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GESNER OLIVEIRA
Mexicanização pós-eleitoral
A política distributivista de curto prazo é insustentável porque não está ancorada em uma boa política fiscal
APESAR de diferenças óbvias, as
dificuldades enfrentadas por
Brasil e México depois de
duas eleições presidenciais guardam semelhanças. Ambos os países
desperdiçaram uma janela de oportunidade da economia mundial para
um salto de crescimento.
Três pontos de convergência chamam a atenção. Em primeiro lugar,
os dois países apresentam desempenho muito aquém do esperado nas
últimas duas décadas. Eram times
favoritos, mas decepcionaram na
hora do jogo.
Essa é a decepção de Bradford Delong, economista e ex-funcionário
do governo Clinton, com o desempenho do México após seu ingresso
no Nafta. A economia abriu, as exportações cresceram cerca de 400%
nos últimos 16 anos, mas o PIB por
habitante cresceu a uma taxa anual
próxima de 1% no mesmo período. É
muito pouco para quem tem acesso
privilegiado ao mercado mais rico
do planeta. Além disso, as exportações mexicanas vêm perdendo terreno para as da China e de outros
países da Ásia.
O Brasil, por sua vez, se tornou conhecido pelo baixo crescimento entre as economias emergentes. É intrigante, à primeira vista, como um
país tão rico em recursos naturais,
com um setor privado com elevado
nível de produtividade e uma população reconhecidamente empreendedora possa ir tão mal durante um
dos períodos mais favoráveis da economia mundial nos últimos cem
anos.
Em segundo lugar, e aí reside boa
parte da explicação para desempenhos tão medíocres, as condições estruturais para o investimento e o desenvolvimento de capital humano
nos dois países são muito ruins. Tudo conspira contra o espírito empreendedor nos dois países.
O índice de competitividade do
Fórum Econômico Mundial divulgado nesta semana confirmou as dificuldades para investir nos dois países. O México aparece na 58ª colocação; o Brasil, na 66ª, 39 posições
abaixo do Chile (27ª). Apesar do elevado grau de subjetividade desse tipo de indicador, os problemas captados são bem conhecidos: infra-estrutura precária, excesso de burocracia e conseqüente corrupção, extrema rigidez na legislação trabalhista, corporativismo sindical e estruturas tributárias irracionais que
induzem a grande informalidade.
No passado, quando o nível de integração econômica com o resto do
mundo era menor, era possível conviver com elevados graus de ineficiência doméstica e mesmo assim
manter taxas elevadas de crescimento. Na atualidade, o déficit de
competitividade dessas duas economias e de várias outras da América
Latina tornou-se mortal. A economia global é implacável: os países
menos eficientes perdem mercados
e deixam de constituir pólos de atração de investimento.
Em terceiro lugar, tanto México
como Brasil apresentam dificuldades para formular projetos de desenvolvimento e viabilizá-los através de seus respectivos sistemas político-partidários. O governo de Vicente Fox (2000/6) foi decepcionante. Foram seis anos de sucessivos impasses entre Executivo e Legislativo sem que medidas de estímulo ao investimento e ao crescimento fossem tomadas.
As perspectivas para o governo de
Felipe Calderón são piores ainda.
Tendo vencido seu rival, Obrador,
por estreita margem e depois de desgastante processo de deliberação judiciária sobre o resultado do pleito,
as dificuldades políticas deverão ser
ainda maiores do que no período
Fox.
No Brasil, por sua vez, algo semelhante pode acontecer, ainda que
em circunstâncias distintas. O favoritismo do candidato que lidera as
pesquisas, e que pode levar à decisão
do pleito amanhã, não reflete nem
de longe a vitória de um projeto hegemônico. Traduz apenas uma satisfação do eleitorado mais pobre (e
majoritário) com uma política distributivista de curto prazo. Esta última é insustentável porque não está
ancorada em uma boa política fiscal
nem em formação de capital humano. Funciona apenas em tempo de
bonança.
Em contraste com o México (e
também com os Estados Unidos), o
resultado de uma eleição com urnas
eletrônicas de pura tecnologia nacional será conhecido e confirmado
em menos de 48 horas. No entanto
as dificuldades de organizar a energia empreendedora do país em torno de um projeto consistente persistirão por muito tempo.
GESNER OLIVEIRA, 50, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-Eaesp,
presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e
ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
gesner@fgvsp.br
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