São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 2006

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Governo cede e corrige tabela do IR em 3%

Sob pressão de políticos e sindicalistas, argumento da equipe econômica de que alívio tributário não tem respaldo é ignorado

Medida, admitida ontem por Mantega, deve gerar um benefício de R$ 1 bilhão a contribuintes, mas complica ainda mais o equilíbrio fiscal

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo cedeu às pressões de políticos e sindicalistas e concordou em corrigir novamente a tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas. A medida havia sido publicamente descartada pelo ministro Guido Mantega (Fazenda) apenas duas semanas atrás.
Pelo que foi acertado ontem com o relator do projeto de Orçamento para 2007, senador Valdir Raupp (PMDB-RO), haverá reajustes de 3% em 2007 e 2008, o que elevará a faixa de isenção dos atuais R$ 1.257,12 mensais para R$ 1.294,83 no próximo ano e R$ 1.333,68 no ano seguinte. No período, o benefício para os contribuintes é estimado em R$ 1 bilhão.
O índice ainda precisará ser aprovado pelo Congresso, mas, se houver alteração, a tendência é de alta. No ano passado, por exemplo, foi negociada uma correção de 7% em 2006, que acabou sendo de 8%.
Para a área econômica, o alívio do IR não tem justificativa técnica. A prioridade, no momento, é promover desonerações tributárias que estimulem os investimentos privados. A Receita Federal, particularmente, é uma tradicional adversária das correções da tabela -um dos argumentos é que a medida só é vantajosa para a parcela mais rica da população.
Ontem, porém, Mantega indicou nova disposição. "Depende de outras concessões, mas é possível que o mecanismo seja aprovado", disse, após reunião com empresários em São Paulo. "Eu tinha argumentado contra, mas houve negociações e deve haver uma acomodação."
Poucas horas depois, o secretário-executivo da Fazenda, Bernard Appy, e o secretário da Receita, Jorge Rachid, acertaram a correção com Raupp.
O recuo foi necessário para minimizar perdas. Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua equipe tentam, desde o início do mês, fechar um pacote de estímulo à economia, o Congresso tem decidido por conta própria elevar gastos e reduzir receitas no Orçamento.
Nos últimos dias, Raupp já havia anunciado a intenção de reduzir o superávit primário (a economia destinada ao abatimento da dívida pública), de conceder um reajuste para o salário mínimo superior ao defendido pelo governo e de corrigir a tabela do IR.
Com a abertura de negociações com o Executivo, Raupp concordou em reduzir sua proposta inicial para a tabela -10% divididos nos próximos dois anos, com renúncia fiscal total de R$ 1,5 bilhão.
O senador também aceitou manter a previsão de superávit primário no Orçamento em 4,25% do PIB, ao menos até que o governo decida se reduzirá essa proporção para 3,75% com a finalidade de elevar os investimentos públicos.
Segundo Mantega, como contrapartida, o governo sugeriu ainda ao relator incluir parte da desoneração de bens de capital e a redução do tempo que as empresas têm que aguardar para utilizar créditos do PIS/Cofins em investimentos produtivos. "A gente paga uma conta [a correção do IR], mas tem uma vantagem do outro lado [...] Se ele [Raupp] acomodar essas coisas [os pedidos], a gente fica satisfeito."
A área econômica não conseguiu, porém, convencer Raupp e o Congresso a reduzir o valor do salário mínimo a partir de maio, dos R$ 375 propostos de início para os R$ 367 defendidos hoje. "Os R$ 375 já estão acomodados no Orçamento", disse o senador.
No governo, o principal defensor da correção da tabela do IR é o ministro Luiz Marinho (Trabalho), ex-presidente da CUT. O argumento é que, quando os valores da tabela se mantêm de um ano para outro, aumenta a carga tributária sobre os assalariados.
É verdade. A tabela é progressiva -quanto maior a renda, maior a alíquota cobrada.
Com isso, qualquer aumento salarial, mesmo os inferiores à inflação acumulada, significa uma tributação maior. Com a correção, os contribuintes irão pagar menos imposto.
Até 1995, a tabela era corrigida pela inflação do ano anterior. A partir daí, com a inflação controlada e a intenção de desindexar a economia, a regra foi extinta. O governo Fernando Henrique Cardoso manteve a tabela congelada até 2001 -no ano seguinte, houve uma correção de 17,5%, abaixo da inflação de 64% acumulada no período.


Colaboraram KAREN CAMACHO , da Folha Online, e MARCELO SAKATE , da Redação


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