lutam dentro do ambiente competitivo do mercado de trabalho.
Por isso encerro minha presença neste ano propondo alguns pensamentos para nossos encontros em 2007. Para realizar essa tarefa, tomo emprestado de André Lara Resende, meu amigo e um dos maiores economistas brasileiros dos últimos tempos, as palavras ditas por ele na cerimônia em que recebeu, recentemente, o prêmio de economista do ano. Elas não apareceram na mídia nesses tempos em que o populismo e a falta de caráter tomam conta do dia-a-dia do noticiário sobre nossos homens públicos.
Mas André, como sempre, alinhou de maneira brilhante os grandes desafios que temos hoje no Brasil. Gostaria de dividir algumas de suas conclusões com meu leitor.
1) O moderno capitalismo de massa revelou-se imbatível como sistema de produção de riqueza. Sua superioridade foi de tal forma esmagadora que não parece haver, hoje, alternativa para a organização da economia.
2) Acontece que esse mesmo capitalismo moderno é incapaz de resolver de forma automática a questão das desigualdades e da exclusão social. Pelo menos transitoriamente as agrava. A redução da desigualdade depende essencialmente da vida pública, da política e da cidadania.
3) Ora, se não existe alternativa à altura do capitalismo para a criação de riqueza, se esse capitalismo é incapaz de sanar a questão de desigualdade, que depende essencialmente da valorização da vida pública, e a desvalorização da política tem suas raízes justamente no desenvolvimento da mentalidade capitalista moderna, estamos diante de um desafio monumental.
Essas palavras resumem para mim a natureza do problema que devemos enfrentar. De um lado, é necessário criar as condições essenciais para que o capitalismo brasileiro desenvolva-se com eficiência e racionalidade. E isso só será obtido com agenda de reformas ousadas. De outro, é preciso um conjunto de políticas públicas que permita, sem agredir a dinâmica de geração de renda inerente a uma economia moderna, uma participação mais equânime nos frutos do crescimento econômico. E como André coloca com precisão em suas palavras, esse desafio transcende as discussões sobre superávit primário, redução de juros e pacotes oportunistas e vazios que dominam a agenda econômica.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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