São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Não há prazo para sanear bancos, dizem banqueiros centrais

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BASILEIA

Os banqueiros centrais dos 55 principais países do mundo encerraram ontem a assembleia geral do BIS (Banco de Compensações Internacionais) com uma avaliação hipercautelosa sobre a saída da crise global, a ponto de nem sequer se animarem a prever quando o sistema financeiro estará consertado, conserto que eles próprios admitem ser a precondição para dar sustentabilidade à incipiente recuperação.
"Há um significativo trabalho à frente [para reparar o sistema financeiro], em ações do setor privado com apoio do setor público, pelo que não me animo a dar um prazo", diz Jaime Caruana, o espanhol que assumiu a direção geral do BIS.
A rigor, o trabalho ainda a ser feito é o mesmo desde que a quebra do Lehman Brothers, em setembro passado, expôs as rachaduras nos bancos e entidades financeiras: os bancos ainda devem detalhar as perdas que sofreram com investimentos em instrumentos arriscados e livrar-se de "ativos tóxicos", especificou Caruana.
Ainda há todo o processo de "desalavancamento", ou seja, de escapar da cascata de empréstimos feitos ou tomados sem amparo em ativos sólidos.
Essa cautelosa análise ajuda a entender por que o relatório do BIS, divulgado ontem, não faz previsões sobre a retomada do crescimento no mundo.
Ajuda a explicar também por que os BCs não trataram das "estratégias de saída", ou seja, do início da reversão dos portentosos pacotes de gasto público ou de alívio monetários (redução dos juros). Em tese, o instinto natural de banqueiros centrais é conservador, tanto em matéria fiscal (gasto público) como monetária.
Mas, diz o brasileiro Henrique Meirelles, banqueiros centrais "são acima de tudo realistas". Ante a constatação de que o sistema financeiro ainda precisa de conserto -e é precondição para que o resto da economia funcione-, é natural que os chefes dos BCs tenham considerado "prematuro entrar em detalhes sobre estratégias de saída", como diz Guillermo Ortiz, o presidente do BC mexicano e também presidente do conselho do BIS.
Reforça Mario Draghi, presidente do BC da Itália e do Conselho de Estabilidade Financeira, agora reforçado pelos países emergentes e com um papel fortalecido por determinação da cúpula do G20 de abril: "Estratégias de saída têm que ser críveis. Para que sejam críveis, é preciso que o sistema bancário esteja consertado, antes de começar a apertar a política monetária [aumentar juros], e que haja sinais convincentes de recuperação sustentada -e eles não existem".
De todo modo, quando for a hora de falar de estratégias de saída, não haverá um modelo combinado entre os diferentes países, prevê Stephen Cecchetti, conselheiro econômico do BIS: "Cada país terá que calibrar a sua própria estratégia de saída, embora possa haver algum tipo de coordenação".
Se não tem nada de muito concreto a dizer a respeito da saída da atual crise, o BIS pelo menos avançou algo nas linhas gerais da reforma da regulação e supervisão dos mercados.
O eixo das reformas propostas é a centralização das operações financeiras, por meio de uma espécie de câmara de compensação. Hoje, funciona assim, simplificando: João vende derivativos, um mecanismo de aposta em diferentes ativos, para Maria, que vende para Pedro, que vende para Paulo.
Não há órgão regulador/supervisor que consiga saber quem corre que tipo de risco na operação. A centralização significará que, monitorando João, o supervisor tem, em tese, uma boa visão do risco que todo o sistema corre.
Também estão avançados os estudos no âmbito da Iosco (Organização Internacional de Comissões de Ações, de que faz parte, por exemplo, a CVM, xerife da Bolsa brasileira). Visam a regular não apenas o comércio de ações mas também o de hedge funds e o dos chamados CDS ("credit default swaps"), dois dos instrumentos financeiros mais obscuros e que estão no centro da crise atual.
As propostas detalhadas serão analisadas em setembro, na reunião dos ministros da Fazenda do G20, em Londres, preparatória da terceira cúpula do grupo, já marcada para setembro, em Pittsburgh (EUA).


Texto Anterior: BC pode rever medida que amplia crédito
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.