São Paulo, terça-feira, 30 de janeiro de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

Demolidor de expectativas


O PAC, apesar de todas as ressalvas, é um criador de boas expectativas. O BC, um demolidor

HAVIA DECIDIDO não escrever sobre o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), porque, embora sua linha mestra siga o caminho correto, do estímulo ao investimento, seria necessário alinhar críticas específicas ao pacote. Imaginei, então, ser melhor não comentar o assunto, uma vez que as críticas podem aborrecer pessoas bem-intencionadas, envolvidas nas últimas semanas na elaboração de medidas para levar o país ao crescimento econômico mais rápido.
Mas um fato ocorrido na quarta-feira não pode passar em brancas nuvens. O que é o PAC? Em primeiro lugar, é um esforço para juntar em um único cesto projetos de investimento espalhados pelo país e apoiá-los no âmbito do governo, nas estatais e na iniciativa privada. Saiu dessa junção o número mágico de meio trilhão de reais, a soma dos investimentos previstos até 2010.
Em segundo lugar, o PAC prevê reduções pontuais de impostos em setores como construção, infra-estrutura, semicondutores, microcomputadores, TV digital e perfis de aço.
Em terceiro, estabelece regras para o reajuste dos salários dos servidores públicos e do salário mínimo nos próximos quatro anos.
Olhando para as medidas práticas, esses são os três pilares do programa. O primeiro foi criticado porque muitos investimentos listados já eram previstos. A crítica é válida.
Mas deve-se considerar que o fato de estar previsto não garante a realização de nenhum investimento.
Quem já comandou grandes empreendimentos sabe quão variados são os entraves legais, burocráticos e ambientais que normalmente emperram as obras. Por isso, têm muita importância a intenção de realizar esses investimentos e o empenho gerencial para executá-los.
As críticas mais consistentes ao PAC referem-se à segunda linha mestra do plano, na área fiscal. As reduções de impostos previstas são incapazes de provocar efeitos na economia como um todo. Em 2007, a renúncia fiscal somará apenas R$ 1,4 bilhão. Como o governo incluiu na lista desonerações tributárias anunciadas anteriormente, o valor sobe para R$ 6,6 bilhões.
Além disso, o PAC deixou de lado o principal problema fiscal do país, o déficit da Previdência, que será discutido em um fórum. O déficit anual da Previdência, que era de R$ 9,6 bilhões em 1999, início do segundo governo FHC, subiu para R$ 17,1 bilhões em 2002. No primeiro ano de Lula (2003), saltou para R$ 26,4 bilhões, e, no ano passado, para R$ 46 bilhões.
Concordo com o argumento de que o pacote não apresenta estratégia clara de combate à expansão dos gastos correntes. Um projeto de lei que aparentemente limita o aumento de despesas com os salários do funcionalismo ainda terá de ser discutido no Congresso para eventualmente vigorar em 2008.
Apesar de todas essas críticas, o PAC merece apoio. Mesmo com falhas, o programa explicita pela primeira vez em muitos anos uma intenção do governo de colocar a economia em crescimento, em linha com outros emergentes. O que não se pode aceitar é o que ocorreu na quarta-feira, dois dias depois do lançamento do PAC, quando o Banco Central fez uma nítida provocação ao reduzir a taxa básica de juros em apenas 0,25 ponto percentual.
A decisão foi tomada, segundo nota do BC, "diante das incertezas associadas ao mecanismo de transmissão da política monetária e considerando que os efeitos das reduções desde setembro de 2005 ainda não se refletiram integralmente na economia". Em outras palavras: como o BC não sabe direito o que vai acontecer na economia, por via das dúvidas, reduz o corte de juros.
Até os mais ortodoxos analistas acham que havia e há amplas condições conjunturais para um corte de 0,50 ponto. Baixaram as expectativas do mercado sobre a inflação, caíram um pouco mais as cotações do dólar e das commodities, inclusive o petróleo, e persistem as previsões de boa safra agrícola.
A decisão do BC, portanto, é tecnicamente duvidosa e politicamente desastrosa. Reflete comportamento conservador, medroso e, agora, também provocativo, porque conflita frontalmente com a orientação política do pacote. O PAC, apesar de todas as ressalvas, é um criador de boas expectativas. O BC, um demolidor.


BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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