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OPINIÃO ECONÔMICA
Armadilha dos juros
GESNER OLIVEIRA
A política de alta dos juros
na dose exagerada em que
vem sendo implementada pelo
Copom (Comitê de Política Monetária) coloca o país em uma armadilha de investimento baixo.
O mecanismo é simples. Depois
de muitos anos de crescimento
baixo e de uma sucessão de crises
externas (México, Ásia, Rússia) e
internas (crise cambial e o apagão), o tomador de decisão de investimento produtivo se tornou
particularmente cauteloso. Quem
decidiu ampliar a capacidade
produtiva após o Plano Real com
base em projeção de crescimento
sustentado da demanda se deu
muito mal. Se, a despeito disso,
conseguiu manter o emprego, não
pretende errar de novo.
As empresas tornaram-se, assim, mais conservadoras em decisões de expansão. Essas últimas
são empreendidas em momentos
de quase certeza de aumento continuado da demanda, nos quais
um adiamento do investimento
pode acarretar rápida perda de
espaço no mercado para os concorrentes.
Nessas circunstâncias, as decisões do Banco Central sobre a taxa primária de juros (a taxa Selic) não têm relevância direta sobre o custo do financiamento de
projetos. Seus efeitos nesse sentido
são de segunda ordem. Porém
exercem influência decisiva na
expectativa que o empresário tem
sobre o ritmo da expansão e, conseqüentemente, sobre a viabilidade de novos projetos.
A sucessão de atas do Copom
que culminou com a última, divulgada na quinta-feira e que ressaltou o perigo inflacionário e
apontou para novas altas futuras
de juros, acentua o conservadorismo na decisão do investimento
produtivo.
Note-se que a elevação da taxa
Selic de 16,25% para 16,75% na
última reunião do Copom não
afeta praticamente a produção
corrente, que continua aumentando. Seu efeito incide sobre a
ampliação da oferta, que se dá a
um ritmo mais lento do que no
passado.
Isto é, as empresas estão dispostas a operar estrategicamente
com um nível de ocupação mais
elevado relativamente à sua capacidade, mesmo que a custos
marginais mais elevados. Isso
porque temem se aventurar em
uma expansão e acabar abandonadas em alto-mar pelo barco da
recuperação, assim como o casal
protagonizado por Blanchard
Ryan e Daniel Travis no inquietante filme "Mar Aberto", de
Chris Kentis.
A implicação dessa atitude de
compasso de espera ("wait and
see", na expressão em inglês) do
empresário do setor real é a de
elevar o nível de ocupação da indústria, algo observável nas pesquisas divulgadas nesta semana
pela Confederação Nacional da
Indústria e pela Fundação Getúlio Vargas. Segundo a FGV, o nível de utilização da capacidade
instalada da indústria de transformação atingiu 86,1%. Isso não
ocorre por um suposto excesso de
demanda, mas pelo baixo ritmo
de expansão da oferta.
O problema é que o Copom tem
interpretado tal fenômeno como
um aquecimento excessivo da
economia, apontando para novas
altas de juros. Isso, por sua vez,
inibe ainda mais as decisões de
investimento. Como a produção
corrente continua a crescer em
função da demanda externa e do
ritmo natural de recuperação do
mercado doméstico, o nível de
ocupação cresce, levando a novas
preocupações com o excesso de
demanda, em um círculo vicioso.
Assim, a sinalização negativa para o investimento acaba gerando
um problema de oferta na economia.
Note-se que a preocupação acima diz respeito a investimentos
de curto e médio prazo necessários em um processo de recuperação. No tocante a inversões de
longo prazo na infra-estrutura de
energia, transportes e outros seguimentos, o problema é ainda
mais grave, mas é de outra natureza. Nesse caso, faltam regras
claras e estáveis, de forma a diminuir o risco regulatório e estimular o investimento.
Tal combinação de hesitação do
investidor produtivo e excesso de
conservadorismo da autoridade
monetária pode fazer com que o
Brasil perca uma das raras janelas de oportunidade da economia
mundial para alcançar o crescimento sustentado.
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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