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COMUNICAÇÃO
Teles preferem modelo europeu, televisões, o japonês, e rádios, o americano; convergência de mídias também é polêmica
Governo e empresas divergem sobre TV
JANAÍNA LEITE
ENVIADA ESPECIAL A FLORIANÓPOLIS
O governo está a um passo de
comprar uma grande luta com as
grandes empresas de radiodifusão. O motivo é o apoio declarado
à convergência das mídias e a preferência velada pelo padrão digital europeu para a TV digital.
O Futurecom, maior evento de
telecomunicações da América Latina, ocorrido na semana passada
em Florianópolis, deu o tom da
disputa. Técnicos do governo ouvidos pela Folha durante a feira
defenderam que o debate seja dividido para evitar as pressões das
radiodifusoras. A idéia é separar
as discussões sobre o conteúdo
das conversas acerca da transmissão e da distribuição.
A estratégia permitiria enfraquecer a posição das rádios e TVs
na escolha do padrão das TVs digitais. Existem três modelos na
mesa de negociação: DVB (Digital
Vídeo Broadcasting), europeu;
ISDB (Integrated System Digital
Broadcasting), japonês, e ATSC
(Advanced Television System Comitee), norte-americano.
O imbróglio é grande porque o
primeiro detém a simpatia das teles. O japonês é considerado o
melhor para as televisões, que não
precisariam trocar a rede e ganhariam passe certo para as transmissões móveis. Por fim, grupos de
rádio já fizeram investimentos no
sistema digital americano.
A escolha de um padrão vai desembocar nas regras para convergência de mídias, história de interesses comerciais gigantes. As
empresas de radiodifusão temem
que as regras sejam apressadas
pelas teles porque o governo estaria fazendo gestões nos bastidores
com operadoras internacionais.
Atualmente, grupos estrangeiros só podem deter 30% do capital das radiodifusoras. A tendência é que esse percentual seja aumentado. De acordo com o raciocínio de representantes das rádios
e TVs, as operadoras internacionais estão interessadas em impedir que as rádios e TVs brasileiras
-hoje endividadas e dependentes dos anunciantes- aumentem
seu valor de venda futura. Ou seja,
querem comprar empresas com
grande potencial e credibilidade a
preços baixíssimos.
As teles vêem o problema sob
outro prisma. Para elas, rádios e
TVs brasileiras querem garantir
uma reserva de mercado e equilibrar o caixa arrebentado valendo-se da valorização de produtos já
existentes. E sem investir nada.
Dentro do governo, a crença é
que, pelo menos nos próximos
dez anos, a TV aberta continuará
sendo o único veículo de comunicação de massas que chegará às
classes D e E -portanto, o único
verdadeiramente popular. Por isso, querem o padrão que permita
aparelhos mais baratos. Os técnicos governistas apostam que o europeu serviria mais ao propósito.
Estudos sobre o assunto, porém, serão finalizados apenas em
dezembro. Além do custo, outras
variáveis estão sendo levadas em
conta por especialistas da tecnológica Fitec e do CpQD (Centro de
Pesquisa e Desenvolvimento em
Telecomunicações) ouvidos pela
Folha, como mobilidade e definição. Um dos aspectos considerados mais relevantes é a capacidade de suportar produtos interativos (que, no futuro, deverão ser
desenvolvidos pelas televisões
brasileiras).
A compensação pela escolha de
um padrão que não é desejado pelas radiodifusoras seria a manutenção da obrigatoriedade de um
percentual alto de conteúdo brasileiro na distribuição via celular.
O argumento é que os programas
nacionais têm grande qualidade e
é importante mantê-los nas mãos
de brasileiros.
Para as teles não reclamarem, a
transmissão pelas operadoras de
telefonia acabaria sem restrições
-o que não é consenso no governo. A distribuição para os consumidores finais aparecerá como o
terceiro ponto da polêmica, o que
arrasta para a discussão fabricantes de aparelhos, além de rádios,
TVs e concessionárias.
Futuro das teles
Enquanto o clima da discussão
em torno da convergência esquenta, os jogadores vão tomando posição.
O presidente da Telefônica, Fernando Xavier, afirmou no Futurecom que, para que o setor de telecomunicações consolide as conquistas feitas desde 1998, é possível supor necessários investimentos acima de R$ 100 bilhões nos
próximos anos.
De acordo com Xavier, para viabilizar esses investimentos, será
preciso reunir condições políticas
e econômicas. Mas, sobretudo,
perseguir duas metas: atualizar a
legislação e criar marcos regulatórios transparentes e previsíveis.
À Folha, Xavier mostrou-se satisfeito com o novo discurso do
ministro das Comunicações, Hélio Costa, que defendeu a regulamentação da convergência. "O
que ele disse foi extremamente
pertinente para este momento e
está alinhado com aprimoramentos que o modelo regulatório precisa", afirmou.
Uma legislação moderna, disse
o presidente da Telefônica, poderá estimular "a prestação de serviços integrados na área de telecomunicações pelas operadoras
existentes, à semelhança da realidade observada no cenário internacional".
Para Xavier, os investimentos
servirão ao estímulo da ampliação e modernização das redes e
dos serviços em um ambiente
competitivo, forte e saudável,
com neutralidade tecnológica. Isso resultaria, disse, em rentabilidade dos negócios.
O presidente da Telefônica reconheceu que novas tecnologias,
como as ligações pela internet,
podem significar uma ameaça às
operadoras no curto prazo. A saída, diz, são os investimentos para
a propagação e o desenvolvimento da banda larga ADSL e dos serviços a ela associados.
Fixo e celular
Sete anos depois da privatização da Telebrás, o cenário das telecomunicações brasileiras mudou muito.
Houve uma explosão na venda
de telefones celulares, desburocratização na oferta de linhas, e a
internet, antes restrita às universidades e centros de pesquisa, tornou-se parte do dia-a-dia da classe média.
Com isso, as operadoras de telefonia resultantes da cisão da estatal ampliaram o número de produtos oferecidos aos clientes.
A despeito de tantas alterações
de cenário, as ligações telefônicas
continuam como a principal base
de receitas das operadoras. Na
América Latina, região que teve
maior crescimento do mercado
de voz em telefonia fixa, a tendência de esse tipo de ligação ser
substituída é algo que deve ficar
claro apenas no futuro.
No resto do mundo, porém, a situação é outra. Segundo a International Data Center, o mercado
de telefonia fixa movimentou
US$ 444 bilhões em 2003. Caiu
para US$ 437 bilhões em 2004 e
deve encolher para US$ 431 bilhões. Daqui a três anos, a estimativa é que o valor não passe de
US$ 411 bilhões.
A jornalista Janaína Leite viaja a
convite da Futurecom
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