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São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 2003

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OPINIÃO ECONÔMICA

Dois pesos e duas medidas

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Continua a batalha de opinião pública sobre o comportamento do Banco Central na gestão da política monetária do governo do Partido dos Trabalhadores. Sentindo-se fortalecido pelo respaldo que recebeu do presidente Lula, o sr. Meirelles nesta semana deitou a falação. Isso é muito ruim para ele e bom para os que procuram mostrar os erros do Banco Central. Vejamos as maiores inconsistências de suas últimas palavras.
Há algumas semanas o sr. Meirelles disse que o Banco Central, diante do choque cambial do ano passado criado pela crise de credibilidade com a eleição de Lula, iria olhar para a meta de inflação de 2003 além do calendário civil. Uma declaração de puro bom senso, para quem tem a responsabilidade de manter a moeda estável sem provocar perdas exageradas para a sociedade. Infelizmente, naquela ocasião, ele não foi claro nesse compromisso, o que está permitindo, agora, que ele use novamente a meta de 8,5% para 2003, como justificativa para a manutenção da taxa Selic.
Apenas quem está acompanhando, no detalhe, as movimentações do sr. Meirelles na opinião pública percebe esse seu vaivém verbal. Nesta semana ele anunciou a decisão de não rolar na sua totalidade as operações de "swap" cambial depois de negar, como Pedro, por três vezes, qualquer intervenção no mercado de câmbio!
Outra pérola que podemos pescar nas águas de suas últimas intervenções públicas é a visão que tem sobre o futuro e o passado na economia. Em audiência no Congresso, o presidente do Banco Central cobrou vigorosamente dos empresários uma mudança de seu comportamento em relação à fixação dos preços em seus negócios. Em vez de olhar para a inflação passada, deveriam usar a expectativa de inflação futura. Exatamente o comportamento oposto que defende nas reuniões mensais do Copom para a manutenção dos juros atuais!
Em relação aos reajustes de salários nos dissídios coletivos também está presente a mesma inconsistência teórica. Nas famosas atas das reuniões do Copom, podemos encontrar críticas veladas aos reajustes salariais pelo IPC dos 12 meses anteriores. Mais uma vez empresário e trabalhador são responsabilizados por esse comportamento antipatriótico como os maiores culpados pelos juros elevados de hoje.
Certamente nossos luminares da PUC-RJ e do mercado financeiro que trabalham no BC esperavam que os empresários, que estão pagando juros com base na inflação passada, reajustassem seus preços olhando para a frente. Esquecem que é responsabilidade dos dirigentes de empresas, em uma economia de mercado, a busca de resultados positivos em suas operações. Da mesma forma, os sindicatos têm como responsabilidade social a manutenção do poder aquisitivo dos trabalhadores.
Volto, mais uma vez, ao ponto central de minhas críticas da política atual de taxas de juros: o Copom está deixando de fazer uma análise qualitativa e quantitativa da inflação que estamos vivendo hoje. Os números do acompanhamento cuidadoso dos preços que estão sendo praticados hoje nos mercados mostram uma inflação da ordem de 6% a 7% ao ano. Com exceção óbvia dos preços de tarifas públicas, ainda influenciados pelos reajustes em razão da inflação passada e da criação de novos impostos e taxas.
Desculpe-me o leitor da Folha por voltar a esta observação, mas venho de uma terra onde se dá um boi para não começar uma briga; mas, uma vez iniciada, somente uma boiada pode interrompê-la. O custo social que essa postura tecnocrática burra do Banco Central, seguindo a escola alemã do BCE, está impondo à sociedade é inaceitável!
Não estou pedindo leniência com a inflação ou os riscos de um jogo de dados, como fui acusado. Quero apenas responsabilidade no entendimento deste fenômeno conhecido que é a inflação no Brasil. A economia está derretendo, e o mercado de trabalho, de joelhos. O real voltou a valorizar-se, mesmo depois da medida anunciada sobre os "swaps" cambiais, sob o peso dos juros estratosféricos de hoje. Especuladores cambiais continuam a internar dólares para aplicá-los em títulos prefixados. Os juros futuros já caíram e estão sendo mantidos ainda elevados apenas pelas ameaças feitas pela diretoria de nossa autoridade às instituições financeiras.
Alardeando ser defensor radical dos mecanismos de mercado e da não-intervenção nos negócios privados, o Banco Central apela hoje para métodos autoritários para manter elevada a estrutura a termo das taxas de juros no Brasil.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br


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