São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Impostos, gasto social, Lula e FHC

Dados sobre gasto social e impostos mostram como é difícil fazer comparações simples entre os governos


NOS ANOS FHC, a carga tributária subiu mais que em sete anos de Lula. Quase 60% mais. Isso não quer dizer necessariamente que os impostos subiram mais. Quer dizer que o total arrecadado pelo governo cresceu mais como fatia do PIB. Nos anos FHC, cresceu também a proporção dos recursos que o governo devolve à sociedade na forma de transferências diretas de renda: aposentadorias, pensões e outros benefícios sociais e assistenciais. Isso não quer dizer, necessariamente que, em termos absolutos, tais transferências foram maiores no governo FHC. Quer dizer apenas que, como proporção do PIB, as transferências de assistência e previdência sociais cresceram no governo tucano; subiram muito pouco no governo Lula.
Os dados sobre tributação e transferências foram levantados pelo pesquisador Márcio Bruno Ribeiro, do Ipea, publicados no estudo "Uma Análise da Carga Tributária Bruta e das Transferências de Assistência e Previdência no Período 1995-2009" (grátis no site do Ipea). A análise dos dados é da responsabilidade do colunista.
Assim dispostos, os números parecem negar o fato de que nos anos Lula aumentaram os benefícios sociais diretos para os mais pobres. Mas é preciso considerar que tanto o PIB como os gastos do governo federal cresceram muito mais nos anos Lula. Ou seja, em termos absolutos havia mais dinheiro no bolo. Os gastos cresceram 50%, na média, em relação aos anos FHC. O PIB, quase 60% mais. Parte do aumento da receita e da despesa foi destinado a programas de desenvolvimento social, como o Bolsa Família. Na média, o investimento federal direto (em "obras") praticamente empata, nos dois períodos (como proporção do PIB).
O grande salto da carga tributária sob FHC ocorreu entre 1998 e 2001, quando o país cresceu apenas 1,5% por ano, em média. Os impostos subiram para cobrir os rombos da crise que estourou em 1998-99. O grande salto da carga tributária sob Lula ocorreu entre 2004 e 2008, de resto sobre uma base muito maior: o PIB cresceu em média 4,8% nesses anos. A carga subiu mais devido ao aumento da arrecadação devida à melhora na renda e à formalização do trabalho.
Esta breve nota sobre FHC vs. Lula revela a dificuldade das comparações. Em termos práticos, a "sensação térmica" sob Lula foi mais agradável, não importa como se leiam os números. Para a massa dos cidadãos, são incompreensíveis considerações sobre o contexto mundial ou sobre o fato de que ações de um governo podem ter resultados defasados, que aparecem na gestão do sucessor. É ainda mais inefável a ideia de que certas mudanças institucionais causam melhorias tardias e difusas, que não são mensuráveis diretamente.
O lulismo-petismo quer fazer uma "eleição plebiscitária", PSDB versus PT. Em si, não é má ideia. Pode até ser um meio de evitar excessos de personalismo na eleição (se um candidato tucano quiser se descolar de seu partido, que partido e que candidato são esses, afinal?). Problema mesmo, como já se viu na propaganda do PT, será a fraude publicitária dos números descolados de seu contexto.

vinit@uol.com.br

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